domingo, 16 de julho de 2017

Duas ou três coisas que eu sei sobre a conjuntura

Duas ou três coisas que eu sei sobre a conjuntura *

George Gomes Coutinho **

A semana foi especialmente movimentada para todo analista, profissional ou não, do cenário político brasileiro. Por isso irei no máximo tatear a conjuntura apontando duas ou três coisas.

Em termos de maior impacto para a população trabalhadora brasileira tivemos a aprovação no Senado Federal das modificações em nossa legislação trabalhista. Creio que este elemento seja dos mais elucidativos para entendermos o momento brasileiro. Há um projeto bastante claro a despeito das questões político-partidárias formais, pirotecnias e reações histriônicas da grande imprensa. Na verdade tem se reiterado uma opção, já inscrita em outros momentos históricos, onde os agrupamentos dotados de menor poder de barganha na negociação política são penalizados. Foi assim, a título de exemplo, ao não optarmos em enfrentar a questão agrária nas décadas de 1950 e 1960. Houve crescimento econômico no modelo da grande propriedade? Houve. Esse crescimento teve impacto positivo na redistribuição de renda nacional? Não. Tal como Delfim Netto preconizava no regime civil-militar: é preciso “fazer o bolo crescer”, justificativa entoada como mantra até hoje. Só esqueceram de dividir o tal bolo.

No nosso caso trabalhista o espelho é a reforma espanhola de 2012. Cinco anos após as modificações das leis trabalhistas por lá há o desencanto, diminuição da massa salarial e aumento da precarização das relações de trabalho. A Espanha cresceu o seu PIB? Cresceu. Isto gerou bem-estar dos trabalhadores? Não. Houve maior concentração de renda? Sim. Tudo isso em meio ao estabelecimento de relações de trabalho nos moldes chineses.

Agora olhemos dois antagonistas recentes, outrora aliados de ocasião há bem pouco. Lula sofreu a primeira condenação por Sérgio Moro. Cabe recurso. Em meio a diversas dúvidas jurídicas e fragilidade de provas, onde imperou o “direito dedutivo” como avaliou Leonardo Avritzer, prof. de Ciência Política da UFMG, ainda restam mais cinco ações penais[1]. Cinco balas no tambor mirando em 2018. E Michel Temer? A Comissão de Constituição e Justiça votou pelo arquivamento da denúncia apresentada por Rodrigo Janot da PGR, a despeito de qualquer elemento factual.  Aos amigos tudo. Aos inimigos a lei.

* Texto originalmente publicado na edição impressa do jornal Folha da Manhã em 15 de julho de 2017 com o título “Duas ou três coisas sobre a conjuntura”.

*Professor de Ciência Política no Departamento de Ciências Sociais da UFF/Campos dos Goytacazes





[1] Na primeira versão deste texto, publicada na edição impressa do jornal Folha da Manhã, o autor aponta que seriam quatro ações penais. Todavia, segundo a matéria “A saga de Lula contra 32 juízes em busca de salvação”, de autoria de Daniel Haidar e publicada no jornal El Pais em 14/07/2017, seriam na verdade cinco ações. Citando literalmente Haidar no texto supracitado: “Depois da primeira sentença, Lula ainda responde a duas ações penais tocadas pelo juiz Moro, no Paraná, e a três processos sob a responsabilidade dos juízes Ricardo Leite e Vallisney de Oliveira, do Distrito Federal.”. Feita a modificação o autor espera corrigir o erro, não sem esquecer de pedir desculpas aos leitores da edição impressa da Folha.

Nenhum comentário:

Postar um comentário