Os pés de barro do judiciário*
George
Gomes Coutinho **
É muito pouco provável que na
atual conjuntura qualquer um(a) no Brasil não tenha recebido informações acerca
da atual polêmica dos auxílios-moradia para membros “especiais” do judiciário.
A mídia oligopolista, ou simplesmente a “grande mídia” (um punhado de empresas
com predominância discursiva e simbólica sobre todo território nacional), optou
por reverberar essa questão com estardalhaço em editoriais, análises
comparativas e colocando seus mais ruidosos agentes para falar, tal como papagaios,
sobre a questão. Escândalo fabricado.
Evidente que o judiciário só
poderia ser um “judiciário da sociedade” na medida em que seus membros são
recrutados aqui e não em Saturno ou no Éden. Em outros termos, seria pouco
provável que todos os vícios e virtudes desta sociedade não seriam encontráveis
no judiciário. Assim como também no mercado, no Estado de maneira geral, na
política, Forças Armadas, na sociedade civil, nas religiões institucionais,
etc..
Voltando ao judiciário, as informações
acerca de determinados auxílios injustificáveis, aos quais, diga-se de
passagem, determinados membros deste poder abdicam voluntariamente, também não são
novidade nesta que é uma das sociedades mais desiguais do planeta Terra. Oras,
os pés de barro são conhecidos por qualquer cidadão(ã) minimamente atento(a) há
bastante tempo. Contudo, cabe perguntarmos: por qual razão só agora a grande
mídia decidiu mostrar a nudez de seus ídolos perecíveis? Ainda mais no caso da
generalização do auxílio-moradia, uma medida que entrou em vigor em 2015.
Informo para quem me lê que estamos, não se espantem, em fevereiro de 2018. Demorou
um pouco para saírem do silêncio ruidoso não é?
A conjuntura lida com um fato
marcante após os 3 X 0 de Porto Alegre: a condenação de Lula que pode levá-lo
para a cadeia. Se a grande mídia não é monolítica, e nunca foi em virtude de
suas fraturas e disputas internas, não é exagero afirmar que Lula e sua
candidatura anti-sistêmica (ma non troppo) fora do baralho atendam a objetivos
hegemônicos dos que sustentam o discurso midiático. Talvez a crítica tardia da
mídia ao judiciário não obedeça a fins tão republicanos como gostariam algumas
de suas impolutas sereias.
* Texto publicado em 10 de fevereiro de 2018 no jornal Folha de Manhã de Campos dos Goytacazes, RJ.
** Professor de Ciência Política no
Departamento de Ciências Sociais da UFF/Campos dos Goytacazes
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