Por que defender as Humanidades?
Por Milton Lahuerta*
Historicamente, as chamadas Humanidades
preocupam-se com o conhecimento crítico sobre a arte, a filosofia, o indivíduo,
a cultura, a economia, o poder, etc. Numa palavra, elas têm por foco o homem em
toda a sua complexidade. Neste sentido, em qualquer uma de suas áreas de
atuação – o ensino, a pesquisa, a editoração, o jornalismo, o planejamento, a
comunicação, o rádio, a televisão, o cinema, a música e o teatro –, as
Humanidades lidam com conhecimentos e valores que norteiam a formação das
sociedades, interrogando-se, permanentemente, sobre o ser humano singular e o
mundo social em constante transformação.
Esses conhecimentos e valores são decisivos para a
formação das novas gerações, para sua inserção na vida social e para o modo
como elas vão lidar com a dimensão pública e com dinâmica democrática.
É claro que a perspectiva de formar as novas
gerações para a vida civil não é fácil de ser cumprida numa época permeada pela
prioridade da eficácia, na qual o tempo se acelera drasticamente, os papéis
sociais tradicionais não conseguem se reproduzir, as certezas são colocadas em
xeque e a vida passa a ser pautada pela lógica da descartabilidade. Decorrentes
de uma transição para um novo padrão produtivo e tecnológico de escala
planetária, essas transformações implicam novos requerimentos educacionais e
têm forte impacto não apenas no trabalho, mas em todas as dimensões da vida.
Essa é uma questão decisiva, já que as duas
principais finalidades da educação – a transmissão dos conhecimentos e da
cultura necessários à integração social, e a formação de seres humanos
autônomos – vêm perdendo sentido nas sociedades contemporâneas. Com isso, generaliza-se
a perspectiva de que o sucesso profissional depende, exclusivamente, da
aquisição de “conhecimentos úteis”, que, por sua aplicação, trazem benefícios
materiais imediatos a seus portadores.
Com a naturalização desse modo de pensar, perde-se
de vista um pressuposto fundamental: que a escola, e principalmente a
Universidade, não devem apenas instruir e adestrar para o mercado, mas
educar para a vida, formando seres humanos capazes de pensar com espírito
crítico e autonomia moral.
É justamente aí que se encontra a importância das
Humanidades como uma espécie de memória do que é (e foi) o homem, do que disse
e pensou sobre si mesmo, resgatando e conhecendo os erros e malogros de nossas
sociedades, constituindo-se numa base imprescindível para ensinar a viver no
futuro.
Cada vez mais, a própria complexidade das
sociedades atuais está a exigir profissionais capazes de pensar com autonomia,
de apresentar explicações abrangentes sobre os processos em curso e de oferecer
alternativas aos problemas individuais e sociais. Os egressos dos cursos de
Humanidades – por estarem habituados à incerteza e ao questionamento permanente
de seus próprios pressupostos – acabam por ter uma vantagem comparativa perante
profissionais de áreas técnicas e especializadas: mais do que apenas preparar
para o mercado, as humanidades formam para a vida. O que, numa era de grandes
transformações, não é pouco!
* Sociólogo; Doutor em Ciência
Política; Coordenador do Laboratório de Política e Governo da UNESP/Araraquara.
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