domingo, 11 de setembro de 2016

A estranha pauta do Movimento Escola Sem Partido

A estranha pauta do Movimento Escola Sem Partido *

George Gomes Coutinho **

A democracia nas sociedades complexas necessita ser polifônica. É um critério para sua sobrevivência e o caminho oposto flerta com soluções autoritárias. Há um conjunto de vozes diversas em nossa sociedade, com reivindicações de diferentes naturezas e o puro e simples aniquilamento artificial da circulação de discursos e demandas simplesmente não combina com a própria democracia. Como já alertou Alexis de Tocqueville (1805-1859), se as democracias modernas tendem a derivar em verdadeiras “tiranias da maioria”, as minorias devem ser resguardadas inclusive no direito de circulação de suas narrativas.

Não obstante esses pressupostos, causa espécie a notoriedade alcançada pelo Movimento Escola Sem Partido, doravante MESP. Não se trata de simplesmente coibir os seus idealizadores de proporem qualquer coisa, vide as linhas no parágrafo anterior. As idéias e proposições surgem, sejam estas grandiosas ou medíocres a despeito do espectro político. Mas, o que choca é quanto o gesto de levantar uma lebre esquálida dessas, cujo idealizador do movimento se trata de um pai que ficou indignado com uma analogia feita por uma professora entre Ernesto Guevara e Francisco de Assis, tenha conquistado editoriais, circulado em redes sociais e estabelecido movimentos na direção oposta.

Ao acompanhar a divulgação dos dados da educação brasileira alcançados em 2015 no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica, o famoso Ideb, a situação é muito mais preocupante do que qualquer entusiasta ou opositor do MESP tem contemplado. Em mais uma ocasião nenhuma das metas do Ideb foram alcançadas. Dentre os projetos de lei que tive acesso e afinados com as diretrizes do MESP, no caso o PL 7180/2014 do deputado Erivelton Santana (PEN/BA), não consta uma vírgula sobre questões de infra-estrutura escolar, estímulo para a qualificação continuada dos professores, planos de carreira e salários, etc.. Nem a merenda escolar, questão básica no ensino público, é mencionada. Nada. Apenas fala em “convicções” da família. O debate soa como engodo e desperdício de energia que encobre questões mais graves. E talvez seja mais um sintoma da pequenez de nossa opinião pública contemporânea.


* Texto publicado no Jornal Folha da Manhã em 10 de setembro de 2016. Na versão impressa o título original foi "A estranha pauta do MESP".

**Professor de Sociologia no Departamento de Ciências Sociais da UFF/Campos dos Goytacazes

2 comentários:

  1. Caro George,

    Nem tudo está perdido.

    Depois de saber que você resolveu emprestar sua legitimidade ao pig local (para minha tristeza e profundo pesar), vejo que lhe sobrou ainda algum traço de rebeldia necessária nesses tempos estranhos.

    E por favor, não me venha com a justificativa de que é preciso ocupar espaços e "fazer a luta por dentro"...

    Não se fala de democracia com golpistas, bem como não se discute o menu do jantar com canibais, porque o prato principal pode ser você.

    Respeito sua vaidade pessoal de poder falar em uma plataforma que (supostamente) dê mais alcance ao que você pensa, mas em se tratando do pig, não há sentido renovador algum nessa proposta.

    Em outras palavras:

    Gente como você escrevendo naquela pocilga é como jogar um litro de Channel nº 5 em um monte de merda.

    Por mais que o cheiro pareça algo melhor, ainda assim, será um monte de merda.

    Mas boa sorte.

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  2. Caríssimo Douglas,

    Nos conhecemos há bastante tempo.... Você sabe que eu jamais abandonaria minhas convicções em qualquer circunstância. Não preciso disso. Se mesmo em determinada época eu até poderia "conceder" e não o fiz.. Imagina agora.

    Sobre todo o restante, dialogamos em momento oportuno. Algumas de minhas decisões envolvem questões de foro íntimo e só interessa a mim e aos meus que me são próximos...Sobre estas conversaremos de forma privada e franca como bons companheiros devem fazer.

    Abraços e obrigado pelo desejo de boa sorte. A fortuna... Mas, sempre conto mais é com a virtú

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