Reacionários
aqui e alhures *
George
Gomes Coutinho **
O diagnóstico contemporâneo de
que vivemos em uma sociedade que atravessa uma profunda transição já foi
apresentado alhures, em diversas línguas e tradições das humanidades. Porém, em
outra e longínqua conjuntura, talvez ninguém como o comunista sardo Antonio
Gramsci (1891-1937) tenha obtido uma das formulações mais precisas e dramáticas
sobre as épocas de interregno: momentos onde o novo ainda não nasceu e o velho se
recusa a morrer.
As sociedades, no Brasil e no
mundo, nestes primeiros 16 anos de século XXI lidam com um fluxo de circulação
de informações que não encontra paralelo na trajetória humana. Neste âmbito, a
circulação livre de capitais, sonho dourado de rentistas e especuladores em
geral, convive com a circulação de pessoas, algo menos desejado pelos setores
mais conservadores e recalcitrantes. Modos de viver surgem, alguns realmente
novos e outros que já não são mais asfixiados nos calabouços dos espaços
públicos, o que implica novas formas de
amar, sentir e experimentar a produção cultural e as relações afetivas. A
sociedade deste início de século XXI é plural, complexa e necessita da busca
por formas de convivência que consigam dar conta, de forma pacífica e
democrática, desta rica diversidade humana.
Contudo, o que há de novidade em
nossos tempos convive com o que se recusa a morrer.
Os agrupamentos que se “recusam a
morrer” simbolicamente neste momento buscam na nostalgia, ou na invenção de um
passado mítico pouco crível, forças para a reação. Por isso o termo
“reacionário” nos auxilia a compreender as tentativas desesperadas e artificiais
da aniquilação da diversidade nascente e da plêiade de direitos conquistados
por diversos agrupamentos sociais. Sejam os eleitores brancos, cristãos e
redneck de Trump, os simpatizantes da extrema-direita européia e as viúvas da
ditadura civil-militar brasileira. Todos estes agrupamentos reacionários
apresentam em sua pauta a interpretação passadista, vide o “fazer a América
grande de novo”, como mote para flertar com soluções totalitárias e autoritárias
de maneira geral. O grande problema é que a História, aquela senhora invisível
a nos assombrar, sempre lembra que o reacionarismo convive de braços dados com
seu co-irmão: o fascismo.
* Texto publicado no jornal Folha da Manhã em 20 de agosto de 2016
** Professor
de Sociologia no Departamento de Ciências Sociais da UFF/Campos dos Goytacazes
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