sábado, 1 de julho de 2023

Uma milonga para Helinho Coelho - George Coutinho

 

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Uma milonga para Helinho Coelho**

George Gomes Coutinho***

Conheci Helinho quando eu tinha 19 anos. Eu fui seu aluno. Ele tentou me convencer das virtudes de Gramsci na época. Não curti. Achei Gramsci moderado demais e eu estava mais sintonizado com a nitroglicerina de gente como Bakunin.

Muitos anos se passaram e Gramsci estava lá muito presente em minha tese. Helinho venceu.

Entre graduação e tese nos encontramos em diferentes ocasiões. No antigo Terapia´s Bar, ainda perto do Liceu, quando um intrépido e troncudo Helinho (sim, ele era forte) chega pilotando uma Caloi 10 tão magrinha que desafiava a física newtoniana. Papo vai, papo vem.. política, música, cultura e um engradado de cerveja são consumidos.. E lá se foi ele na mesma Caloi 10 em que tinha chegado.

Teve aquele dia improvável também. Em coordenada não rastreável por GPS, alguma coisa ali esquecida “nos fundos de Chapéu de Sol”, o reencontro. Era um trailer, ou o que restava de um, com pessoas reunidas ouvindo o violão dele.. Na mesa um scotch circulava generosamente. Eu, pato novo naquela lagoa, fiquei ali curtindo o papo, a viola e o céu estrelado só na cervejinha. Saí meio trôpego com o céu escuro. Mas, pelo que vi, Helinho estava com pique para amanhecer ali com seu repertório.

Ainda Helinho era macho pra caralho. Em 2018, quando a UFF Campos foi violada por um juiz eleitoral e seus brutamontes, ocasião em que a porta do DACOM foi arrombada para apreenderem, vejam só, um punhado de panfletos que deitavam inertes no fundo de um armário trancado dos estudantes, Helinho peitou defendendo a instituição. Foi ameaçado de prisão. Eu sei que não foi a primeira vez e pode nem ter sido a última.

Helinho era muita coisa. Músico, professor, político (foi vereador na cidade), advogado, historiador, poeta, agitador cultural.... e, como se não bastasse, gente boa! Como era gente boa!

Nos esbarramos uns 10 dias atrás em uma calçada da Pelinca. Estava especialmente elegante! “Tá mal intencionado hein?”, assim eu disse. Ele deu aquele sorriso meio maroto que todos nós curtíamos.

Rest in Power Helinho. Você dizia: “Essa cana, é sacana!”, em uma crítica à brutalidade de nosso canavial. Por sua saída tão abrupta eu digo que por vezes a vida também é sacana meu camarada....

* Helinho em 2018 em sala de aula da UFF-Campos, instituição pela qual se aposentou em dezembro de 2022. Foto de Johnatan França de Assis.

** Hélio Coelho, ou simplesmente Helinho como era carinhosamente conhecido, foi uma das figuras mais ativas da vida intelectual campista nos últimos 50 anos. Ele foi advogado, historiador prático, escritor, violonista, cantor, poeta, analista político e agitador cultural. Foi vereador e Presidente da Câmara Municipal durante a Ditadura e um dos líderes do Movimento pelas Liberdades Democráticas. Também foi membro da Academia Campista de Letras, associação que presidiu neste século XXI. O querido Helinho nos deixou na última quinta-feira aos 75 anos.

*** Professor da área de ciência política no Departamento de Ciências Sociais da UFF-Campos.

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