domingo, 18 de junho de 2017

Gilmar, o judiciário e o salvacionismo

Gilmar, o judiciário e o salvacionismo*

George Gomes Coutinho **

O julgamento da chapa Dilma/Temer no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) foi prenhe de aprendizados importantes. Desde o seu entorno até a decisão final há questões que podem ser elencadas de maneira construtiva. Todavia, não creio que o atual momento do espaço público tenha produzido grande reflexão para além do maniqueísmo: Gilmar Mendes foi eleito o grande vilão e ponto final.

Retomando, vamos para as motivações do pedido de cassação da chapa. O PSDB seguiu um cálculo arriscado. Cabe lembrarmos que no dia seguinte após a divulgação dos resultados das eleições de 2014 Aécio Neves, atual senador afastado, declarou “não aceitar” os resultados. Já em 2017, após a divulgação dos constrangedores áudios de Joesley Batista do grupo JBS, Aécio, em profunda demonstração de sinceridade e anti-republicanismo, afirmou que uma das motivações do pedido de cassação de Dilma era “encher o saco”. Claro que não obstante “encheções de saco”, ao cassar a chapa vencedora a presidência poderia cair no colo do segundo lugar. Neste caso em especial seria a chapa tucana puro-sangue Aécio Neves/Aloysio Nunes.

O pedido de cassação movido pelo PSDB foi interpretado em 2015 como sendo frágil por Maria Thereza de Assis Moura, ex-ministra do TSE. Gilmar Mendes conseguiu reverter o posicionamento de Maria Moura e trouxe o processo de volta para o Tribunal. “Modéstia às favas” apropriadamente disse o próprio Mendes na semana passada. Se não fosse o esforço do ministro realmente o pedido de cassação não teria ido adiante. O problema é que a conjuntura política de 2015 era diversa.

Já neste ano de 2017 o posicionamento de Mendes foi exótico. Seu voto de minerva derivou na absolvição da chapa julgada sendo o trâmite do processo sua própria “obra e graça”.

Mendes se apresenta como a personificação de um judiciário profundamente politizado. Não é o único, não foi e jamais será. A sensação de “arbítrio” incômoda, avaliação exclusivamente moral, oculta a avaliação objetiva que joga por terra o judiciário como entidade imaculada e depósito de virtudes a nos purgar. Espero que não tenhamos salvacionismos daqui por diante.

* Texto publicado no jornal Folha da Manhã em 17 de junho de 2017.


** Professor de Ciência Política no Departamento de Ciências Sociais da UFF/Campos dos Goytacazes

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