quarta-feira, 3 de fevereiro de 2021

Jojo Toddynho é apenas uma menina


Fonte: Gazeta.

Jojo Toddynho é apenas uma menina

 

Renata Saul*

 

Dia desses, eu estava em alguma rede social e, sabe Deus por quê, deparei-me com um vídeo em que a cantora de funk Jojo Toddynho declarava seu amor a um filme infantil chamado “O mistério de Feiurinha”. Eu sorri com a alegria da cantora e procurei alguns vídeos sobre ela.

Nascida em 11 de fevereiro de 1997, Jordana Gleise de Jesus Menezes tem 23 anos. Jojo Toddynho é uma menina.

Outra coisa que me chamou atenção foi a linguagem corporal de Jojo Toddynho nos vídeos. Confesso não ser especialista no tema, mas sou observadora, mulher negra e queria compartilhar algumas ponderações.

A menina Jojo anda sempre com a cabeça extremamente erguida e não no sentido figurado, aquele da metáfora da dignidade (coisa que ela demonstra ter), mas como se perguntasse: “Algum problema?”. Ombros para trás, externo muito projetado. Jojo Toddynho é negra, veio das classes menos favorecidas e é gorda. Ela precisou ser uma “afronta” para que não a atropelassem constantemente. A postura corporal é a de um corpo que está em constante alerta, pronto para se defender, pois o ataque virá.

         Toda mulher sabe o que é sofrer pressão estética, como é ser constantemente questionada em suas atividades e até mesmo silenciada em razão do gênero. No caso da Jojo, agregue ainda a questão da classe social e da cor. As estatísticas no Brasil provam que ser mulher negra no Brasil é um eterno combate.

         Há entre nós o seguinte ditado: “A branca para casar, a mulata para fornicar e a preta para trabalhar”. Como se não bastasse o racismo, a objetificação da mulher, o ditado explicita o nosso tipo de racismo, alicerçado nos fenótipos (quanto mais características negróides, mais discriminação e racismo se sofre). Nesse ditado, a mulher branca “ganha” o status do título, da mulher casada, da que é apresentada à família, a que tem o direito ao matrimônio – gerar filhos para que o homem possa ter a quem entregar seu patrimônio, seu sobrenome. À mulata, palavra que tem origem no termo mula (animal híbrido, incapaz de gerar), cabe o papel da hipersexualização: não será apresentada à família. Por fim, temos a negra do último tom de pele: esta ainda luta para ser humanizada, já que, no ditado popular, não tem direito à afetividade ou à sexualidade: é ferramenta de trabalho. Jojo Toddynho é uma menina e é um “tiro, que samba e desfila com as amigas”, como diz sua música. Jojo é protagonista de sua história, mas ainda é apenas uma menina.

 

* Mestra em Cognição e Linguagem, Socióloga, Professora de Sociologia, Docente na rede municipal de educação básica de Campos dos Goytacazes-RJ e, não menos importante, neta de Dona Lourdes.

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