Prólogo
Esta é uma carta
com sugestões para a quarentena que fiz para meus alunxs de Ciências Sociais na
UFF-Campos dos Goytacazes. A demanda me chegou pela galera do Centro Acadêmico
Gisele Reis, o CAGIR para os mais íntimos.
O texto foi
publicado originalmente no perfil do Centro Acadêmico no Instagram: @cagir_cs.
Podem seguir lá! O pessoal vai gostar :)
O que sugerir numa hora dessas? – dicas em quarentena
George Gomes Coutinho
Caríssimxs
estudantes,
Como estão
vocês? Suas famílias? Seus queridxs? Amores? Amigxs? Pets? (use a ordem que
melhor se encaixar para você e ignore quando for o caso).
Por aqui tudo
sob controle. Como devem saber muitos de
nós prosseguimos em nossas rotinas no trabalho em home office. Inclusive o home
office não é exatamente uma novidade dada a inexistência de gabinetes de
trabalho na UFF-Campos.
Posso afirmar
que o trabalho dxs docentes do Departamento, o que envolve pareceres, artigos,
preparação de aulas, estudos, etc.., invariavelmente é feito em casa mesmo onde
dividimos nossa atenção com família, queridxs, amores, amigxs, pets (não nesta
ordem de atenção em todos os momentos).
Este trabalho de
bastidor, aquele que não é visível, persiste turbinado pela conjuntura.
Mas, há a
ausência inegável e sentida dos encontros dos grupos de pesquisa, das reuniões,
das aulas... De tudo aquilo que constitui o nosso habitat concreto que todxs
compartilhamos e onde criamos afinidades, desavenças, disputas, solidariedade...
Enfim, na rua José do Patrocínio 71, entre paredes de alvenaria ou de
contêineres, que nos esbarramos e nos co-influenciamos (uns com os outros, uns
contra os outros). Torço sinceramente que possamos todxs compartilhar esses
espaços em breve. Para ontem.
Até porque o
momento em que forem permitidas as aulas presenciais será o sinal evidente do
término da travessia do deserto que todxs nós estamos fazendo por agora.
Sem mais
delongas... Vou para as minhas dicas.
Começo em algo
para ouvir: o podcast Xadrez Verbal. Eu o recomendo para quem tem interesse em
política internacional. Até porque, vamos e convenhamos, parte da cobertura de
política internacional da grande imprensa é muito pobre (vocês entenderão ouvindo
o podcast). Para além disso, Átila Iamarino, epidemiologista que se tornou
figurinha fácil em tempos de pandemia na mídia, tem se colocado como
comentarista residente no Xadrez. Então, aqui temos epidemiologia séria em
perspectiva comparada e vocês poderão compreender bastante, em termos factuais,
como se pode construir uma análise verdadeiramente abrangente sobre um problema
sério de caráter transnacional. E sem o caráter transnacional não entendemos a
conjuntura Covid-19.
No campo das
leituras eu irei me concentrar em 4 pontos: sociologia do risco, Estado de
Exceção, crise das democracias e Bolsonarismo.
- Sociedade de
Risco: é o Ulrich Beck mesmo. O alemão falecido no ano de 2015 deixou uma
abordagem que alertava sobre o quanto os Estados-Nacionais teriam dificuldades
concretas para produzirem a regulação de seus próprios territórios e relações
no processo de radicalização da modernidade. Questões ambientais, riscos com
energia atômica, financeirização, são faces concretas das demandas colocadas
por nossos tempos. Podemos acrescentar também aí as pandemias....
- Estado de
Exceção: texto que é velho conhecido de quem fez Política IV comigo. Descortina
já no pós-11 de setembro a fragilização dos direitos civis e explicita os
mecanismos de exceção inseridos na arquitetura das constituições liberais (por
exemplo o Estado de Sítio). Texto fundamental para lembrar que nas democracias
representativas deve-se dormir com um olho aberto e outro fechado. Neste
momento, aqui e alhures, os direitos civis encontram-se sob mira a partir da
utilização justamente destes mecanismos constitucionais;
- Crise das
democracias: inseri aqui Castells, Mounk, Runciman, Levistsky, Ziblatt...
Diferentes perspectivas sobre a democracia representativa liberal contemporânea,
sua crise e aquela sensação de que “tudo que é sólido continua se desmanchando
no ar”. São descrições que explicam a fisionomia do sistema político que
encontrou o Covid-19;
- Bolsonarismo é
um fenômeno social e político com profundo impacto nos processos de tomada de
decisão de indivíduos, gestores públicos, agentes de mercado, etc.. As ações no
contexto da pandemia em solo brasileiro se colocam neste pano-de-fundo: ou
adesão acrítica ou adesão parcial ou enfrentamento. Para entender o fenômeno penso
que textos da Isabela Kalil e da Rosana Pinheiro Machado podem ajudar a
entender esta “ambiência” onde decisões políticas são tomadas, desditas,
gritadas.. e nos fazem arrancar cuecas e calcinhas pela cabeça quase que
diariamente nesta república dos tweets.
Até breve e
cuidem-se bem!
Referências Bibliográficas:
AGAMBEN,
Giorgio. Estado de exceção. São
Paulo: Boitempo, 2004.
BECK, Ulrich. Sociedade de risco: rumo a uma outra
modernidade; São Paulo: Editora 34, 2010.
CASTELLS,
Manuel. Ruptura: a crise da democracia
liberal. Rio de Janeiro: Editora Zahar, 2018.
LEVISKY, Steven
& ZIBLATT, Daniel. Como as
democracias morrem. Rio de Janeiro: Editora Zahar, 2018.
KALIL, Isabela
Oliveira. Quem são e no que acreditam os eleitores de Jair Bolsonaro.
(Relatório de Pesquisa).
KALIL, Isabela
Oliveira, MORETTO, Márcio & ORTELLADO, Pablo. Pesquisa no ato “PT nunca
mais”. (Relatório de Pesquisa).
RUNCIMAN, David.
Como a democracia chega ao fim. São
Paulo: Todavia, 2018.
MACHADO, Rosana
Pinheiro & SCALCO, Lucia Mury. Da esperança ao ódio: juventude, política e
pobreza do lulismo ao bolsonarismo. In: Cadernos
IHUideais. São Leopoldo, Unisinos, Ano 16, n.278, vol.16, 2018.
MOUNK, Yascha. O povo contra a democracia: por que nossa
liberdade corre perigo e como salvá-la. São Paulo: Companhia das Letras, 2019.
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