domingo, 14 de maio de 2017

Moro, Lula e Freud

Moro, Lula e Freud *

George Gomes Coutinho **

Na última quarta-feira ocorreu, enfim, o encontro físico entre o juiz Sérgio Moro e Luis Inácio Lula da Silva.

Podemos observar algumas recorrências no espaço público. A primeira delas e mais óbvia é o fenômeno da “futebolização da política”. Já discutimos em diversos momentos o empobrecimento propositivo causado pela polarização desmesurada e os danos causados para a própria democracia neste cenário. Na última quarta as “torcidas” se organizaram efetivamente com bandeiras, expectativas e um certo ar de “final de campeonato”.

De novidade em Curitiba, pelo menos durante o “evento”, tivemos a notória desidratação dos movimentos assumidamente mais voltados para propostas estritamente moralizantes da sociedade. Atribuo este efeito a três causas: 1) a própria solicitação de Moro para que os grupos alinhados com a postura de parte do Ministério Público Federal não comparecessem. Foram espantosamente obedientes!; 2) Como em outros momentos da História, a pauta moralizante, justamente por sua fragilidade em apontar para um projeto de sociedade, é insuficiente para manter mobilizados os grupos; 3) Os movimentos “moralizantes” demonstraram em diversas ocasiões seus pés de barro ao terem dentre seus membros e simpatizantes inúmeros casos de corrupção e congêneres, algo que abala a coerência da pauta.

Outro fato recorrente e menos óbvio é a infantilização da esfera pública brasileira que busca, de forma incessante, uma figura paterna para se apoiar. A sacralização de Moro ou Lula produz distorções severas e o olhar amoroso e afetivamente carente de seus seguidores impede que se compreendam as contradições intrínsecas de ambos.  Ou seja, a criticidade, elemento fundamental para os dias que correm, é jogada na lata de lixo. Só que sem crítica não há o “bom combate” e tampouco a História avança.

Penso em um conselho psicanalítico para esta conjuntura. Para a tradição de pensamento criada por Sigmund Freud (1856-1939), o indivíduo que não toma para si seus desejos e projetos de vida e segue cegamente “papai” não amadurece. Isso vale também para a política.

* Texto publicado no jornal Folha da Manhã em 13 de maio de 2017


** Professor de Ciência Política no Departamento de Ciências Sociais da UFF/Campos dos Goytacazes

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