domingo, 5 de janeiro de 2020

Olhando a partir da planície: eleições 2020


Olhando a partir da planície: eleições 2020[1]

George Gomes Coutinho

O ano de 2020 será marcado no calendário político brasileiro pelas eleições municipais. Em um cenário ainda de alta polarização política nas redes sociais e fora delas, 2020 talvez repita parte da temperatura das eleições de 2018 em disputas locais, o que não quer dizer que necessariamente as suas dinâmicas e os resultados das eleições gerais serão mimetizados localmente.

Um país da extensão e da complexidade do Brasil apresenta configurações e alianças políticas locais que podem, em muitos casos, ser até mesmo contraditórias diante dos direcionamentos e opções adotadas nas eleições majoritárias de 2018.

Com tudo isso, as eleições de 2020 são importantes também por duas questões: 1) pode assumir localmente caráter plebiscitário de aprovação ou rejeição das inovações políticas adotadas no âmbito federal e nos estados onde houve a vitória eleitoral em 2018 de candidatos “novatos” para os respectivos executivos; 2) funciona como continuação do processo de implementação gradual e teste das inovações preconizadas pela Reforma Eleitoral de 2017, vide, por exemplo, a coligação partidária para os legislativos ser vedada já a partir deste ano.

Relacionada ao ponto 1 que mencionei acima, há a particularidade do estado do Rio de Janeiro onde governador e presidente, ambos novatos enquanto mandatários no executivo e unidos no início de 2019,  encontrarem-se neste momento em posição de conflito em virtude das particularidades geradas pelas investigações acerca do assassinato de Marielle Franco. Há uma relação tumultuada e por vezes agressiva entre os mandatários do governo federal e do executivo fluminense, isso a despeito de Bolsonaro e Witzel compartilharem de uma mesma base social, eleitoral e mesmos valores, símbolos, etc..

A aproximação de candidatos fluminenses para executivo ou legislativo de Witzel ou de Bolsonaro pode ser um ponto a dividir o eleitorado mais conservador no espectro político.

Feitas estas observações generalistas, vamos a alguns pontos específicos sobre Campos.

Conforme já disse em outro momento, Campos lida com o ingrediente da possibilidade de uma votação decisiva no Supremo Tribunal Federal neste ano acerca da distribuição dos royalties de petróleo. A hipótese da redução do repasse de royalties, dado o orçamento da prefeitura ser profundamente dependente destes recursos, é um problema político-administrativo de alta complexidade, para além da obviedade do estrago na economia local. Em virtude da profunda relevância do tema, a diminuição do repasse dos royalties, caso assim seja o resultado do entendimento do STF, certamente será tema de debate e “munição” política a ser utilizada na concorrência dos adversários em disputa. Mas, “tudo o mais constante”, ou seja, com o STF mantendo as regras tal como se encontram em vigor hoje, o tema não chegará “quente” ao segundo semestre. De todo modo, na hipótese de um resultado pró-redistribuição no STF, na disputa a diminuição de recursos será utilizada fartamente enquanto recurso político, de forma justa ou não.

Um ponto também a destacar é a possibilidade das eleições campistas demarcarem a consolidação da renovação geracional de candidatos a disputarem o executivo local. Caso se confirme, teremos desta vez quatro candidatos jovens detentores de um capital político familiar pregresso[2], incluindo evidentemente o próprio prefeito Rafael Diniz. De alguma maneira aqui teríamos uma renovação contraditória, tal como vimos em nível federal na Câmara dos Deputados: sem dúvida uma geração mais jovem dotada de um capital familiar herdado.

Neste cenário de “renovação contraditória”, se é viável a utilização deste guarda-chuva pouco preciso que chamam de “nova política”  pela questão etária e cosmética, a manutenção do capital familiar por vezes obriga relações permanecerem aliados ancestrais, quase pré-diluvianos.

Com tudo isso não implica, evidentemente, que a geração “Muda Campos” estará alijada de disputar o executivo. Mas, esta tem sido parcialmente substituída em termos geracionais neste pleito.

Quanto ao atual prefeito, Rafael Diniz terá um teste eleitoral duríssimo em outubro. Desta vez é vidraça e não mais pedra e lidará com uma opinião pública que o elegeu com farta dose de expectativas em um surpreendente primeiro turno nas últimas eleições municipais. Neste momento Diniz terá de lidar com esta mesma opinião pública impaciente, crítica, onde o prefeito precisará defender uma gestão que nem sempre trouxe boas notícias orçamentárias e implementou medidas impopulares em um contexto nacional recessivo que em nada o ajuda.




[1] Uma primeira versão das reflexões deste pequeno texto surgiu a partir das questões apresentadas pelo jornalista Aldir Sales do jornal A Folha da Manhã. A matéria em questão encontra-se disponível aqui: http://www.folha1.com.br/_conteudo/2020/01/politica/1256471-um-2020-que-iniciou-bem-antes.html
[2] Wladimir Garotinho, herdeiro da família Garotinho; Caio Vianna, filho de Arnaldo Vianna, ex-prefeito da cidade; Rodrigo Bacellar, filho do conhecido político e ex-sindicalista Marcos Bacellar e, por fim, Rafael Diniz, herdeiro tanto de Sérgio Diniz, seu pai, quanto de Zezé Barbosa, seu avô.

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