sexta-feira, 30 de abril de 2021
Divulgação - "Comunicação, democracia e religião no Brasil".
domingo, 18 de abril de 2021
domingo, 11 de abril de 2021
“Flores nas encostas de cimento”: o silenciamento e a tomada dos crentes de esquerda na política.
“E se as luzes
nos roubassem as estrelas
E nosso brilho só nos mostrasse
A silhueta do que poderíamos ser
(…)
Para clarear o meu tormento
Como flores nas encostas do cimento”
(Marcelo
Yuka)
* Publicado
originalmente em Mídia
Ninja.
Fabio Py
Não é fácil traçar uma linha sobre qualquer grupo social religioso. É ainda mais difícil desenhar uma linha sobre um grupo sociorreligioso tão grande como os evangélicos, os quais nas últimas décadas cresceram e contabilizam 31% da população brasileira. Uma pesquisa dos estudos demográficos vem chamando a atenção dos analistas porque apontam que por volta de 2032, os protestantes-evangélicos devem se transformar no maior grupo religioso do Brasil. Esse dado vem causando certo alarme nos meios intelectuais, pois se tem a impressão de que essa parcela da população seja parte de uma nova formação talibã, ou seja, uma massa de religiosos dotados de pouco pensamento crítico e que obedecem como zumbis às lideranças religiosas persecutórias a pluralidade democrática.
Para
problematizar essa descrição sobre o setor, produzida principalmente por
setores das elites e/ou intelectuais, selecionei dois novos mandatos políticos
de vereadores, que unem as experiências evangélicas e as pautas de crítica ao
sistema capitalista. Antes de aprofundar este tema, farei uma breve recuperação
histórica para ampliar a análise sobre a questão dos vínculos dos
protestantes-evangélicos com os setores da esquerda, pois existe uma densa
“operação de esquecimento, silenciamento” (Pollack) da memória do setor com os
movimentos de questionamento da vida.
A
operação de silenciamento das Revoltas Camponesas na origem dos evangélicos
Algumas
correntes dos memorialistas entendem que as memórias coletivas são concebidas
pelos sujeitos de forma aleatória, a partir dos sonhos, como uma apropriação
psicologizante dos pensamentos sociais. Michael Pollack contraria tal concepção
ao indicar que “os debates e as percepções das memórias fazem parte dos debates
das lutas sociais, das intrigas das classes, podendo até causar uma longa
operação de silenciamento tanto de memórias como de setores sociais” (1989,
p.17). Assim, o silenciamento/esquecimento é uma operação complexa articuladora
tanto do passado, quanto das lutas sociais que mobilizam e ocultam ideias e
memorias na atualidade. Portanto, pode-se dizer que ainda hoje existe um processo
de interdição de certas memórias sobre a origem dos protestantes-evangélicos.
Os próprios analistas mais técnicos caem na artimanha montada pelos líderes
(religiosos midiáticos) que se arrogam porta-vozes dessa religião, como o
pastor Silas Malafaia e o bispo Edir Macedo.
Na
verdade, é do interesse desse grupo hegemônico o silenciamento da memória
inicial (e contínua) de protesto social dos evangélicos, que buscam, com isso,
se notabilizar. Por isso, indico que o setor protestante-evangélico de hoje é muito
mais complexo no Brasil que os gritos de Silas Malafaia buscam silenciar e os
dízimos/ofertas pedidos por Edir Macedo e Valdomiro Santiago buscam extorquir.
Para
tratar dessa complexidade, busco trazer à tona um movimento que foi devidamente
“silenciado”, na origem: as Reformas Europeias, dos séculos XV e XVI. As
Reformas foram encadeadas em várias geografias, de forma plural: na
Germânia levado pelo monge Martin Luther; na Suíça liderado por Zwinglio;
em Paris, por João Calvino; O rei Henrique VIII, na Inglaterra. Todos
esses movimentos, nas suas diferentes gradações, invariavelmente foram ligados
ao poder, aos reis, às monarquias.
Contudo,
existe uma reforma esquecida, que foi a mais perigosa, numerosa e justamente
não ligada às elites: as Revoltas Camponesas. Na verdade, essas Revoltas foram
um amplo movimento popular levado pelos trabalhadores do campo de todos os
cantos da Europa. Naquela época, até trabalhadores que vinham da África e da
Ásia se revoltaram contra o “Antigo Sistema Feudal” europeu. O movimento
transpassou as geografias de toda Europa, do Leste para o Norte. As Revoltas
Camponesas uniram variadas lideranças de diferentes regiões, tais como: Thomas
Muntzer, Georg Blaurock, Conrad Grebel, Agatha Trezel, John Miliandick, e Félix
Manz. Assim, uma grande rebelião camponesa varreu a Europa questionando a
divisão das terras dos reinos, seus revoltosos experimentavam as experiências
religiosas das glossolalias, não aceitavam a conexão das elites com o
cristianismo, e por isso, se rebatizavam nos rios. Eles foram chamados de
“anabatistas” – que numa tradução simples seria o “novo-batismo”.
As
Revoltas questionaram a ordem europeia a partir das mazelas dos trabalhadores
espoliados no continente. É claro que foram completamente massacrados pelos
reis, contudo, se parte dos derrotados foram mortos, degolados, e a outra parte
promoveu novas demografias, principalmente, no leste europeu. O que gostaria de
destacar sobre as reformas camponesas é a amplitude do movimento, que foi
numericamente o maior movimento das Reformas com alto caráter reivindicatório.
Infelizmente, no entanto, as reformas camponesas foram propositadamente
esquecidas. Essa “operação esquecimento” (Pollack, 1989) no Brasil é
recorrentemente reafirmada pelas elites intelectuais (ligadas ao positivismo e
ao elitismo acadêmico), que desacreditam o amplo movimento popular religioso do
início da modernidade, bem como pelos próprios líderes das grandes corporações
cristãs familiarizados com o poder, pois temem a memória perigosa dos camponeses.
Então, existe um duplo interesse hegemônico na manutenção do “silenciamento da
memória” das Revoltas Camponesas justamente por sua força como amplo movimento
evangélico popular anti-sistema.
União
espiritual das Revoltas Camponesas e as teologias progressistas
Assim,
ao apagarem as Revoltas Camponesas como parte das Reformas Europeias produziram
um “esquecimento” que ajuda na simplificação política do setor evangélico como
conservador ou de pouca crítica social. Por isso, para se opor a esse complexo
silenciamento simplificador do setor, discuto agora os grupos de esquerda
evangélicos atuais. Existem protestantes-evangélicos ligados às Teologias da
Libertação, à Teologia da Missão Integral, à Teologia Feminista, às Teologias
Negras. Todos movimentos teológicos que representam o questionamento às ordens
religiosas e ao modo de vida cristão.
Esse
conjunto de teologias insubmissas ajudaram nas últimas décadas a formar
diferentes grupos de evangélicos atentos as lutas sociais, que hoje, chegaram a
cargos no poder político. Portanto, busca-se na sequência do artigo pontuar
dois políticos eleitos na última eleição (2020), que se sentem irmanados pelas
Revoltas Camponesas, e se reconhecem como evangélicos de esquerda, são eles:
Wiliam Siri, do PSOL do Rio de Janeiro, e Elenizia Matta, do PT de Goiás.
Passamos agora a destacar essas duas importantes trajetórias políticas.
- Wiliam
Siri, sua trajetória político-religiosa de Campo Grande para a Câmara de
Vereadores
William
Carlos Brum Bispo, mais conhecido como William Siri, é membro da Igreja
Presbiteriana do Recreio (na cidade do Rio de Janeiro). Contudo, seu histórico
na igreja evangélica é antigo. Quando tinha dois anos de idade, seus pais se
converteram na Igreja Metodista Wesleyana- vertente pentecostal dos metodistas,
e passou a frequentá-la com a sua família. Por isso, se considera “praticamente
nascido no lar evangélico”. Lá pelos dez anos migrou para a Igreja Maranata, em
Campos Grande. Ficou nessa outra estrutura pentecostal até seus 20 anos, quando
passou a conhecer outras igrejas, e há quatro anos ele se estabeleceu na Igreja
Presbiteriana do Brasil, no Recreio.
Logo,
Siri tem longa trajetória entre os pentecostais. Sua vinculação com o PSOL
começa em 2015, antes, porém participava de encontros do PSB embora não fosse
filiado ao partido. Na entrevista ele narra como entrou no PSOL: “No PSB
conheci o deputado federal Glauber Braga, e depois, em 2015, pela morte do
Eduardo Campos, o PSB apoiou o Aécio Neves. E, aquele grupo resolveu sair, nós
fomos para o PSOL”. Em termos das eleições diretas, em 2016 e 2018, conseguiu
uma boa margem de votos, mas não se elegeu (ficou como terceiro suplente).
Também, entre 2017 a 2018 foi assessor do Glauber Braga (PSOL), e depois, entre
2019 à 2020, passou a trabalhar com o deputado federal Marcelo Freixo (PSOL).
Tal
como os revoltados camponeses do passado, William Siri entende que existe uma
conexão do cristianismo com a realidade. Afirma que o cristianismo tem toda a
“questão espiritual, envolvendo o evangelho, mas o cristianismo também tem a
política, na dinâmica de como tratar o outro, o próximo (…) A vida é política!
As escolhas que vamos fazendo são políticas. Acho que é isso, é o combate à
desigualdade, à injustiça”. O vereador vai mais adiante nos desafios do
cristianismo absolutamente político que “é todo mundo ter o que comer! Todo
mundo ter dignidade (…) bem estar, vida digna. Essa é a conexão do cristianismo
com a política na raiz”. O vereador sintetiza seu mandato sobre o paradigma da
dignidade, que é uma base do cristianismo. Para ele, o cristão deve se
“conectar com a política raiz, que é de luta por justiça e dignidade para todos
e todas de forma irrestrita”, o que no território da periferia da cidade é
“todo mundo ter acesso à cultura, ao desenvolvimento, acesso à saúde de
qualidade (…) Essas pautas têm total conexão com os ensinamentos de Jesus”.
O
mandato coletivo do jovem vereador Siri se liga politicamente à espacialidade
da Zona Oeste, onde fica o bairro em que mora, isto é, em Campo Grande. Afirma
“nossa cidade é maravilhosa, mas na Zona Oeste, Campo Grande, Bangu, Guaratiba,
Realengo, tem uma desigualdade enorme. São mais de 2 milhões de pessoas com
muita desigualdade, muita miséria”. Assume seu mandato sobre o prisma de
colocar “a discussão da produção da desigualdade, da pobreza, de ter educação,
ter transporte digno que aqui é, sobretudo, sucateado”.
O
vereador diz ainda sobre a espacialidade que vive: “tem uma área rural muito
grande na Zona Oeste (…) estou trabalhando todas as questões ambientais,
saneamento básico, que não tem aqui”. Portanto, com o mandato, Siri busca
inverter a lógica das gestões e das elites urbanas que olham a cidade a partir
do centro. O desafio de sua política “é de um olhar de cidade, a partir do
subúrbio”, assim, sua proposta é de se colocar junto aos trabalhadores urbanos
que não moram nos centros, mas principalmente, nos cinturões periféricos
distantes, como os moradores da Zona Oeste.
Diferente
dos grandes nomes da Bancada Evangélica do Congresso Nacional, o vereador não
teve apoio de qualquer instituição religiosa, pois “não é a favor”. Ao
contrário das pautas das grandes corporações evangélicas, sua atividade
religiosa se liga ao coletivo que ajuda a construir o “Tudo Numa Coisa Só”, na
Zona Oeste. O coletivo tem 12 projetos, como um pré-vestibular comunitário, e
se notabiliza a partir de uma atividade de impacto ecumênico que é a Caminhada
pela Liberdade Religiosa. O vereador, diferente dos evangélicos apologéticos
exclusivistas, circula em “outras religiões”, e por isso, acha importante não
ter apoio institucional de qualquer grupo religioso, considerando
“completamente errado. Não condiz!”.
Ao
fim da conversa, o vereador conclui que busca dar visibilidade as pautas da
Zona Oeste que tem “2 milhões de pessoas que tem dons, e justamente a falta de
investimento dificulta as pessoas a se desenvolvem, desperdiçando talentos,
vocações (…) mas o que não falta aqui são pessoas extraordinárias”. Portanto,
luta para que os moradores da região “tenham acesso à cultura, a terem mais
equipamentos culturais, que são apenas 26 equipamentos culturais, enquanto a
Zona Sul são mais de 200 (…) e o que tem aqui é sucateado, é um descaso muito
grande”. Contudo, o grande gargalho da população da Zona Oeste é a “questão do
transporte público que dificulta o translado para o trabalho”, fazendo com que
a população gaste horas no dia nos trajetos.
- Elenízia
da Mata, trajetória político-religiosa na defesa do serrado e a luta
contra o machismo estrutural
Outra
persona política irmanada a partir das Revoltas Camponesas, é Elenízia da Mata.
Formada em Letras pela UEG, com MBA em Gestão do Terceiro Setor e
especialização em Direitos Sociais pela UFC, Elenízia pertence a Igreja de
Cristo. Nascida num lar evangélico, seu pai é pastor da Assembleia de Deus,
onde ficou até os 18 anos. A partir dali, foi para a Igreja de Cristo, uma
denominação pentecostal independente da cidade de Goiás, iniciada em 1986, pelo
pastor Raimundo Aires e a bispa Rosa Heide. Migrou para essa igreja “para
ampliar o diálogo do cristianismo com a vida” – embora mantenha relação com
pessoas da Assembleia de Deus.
A
vereadora entrou no PT oficialmente em 2003, embora já participasse das suas
atividades antes. Ligou-se ao partido no movimento de pessoas de esquerda da
cidade que tentavam abrir espaço para disputar com as antigas oligarquias. Hoje
ela é da direção do partido, e justifica: “acho super importante ser uma mulher
na disputa por narrativas dentro dele”. Para ela, a função “do cristão e da
cristã primar pelos princípios básicos chamados pelo nosso grande líder, que é
Jesus Cristo. Ou seja, zelar pelas pessoas, pelos pobres, pelas viúvas. O
cristão deve servir aqueles e aquelas que são mais vulneráveis”. Diz ainda que
o cristão na sociedade deve “cuidar de quem está preso, quem tem fome, quem não
tem roupa, com os desvalidos”, destaca. A vereadora completa: “a política é um
instrumento oficial para execução desse chamado”.
Elenízia
esteve à frente do Centro Especializado de Atendimento à Mulher, ligado à
prefeitura de Goiás, com função de trabalhar com mulheres na condição de
violência doméstica, e na prevenção da violência. Esse projeto foi considerado
uma das melhores iniciativas nas gestões de municípios do Brasil. Segundo
Elenízia, “ajudou a fortalecer meu nome, porque você exercer um cargo público
de excelência (…) por ser de esquerda e uma mulher cristã a princípio causou
muito estranhamento”. A vereadora consegue unir a vivência na Igreja ao
trabalho de luta pelos direitos das mulheres diretamente quando promove
atividades sobre violência de gênero nas igrejas da região. Esse projeto foi
até aprovado pelo conselho de pastores de Goiás.
A
vereadora é atenta também as questões da ancestralidade. Pouco antes da
eleição, teve atuação na territorialidade do Quilombo Alto Sant’Anna “tanto na
organização da comunidade, de dados para o relatório para o reconhecimento da
Fundação Palmares, quando na organização que deu personalidade jurídica ao
movimento” – sendo umas das lideranças do movimento negro na organização do
“Fórum de Igualdade Racial, que já existe enquanto coletivo”. Ela se orgulha de
participar do projeto de Mulheres Coralinas: “um projeto para mulher, com
mulheres que se captou recurso da extinta Secretaria de Políticas Públicas para
mulheres, ligada à presidência da república”.
Assume
que seu mandato está “pautado na luta antirracista, principalmente, pelo viés
da questão da segurança para as mulheres”. Por isso, se atenta para a “geração
de trabalhos, oportunidades e tanto de empoderamento de espaços de poder para
as pessoas mais vulneráveis, que em geral são as pessoas pretas, em geral são
mulheres, então isso está interligado”. A vereadora reconhece a vinculação do
cristianismo com o socialismo, que se dá “a partir do Reino de Deus, que é
sobretudo pautado no reino de justiça, pautado na equidade, no cuidado com
aqueles que são mais frágeis, com aquelas pessoas que estão marginalizadas, com
aqueles e aquelas que tem fome e sede de justiça”.
Ela
não deixa de destacar a conexão do cristianismo com seu partido. Pois ele é
formado por “trabalhadores, por aqueles e aquelas que tiveram a vida impactada
pelos poderosos e que decidiram pela insurgência pela luta de seus direitos”.
Seu mandato defende a “vida segura das mulheres (…) e que tenha delegacia
especializada”, e, se propõe trabalhar com os agressores, pois que “se entenda
que o machismo estrutural atravessa os corpos dos homens agressores”. Por fim,
é sensível a questão da geração de renda para o “setor negro da sociedade, pois
a questão do racismo institucional impede a inclusão econômica também (…) assim
também tratar da questão da geração de renda pautada em economia solidária”.
Novas
lideranças evangélicas de esquerda e a inspiração popular
Portanto,
a força política de William Siri e Elenízia Matta se possibilita a partir de
suas experiências sociais e religiosas junto às suas espacialidades que
permitem agremiar lutas na defesa do despossuídos e aos que sofrem violência
junto aos seus mantados políticos populares. Ambos são impulsionados por um
cristianismo mais humano atento às dores e às mazelas. Com este artigo,
selecionei as trajetórias politicas desses dois crentes, que são novas faces de
políticos evangélicos de esquerda que não se ligam à Bancada Evangélica, à
Frente Parlamentar Evangélica e ou a qualquer estrutura Evangélica dos grandes
evangelistas. Também, apontei que a expansão evangélica avança nos territórios
brasileiros formando também pessoas que pensam um cristianismo mais encarnado,
insubmisso. Assim, Elenízia da Matta, mulher, pentecostal, negra, direto do
cerrado brasileiro, e William Siri, do Sudeste, periférico da Zona Oeste do Rio
de Janeiro se inspiram na memória dos camponeses que lutaram contra o peso dos
poderosos do mundo europeu do seu tempo. Um dado interessante é que tanto Siri
quanto Elenízia passaram a infância e a adolescência nas comunidades
pentecostais que se multiplicaram pelo Brasil. Nada mais pulsante e popular no
Brasil contemporâneo.
É
a partir do amplo território das periferias brasileiras que ambos se
identificam com os movimentos de esquerda evangélica que sofrem diariamente um
processo de “silenciamento/apagamento” do passado e no presente. Mas, que
humanizam as lutas no setor, lutando por justiça, de forma antirracista,
feminista, pelo acesso à moradia, à justiça ambiental e pelo transporte dos
trabalhadores. Nesse sentido, suas personas inspiram e são icônicas nas suas
geografias mesmo quando ao inverso do senso comum que desacredita em qualquer
conexão dos evangélicos e as diferentes gradações das esquerdas. Sim, ambos
mostram que a simplificação histórica do setor protestante-evangélico só ajuda
aos coronéis da fé, reafirmando a barganha fundamentalista.
E,
como destacado aqui, essa “operação de silenciamento” e simplificação despreza
propositadamente a origem das Revoltas Camponesas, para também, apagar da
memória figuras como o pastor Guaracy Siqueira, metodista que participou da
Revolta Constitucionalista de São Paulo de 1932, depois se tornaria Deputado
Federal – se dizia socialista cristão. Essa operação também silencia os grupos
evangélicos trabalhadores rurais, nas Ligas Camponesas, nas décadas de 1950 e
1960, liderados pelo advogado/deputado batista-presbiteriano Francisco Julião.
Também, forçam o esquecimento das juventudes presbiterianas, batistas,
metodistas, luteranas e anglicanas que lutaram contra a Ditadura
civil-empresarial-militar no Brasil.
O
que pretendo dizer é que o setor evangélico nunca foi uniforme em termos
políticos e sua vinculação com as direitas é uma conclusão apressada. Ocorre
assim desde a formação dos protestantes-evangélico nas Reformas Europeias um
complexo exercício das elites religiosas de “operar o silenciamento” dos
setores descontentes, subversivos dos crentes que questionavam o status
quo. E, hoje, parte das esquerdas evangélicas se inspiram nos movimentos
dos camponeses revoltosos que buscaram se libertar das amarras dos reis,
orando, rezando, falando em línguas, se organizando para lutar por
moradia/terras, contra as elites religiosas do seu tempo e sobretudo por
justiça social.
É
verdade, que muito se repete sobre não generalizar os protestantes-evangélicos.
Contudo, acredito que se deva dar um passo a mais. Não basta o alerta pela não
generalização do setor, mas, a partir da memória “esquecida” dos camponeses
revoltados contra o Antigo Regime, deve-se dizer para não se subestimar os
crentes. Sim, porque é uma constante das elites e dos mais letrados desprezar
aqueles que seguem limpando os ladrilhos, os vasos, os que são explorados pela
servidão dos tempos pandêmicos. Pois, a população evangélica, no Brasil, é
parte contundente das camadas populares. Logo, o desprezo pelo setor, se
resvala no preconceito de classe e no racismo direcionado às populações negras
das periferias.
As
mesmas elites e os mais letrados que cismam em cortar as flores, ou então,
desprezá-las ao nascerem nas encostas cimentadas. William Siri e Elenízia Matta
são flores que aparecem no cinza opaco das encostas, mas que dão luz e beleza,
e mostram força ao rompem com o cimento. Ambos conjuntamente são um anuncio da
primavera. E, ela, o bom Marcos nos ensinou que é inevitável.
Bibliografia:
BARROS,
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CALDEIRA,
Cleusa. Fundamentos teológicos da Política. Rever, v.18, n.3, 2018.
DREHER,
Martin. História do povo de Jesus. São Leopoldo: Sinodal, 2012.
ENGELS,
Frederick. The Peasant War in Germany. Moscou: International Publishers, 1926.
GAGNEBIN,
Laurent e PICON, Raphaël. Le protestantisme: La foi insoumise. Paris:
Flammarion, 2005.
GOERTZ,
Hans-Jürgen. Thomas Müntzer. Mystiker – Apokalyptiker – Revolutionär. München:
Beck, 1999.
GRABOIS,
Pedro. Devir minoritário no ‘devir-evangélico’ do Brasil. UniNomade Brasil,
2018. Em: http://uninomade.net/tenda/devir-minoritario-no-devir-evangelico-do-brasil/.
LOWY,
Michael. A guerra dos deuses, Petrópolis: Vozes, 2000.
PACHECO,
Ronilso. Teologia negra: o sopro antirracista do espirito.
Brasília: Novos Diálogos: 2019.
PEREIRA,
Nancy Cardoso. Teologia da Mulher. Encontros Teologicos, v.30,
2015, p.121-134.
POLLACK,
Michael. Memória, Esquecimento e Silenciamento. Estudos históricos,
v.2, n.3, Rio de Janeiro, 1989, p.3-15.
PY,
Fábio. Pandemia cristofascista. São Paulo: Recriar, 2020.
RAMOS,
João Oliveira. Fé subversiva: o conflito sociopolítico da ideologia
anabatistas com as demais propostas da Reforma Protestante na Europa Central
entre 1525 à 1555. Tese de Doutorado em História, UFG, 2016.
RANDELL, Keith. Luther and the German Reformation 1517-55. Michigan: TransAtlantic Publications, 2000.
sábado, 10 de abril de 2021
Boas-vindas a Roberto Torres
É
com muita alegria e entusiasmo que apresentamos nosso mais novo colaborador
permanente: Roberto Dutra Torres Jr.
Roberto notabiliza-se por sua participação ativa no
debate público e por uma trajetória profissional que perpassa docência,
pesquisa e gestão pública. Ainda jovem para um intelectual, Roberto já parece
ter vivido mais de uma vida como cientista social e sua interlocução é
promessa de mais vida para a tarefa que nos inspira no Autopoiese & Virtú. Ademais,
tendo o blog este nome, não poderíamos mesmo deixar de ter um sistemista dos
bons em nosso elenco. Ou, como o próprio diz, um “luhmmaniano de
esquerda”.
Não
poderia deixar de fazer menção ao fato de que fomos colegas de turma na
graduação em ciências sociais na UENF no início dos anos 2000 e de que, aos
meus olhos, Roberto – até então o “Soró” que havia conhecido na antiga Escola
Técnica Federal de Campos – já impressionava por suas indagações bastante
maduras para quem apenas iniciava sua formação científica. Das indagações, não
demoraria muito tempo para que, cumprindo uma a uma as etapas de formação,
devolvesse à sociedade fluminense proposições (provocações?) indispensáveis sobre
as opções culturais que o povo brasileiro tem ao seu dispor diante das
contradições vividas no tempo presente.
Nosso
time ganhou um reforço e nossa comunidade de leitores(as) um aliado do bom combate.
Seja
bem-vindo, Roberto!
sexta-feira, 9 de abril de 2021
Divulgação - Entrevista com Carlos Valpassos
"O professor e Antropólogo, Carlos Valpassos, fala do enfrentamento à pandemia do coronavírus no país, com as ações dos governos federal, estadual e municipal. Ela também comenta sobre o papel da população para atenuar os efeitos da pandemia, além do cenário político em todas as esferas".
Transmitido pelo Folha no Ar 1, edição de 09/04/2021.
Acessível aqui.
terça-feira, 6 de abril de 2021
A desigualdade como problema moderno
A desigualdade como problema moderno*
Roberto Dutra**
* Publicado originalmente
em Folha 1.
A
sociedade moderna é a primeira sociedade em que a desigualdade é percebida como
problema social. Quanto mais trivial este fato parece ser, mais as
pré-condições sociais desta problematização são esquecidas. Compreender a
desigualdade não é só explicar causalmente seu surgimento, sua reprodução e sua
mudança, mas também as condições sociais que tornam possível problematizar este
fenômeno e observar suas causas não como um dado da natureza, mas como
estruturas sociais que podem ser modificadas.
Como
é possível que a vida social nos permita ver a desigualdade como um problema e
não como garantia natural de ordem? A crítica e a problematização da
desigualdade social do ponto de vista da justiça e igualdade pressupõem uma
ordem social que seja compatível com a mutabilidade destes fenômenos. Na maior
parte da história social da humanidade a desigualdade não foi um problema, mas
sim um dado da natureza aceito como tal pelos humanos. Nem toda ordem social
comporta a problematização e a mudança das estruturas de desigualdade social.
Tanto a crítica da desigualdade quanto as idéias sobre justiça social que
orientam esta crítica, incluindo as utopias políticas e o “igualitarismo
primitivo” dos sociólogos (Müller, 2002, p. 497-498), pressupõem uma ordem
social na qual a mudança das estruturas de desigualdade possa ocorrer sem que
esta ordem social desmorone. A mudança das estruturas de desigualdade requer
certa continuidade institucional e cultural na sociedade. A idéia de que
podemos transformar as estruturas de desigualdade social é muito mais do que
uma expectativa sociológica projetada na sociedade (Sachweh, 2011, p. 581): é
uma conquista evolutiva da sociedade moderna, que está diretamente ligada à
transição para um novo tipo de ordem social, na qual o princípio da igualdade
orienta a participação dos indivíduos na política e no direito. É somente como
resultado de práticas sociais específicas destas esferas que a desigualdade
deixa de ser vista como um dado natural para ser percebida como um obstáculo à
realização de determinadas normas e valores sociais. A problematização jurídica
e política da desigualdade é o resultado da diferenciação da sociedade em
esferas sociais autônomas (economia, política, direito, ciência, família,
religião, artes etc.), que abre um horizonte de observação no qual assimetrias
entre indivíduos e grupos sociais podem ser percebidas como contingentes e
arbitrárias.
A
igualdade moderna é complexa (Walzer, 2003): não supõe e nem exige a eliminação
de toda e qualquer assimetria social, mas daquelas assimetrias que se somam
umas as outras e geram um processo de acumulação de vantagens e desvantagens
que destroem a possibilidade de igualdade no acesso a um padrão de vida
considerado “digno” e “civilizado” em cada contexto. A igualdade moderna é complexa,
não absoluta, porque a sociedade não é uma unidade, mas uma pluralidade de
esferas. É este tipo de igualdade complexa que chamamos de cidadania. A
pluralidade estrutural criada a partir da diferenciação da sociedade em esferas
disponibiliza um horizonte comparativo que coloca as desigualdades em situação
de maior ou menor pressão por legitimação. Formas de desigualdade típicas de
uma esfera (como as desigualdades de classe produzidas na economia e no sistema
de ensino) podem ser contrastadas com formas de igualdade vigentes em outras
esferas (como a igualdade formal vigente no sistema político e no sistema
jurídico). Em sociedades estamentais como o sistema feudal e o colonial, havia
uma unidade estrutural que bloqueava o horizonte comparativo e com isso
contribuia para a legitimação não problemática da desigualdade.
Em
sua clássica sociologia da cidadania, Marshall (1967) vincula explicitamente o
desenvolvimento da busca por igualdade à superação desta unidade estrutural
característica de sociedades estamentais e com isso à diferenciação da
sociedade em instituições funcionalmente especializadas. Em sociedades feudais,
afirma, “não havia nenhum princípio sobre a igualdade dos cidadãos para
contrastar com o princípio de desigualdade de classes”(Marshall,1967, p. 64).
Com a diferenciação da sociedade em esferas autônomas, ao contrário, a
desigualdade de classe deixa de estar fundada em seu próprio direito, e passa a
ser “um produto derivado de outras instituições” (Marshall, 1967, p. 77). As
duas coisas também podem ser afirmadas em relação às relações de gênero,
raça/etnia e à própria divisão política do mundo em nacionalidades (o lado
excludente do princípio da cidadania que Marshall não abordou): assim como as
relações de classe, elas são constitúidas e observadas em contraste com formas
de igualdade vigentes em outras esferas, especialmente com a igualdade formal
de natureza política e jurídica, e são produto derivado de outras instituições.
A desigualdade pode deixar de ser um problema
O
horizonte cognitivo e normativo que condiciona a problematização da
desigualdade não é um dado. Como a hipótese sobre a possível formação de uma
sociedade “neofeudal” sugere, este horizonte pode ser eliminado da vida social:
a institucionalização da igualdade em determinadas esferas sociais, como o
direito e a política, pode ser removida pela formação de estamentos capazes de
suprimir a diferenciação da sociedade em esferas. A desigualdade pode deixar de
ser um problema para se tornar novamente um dado natural.
Esta
possível eliminação do horizonte cognitivo e normativo da igualdade eliminaria
também as condições de possibilidade da crítica social da desigualdade. Vale
repetir: Esta crítica social é institucionalizada através da introdução e
desenvolvimento de direitos de cidadania universalistas, dependendo diretamente
das estruturas do sistema político e do sistema jurídico: É somente porque
todos os cidadãos têm formalmente o mesmo status político e jurídico que as
desigualdades em outras esferas da vida se tornam um problema que deve ser
revolvido a partir de decisões políticas e jurídicas: “A distinção entre
igualdade e desigualdade constitui um paradoxo. Quanto mais iguais nos
tornamos, segundo o paradoxo, mais descobrimos desigualdades, algumas delas de
natureza infinitesimal” (Müller, 2002, p. 497).
Recentemente,
alguns estudiosos têm levantado a hipótese da refeudalização e renaturalização
das desigualdades sociais na sociedade mundial contemporânea (KALTMEIER, 2020;
KOTKIN, 2020; DURAND, 2020; ROTH, 2021). Para Joel Kotkin e Olaf Kaltmeier, a
classe economicamente dominante está se transformando em um estamento global
que concentra recuros econômicos, políticos e culturais no topo da pirâmide
social, destrói as classes médias e constrói aquela fusão de dimensões da desigualdade
que elimina qualquer esfera da igualdade capaz de servir de contraponto às
assimetrias sociais existentes. O novo estamento global passa a dominar a
subjulgar as elites políticas, jurídicas e culturais. Surgiria um novo tipo de
ordem social de estamentos fechados que suplanta a diferenciação da sociedade
em esferas autônomas. Para Cédric Durand, estaríamos diante da formação de um
“tecnofeudalismo” como resultado da evolução recente da economia de conquista
de dados e espaços digitais: as plataformas corporativas que conquistam,
concentram e administram o “mar de dados” (Big Data) produzidos pela multidão
de indivíduos e organizações tornam-se “senhores feudais”, dos quais estes
indivíduos e organizações passam a depender de modo radicalmente assimétrico.
Para Steffen Roth, a possibilidade de formação de uma sociedade neoestamental
deve ser tratada como um cenário improvável ao lado de outros possíveis. Ele
advoga que a entronização do valor da saúde, como possibilidade surgida da
pandemia da Covid-19, produziria a cosmovisão adequada para sustentar e
legitimar esta hierarquia neoestamental pós-moderna: povos sanitarimente
inferiores poderiam ser governados e colonizados por povos sanitariamente
superiores:
“Em
uma sociedade mundial da saúde "neo-medieval", seria fácil e óbvio
medir não apenas funções específicas, mas praticamente todos os papéis, valores
ou comportamentos tendo como parâmetro sua contribuição ou ameaça à saúde. O
surgimento de classes, castas ou Estados correspondendo a diferentes níveis de
saúde, pureza, infecção ou poluição seria uma consequência provável” (ROTH,
2021, p. 7).
Como
vimos, a diferenciação da sociedade em esferas e a igualdade política e
jurídica são condições de possibilidade para que a desigualdade seja
problematizada, criticada e politizada na sociedade. O aumento da desigualdade
e da dependência econômica em relação às corporações que controlam Big Data, e
a prevalência de um sistema social (saúde) sobre os outros parecem ser
condições necessárias, mas não suficientes para apontar o colapso das condições
de problematização da desigualdade. Para que ocorra este colapso, o aumento da
desigualdade e o surgimento da dependência na economia digital teriam que
resultar não só na fusão das formas de inclusão e desigualdade de distintas
esferas sociais, mas esta fusão teria também que eliminar o horizonte normativo
e cognitivo da igualdade que permite a problematização da desigualdade. A
prevalência do sistema econômico e das desigualdades econômicas teria que ser
acompanhada pela formação de uma ordem social mais ampla, destituída de
qualquer esfera na qual o valor da igualdade esteja institucionalizado e sirva
de parâmetro imanente para politizar desigualdades observadas em outros
sistemas sociais. Concretamente, esta ordem social mais ampla teria que ver
destruída por completo a igualdade formal entre indivídos e povos,
institucionalizada no sistema de Estados nacionais e na cidadania, para que a
renaturalização da desigualdade pudesse substituir a igualdade complexa. O mesmo
vale para a possibilidade de que o sistema da saúde venha a ocupar a posição de
centralidade que a economia ocupa na maioria das situações, com a consequência
de que a estrafificação sanitária se torne a dimensão capaz de fundir a agregar
desigualdades em uma hierarquia social global, unitária e renaturalizada.
A
prevalência de uma esfera social sobre outras é muito mais regra do que exceção
na história da sociedade mundial moderna e não significa necessariamente a
fusão de estruturas de desigualdade destas diferentes esferas. A formação de
grupos estamentais também não basta para identificar o colapso da igualdade.
Estruturas de desigualdade estamental especificamente modernas não apenas se
formaram a partir de desigualdades de patrimônio e poder ao longo dos séculos
XIX e XX (BOURDIEU, 2014), como também foram politizadas e em boa medida
alteradas pela própria evolução das esferas sociais.
No
entanto, a possibilidade do colapso da igualdade não pode ser descartada. O
aumento vertiginoso das desigualdades econômicas, os obstáculos à superação de
desigualdades raciais, étnicas e gênero em diferentes esferas sociais e a
fragilidade institucional dos direitos igualitários de cidadania são fenômenos
que apontam justamente para a possibilidade de desconstrução do horizonte
normativo e cognitivo da igualdade e da consequente renaturalização das
assimentriais sociais dos mais diversos tipos.
Bibliografia
BOURDIEU,
P. Sobre o Estado. São Paulo: Cia das Letras, 2014.
DURAND,
C. Technoféodalisme: Critique de l’économie numérique. Paris: Éditions La
Découverte, 2020.
KALTMEIER,
O. Refeudalisierung und Rechtsruck: soziale Ungleichheit und politische Kultur
in Lateinamerika. Bielefeld: Bielefeld University Press, 2020.
KOTKIN,
J. The coming of neofeudalism. A warning to the global middle class. New York:
Encounter Books, 2020.
MARSHALL,
T. H. Cidadania, Classe Social e Status. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1967.
MÜLLER,
H-P. Die drei Welten der sozialen Ungleichheit: Belohnungen, Prestige
und
Citzenship. Berliner Journal für Soziologie, n. 4 , p. 485-503, 2002.
ROTH,
S. The Great Reset. Reestratification for lives, livelihoods, and the planet.
Technological Forecasting and Social Change, v. 166, p. 1-8, 2021.
SACHWEH,
P. Unvermeindbare Ungleicheiten? Alltagsweltliche Ungleichheitsdeutungen
zwischen sozialer Konstruktion und gesellschaftlicher Notwendigkei. Berliner
Journal für Soziologie, n. 21, p. 561-586, 2011.
WALZER,
M. Esferas da justiça. Uma defesa do pluralismo e da igualdade. São
Paulo: Martins Fontes, 2003.
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Sociólogo. Mestre em Políticas Sociais. Doutor em Sociologia.