sexta-feira, 14 de maio de 2021

Com a precarização do licenciamento ambiental, Brasil abre caminho para mais desastres e violência

 


Com a precarização do licenciamento ambiental, Brasil abre caminho para mais desastres e violência*

* Publicado originalmente no Blog do Pedlowski.

Marcos Pedlowski

Ao aprovar por esmagadora maioria uma lei que fragiliza enormemente o processo de licenciamento ambiental ao isentar, por exemplo, o licenciamento ambiental dos sistemas e estações de tratamento de água e de esgoto e usinas de triagem de resíduos sólidos, além de pecuária extensiva, semi-intensiva e intensiva de pequeno porte e cultivos agrícolas, a Câmara Federal também declarou guerra aos povos indígenas e quilombolas que agora terão suas terras ainda mais acossadas por uma série de atores que veem nas suas terras preservadas como um obstáculo à predação desenfreada da natureza no Brasil.

Curiosamente, esse projeto anti-ambiental começou a tramitar tendo como autor o deputado federal Luciano Zica (PT/SP) e teve sua costura final realizada pelo deputado Neri Geller (PP-MT), ex-ministro da Agricultura no governo de Dilma Rousseff (PT). Assim, ainda que se fale que a passagem desse projeto de destruição ambiental foi operada com inaudita maestria por Arthur Lyra (PP/AL), as digitais petistas estão presentes nessa verdadeira declaração de guerra ao meio ambiente e às comunidades que o defendem enquanto forma de preservação suas formas peculiares de produção e reprodução social.

Um dos detalhes mais vexaminosos dessa aprovação é que essa fragilização ocorre na esteira de dois grandes desastres ambientais causadas pela mineração de ferro em Minas Gerais (i.e., Mariana e Brumadinho), estado que hoje vive a antessala de novos mega desastres ambientais causados pela forma relaxada com que o processo de licenciamento ambiental tem sido aplicado pelo governo estadual daquele estado, em clara combinação com o governo federal, independente de quem seja o presidente.

A ideia de que o processo de licenciamento ambiental é uma barreira ao processo de desenvolvimento econômico reflete apenas uma forma primitiva de retirar recursos dos sistemas naturais. Já está mais do que demonstrado que o que se precisa mesmo é de sistemas de proteção ambiental que tenham processos técnicos rígidos para impedir que atividades poluidoras causem prejuízos sociais e ambientais maiores do que a renda que eventualmente os empreendimentos aprovados possam gerar. 

Um bom exemplo local, e que eu tive o desprazer de olhar “in loco” como tem sido realizado o licenciamento ambiental do Porto do Açu, que teve e continua tendo um processo de avaliação de impactos altamente fracionado e com praticamente qualquer salvaguarda para sequer monitorar os danos ambientais que estão ocorrendo no V Distrito de São João da Barra. A simples ideia de que vários dos componentes ainda em fase de planejamento sendo dispensados de licenciamento torna o Porto do Açu em uma espécie de bomba relógio que irá explodir bem longe dos especuladores financeiros que controlam o fundo de “private equity” que controla a Prumo Logística, o chamado EIG Global Partners cuja sede se localiza em escritórios para lá de confortáveis em Washington DC. Este conforto que é negado a centenas de famílias de agricultores familiares que não só tiveram suas terras tomadas, como hoje tem que conviver com a salinização de suas águas.

Um fato que os deputados federais e os grupos que impulsionaram este ataque frontal à regulação ambiental é de que a maioria das grandes corporações hoje é obrigada a responder a sistemas internos de governança que impedem o seu envolvimento direto em projetos que degradem o ambiente. Assim, restará para o Brasil depender de empresas que não possuem estes sistemas e que por isso tendem a ter menos freios para os danos ambientais que suas atividades causam. Além disso, a passada de boiada ambiental significará o aumento dos conflitos sociais nas áreas mais sensíveis ecologicamente para onde se quer levar o gado e a soja. Tudo isso somente aumentará o isolamento político e econômico do Brasil. Mas por hoje que se repita o que dizia o personagem Quincas Borba do livro “Memórias Póstumas de Brás Cubas” de Machado de Assis “Ao vencido, ódio ou compaixão; ao vencedor, as batatas”.

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