sábado, 24 de fevereiro de 2018

Intervenção para quem precisa

Intervenção para quem precisa*

George Gomes Coutinho **

Os dias imediatamente após as comemorações carnavalescas trouxeram para a população brasileira em geral, e a fluminense em particular, o inusitado. No dia 16/02 o anúncio intempestivo de uma Intervenção Federal pegou muita gente de calças curtas. Desconfio que até mesmo os policy makers fluminenses se viram em igual condição.

Afinal, que cazzo quer o Governo Federal na atual conjuntura? A medida foi recebida com críticas e ceticismo por uma enorme gama de pesquisadores. Cabe ressaltar o ineditismo da situação: nunca antes na História do Brasil redemocratizado assistimos algo assim. Não se trata, portanto,  de medida insignificante. É dotada de inegável excepcionalidade e implica o reconhecimento de que algo vai muito mal com as nossas instituições, a despeito da cantilena que apregoa o oposto desde 2016. Isso não desconsiderando a medida ser respaldada pela Constituição Federal de 1988. Para além disso, por qual razão seria o Rio o objeto da Intervenção? Justamente o estado da federação que não se encontra na pior situação em termos de violência urbana, não obstante a reconhecida tragicidade de sua condição estrutural.

Ainda, cabe perguntarmos se era esse o encaminhamento mais adequado, afinal a intervenção retira a autonomia decisória do estado no que tange a segurança pública. Isso é grave. Está se afirmando que o estado tornou-se incapaz de gerir este setor. Mas, seria só esse? É falta de expertise mesmo? A segurança pública é o maior e mais grave problema do Rio de Janeiro nesse momento? Oras, e as outras áreas fundamentais de atendimento da população? O problema é de gestão ou seriam opções suicidas de contigenciamento orçamentário que provocaram o atual cenário? No rastro das perguntas inconvenientes: como estabelecem um prazo, um limite temporal para a intervenção, sem terem delimitado objetivos claros?

Muitas dúvidas diante de tema tão espinhoso. E uma única certeza para o momento. A mudança de pauta na opinião pública. A segurança pública do Rio tornou-se, mais uma vez, o “assunto do momento” em ano eleitoral. Conseguiram o intento após a Reforma Previdenciária ter subido no telhado. A jogada é maquiavélica se foi para mera mudança de direcionamento dos holofotes.

* Texto publicado em 24 de fevereiro de 2018 no jornal Folha da Manhã de Campos dos Goytacazes, RJ.


** Professor de Ciência Política no Departamento de Ciências Sociais da UFF/Campos dos Goytacazes

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