Temer e a legitimidade *
George
Gomes Coutinho **
Os debates sobre legitimidade na
teoria sociológica ou política dificilmente sequer se iniciam sem a formulação
de Max Weber (1864-1920). Weber, sociólogo nascido em Erfurt, defendia que a legitimidade era, antes
de qualquer coisa, uma questão de consentimento entre os governados. Em outros
termos nada românticos tratava-se de dominação consentida: os governados
consentiam com as ações de seus governantes. Desta relação a legitimidade
socialmente se produz onde há o assentimento pacífico que torna possível
mandatos de forma geral terem início, meio e fim dentro dos trâmites previstos.
Ou seja, as próprias regras do jogo precisam igualmente ser consideradas
legítimas. De outro modo golpes de Estado, revoluções e congêneres são um
desfecho historicamente constatável.
Portanto, ao discutirmos a
legitimidade estamos em um patamar que nos direciona para além da mera
legalidade proposta pelo direito positivo. Ainda, não se trata de uma questão
de dialogarmos a partir do parâmetro da “popularidade”, onde poderíamos nos
perguntar se o presidente Michel Temer neste momento é simplesmente popular,
aceitável, bem quisto ou não.
Ora, vamos para a agenda do
governo Temer aonde irei propositalmente colocar o termo “reforma” entre aspas:
“reforma” do ensino médio; “reforma” da previdência; “reforma” orçamentária.
Para além dos gurus da ortodoxia econômica que abraçam de forma entusiasmada o
andar da carruagem, este volume e profundidade de ações do Estado seriam
verdadeiramente legítimas? Contariam de fato com o assentimento dos governados?
Foram discutidas de forma ampla com os setores da sociedade? Em um regime de
democracia representativa liberal, onde os programas de governo são também
avaliados mediante o critério do voto, esta agenda foi colocada por qualquer um
dos candidatos em disputa nas últimas eleições? Todas estas são questões da
ordem do dia na conjuntura pós-impeachment.
Por fim, não canso de lembrar que
a última vez em que o voto direto para vice-presidente da República foi no
longínquo ano de 1960. Algo que só reforça de maneira inegável os “pés de
barro” desta aventura liberalizante em que nos lançamos.
* Texto publicado no jornal Folha da Manhã em 08 de abril de 2017
* Professor de Ciência Política no
Departamento de Ciências Sociais da UFF/Campos dos Goytacazes
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