domingo, 9 de abril de 2017

Temer e a legitimidade

Temer e a legitimidade *

George Gomes Coutinho **

Os debates sobre legitimidade na teoria sociológica ou política dificilmente sequer se iniciam sem a formulação de Max Weber (1864-1920). Weber, sociólogo nascido em  Erfurt, defendia que a legitimidade era, antes de qualquer coisa, uma questão de consentimento entre os governados. Em outros termos nada românticos tratava-se de dominação consentida: os governados consentiam com as ações de seus governantes. Desta relação a legitimidade socialmente se produz onde há o assentimento pacífico que torna possível mandatos de forma geral terem início, meio e fim dentro dos trâmites previstos. Ou seja, as próprias regras do jogo precisam igualmente ser consideradas legítimas. De outro modo golpes de Estado, revoluções e congêneres são um desfecho historicamente constatável.

Portanto, ao discutirmos a legitimidade estamos em um patamar que nos direciona para além da mera legalidade proposta pelo direito positivo. Ainda, não se trata de uma questão de dialogarmos a partir do parâmetro da “popularidade”, onde poderíamos nos perguntar se o presidente Michel Temer neste momento é simplesmente popular, aceitável, bem quisto ou não.

Ora, vamos para a agenda do governo Temer aonde irei propositalmente colocar o termo “reforma” entre aspas: “reforma” do ensino médio; “reforma” da previdência; “reforma” orçamentária. Para além dos gurus da ortodoxia econômica que abraçam de forma entusiasmada o andar da carruagem, este volume e profundidade de ações do Estado seriam verdadeiramente legítimas? Contariam de fato com o assentimento dos governados? Foram discutidas de forma ampla com os setores da sociedade? Em um regime de democracia representativa liberal, onde os programas de governo são também avaliados mediante o critério do voto, esta agenda foi colocada por qualquer um dos candidatos em disputa nas últimas eleições? Todas estas são questões da ordem do dia na conjuntura pós-impeachment.

Por fim, não canso de lembrar que a última vez em que o voto direto para vice-presidente da República foi no longínquo ano de 1960. Algo que só reforça de maneira inegável os “pés de barro” desta aventura liberalizante em que nos lançamos.


* Texto publicado no jornal Folha da Manhã em 08 de abril de 2017

* Professor de Ciência Política no Departamento de Ciências Sociais da UFF/Campos dos Goytacazes

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