Um liberalismo miserável *
George
Gomes Coutinho **
“No Brasil, o marxismo adquiriu uma forma difusa, volatizada,
atmosférica. É-se marxista sem estudar, sem pensar, sem ler, sem escrever,
apenas respirando.”. A irritação do
conservador Nelson Rodrigues citada é uma crítica contundente ao marxismo
vulgar. Porém, igualmente poderíamos utilizar esse mesmo tom para demolir um
liberalismo miserável.
Grandes
tradições de pensamento são verdadeiros continentes. Seja o judaísmo, ou sua
vertente expressa no cristianismo, o evolucionismo, o confucionismo, o
platonismo, enfim, todo grande esforço de reflexão contém um conjunto de
elementos articulados complexos. Afirmam o que seria a natureza humana, se esta
é boa ou má e, para além disso, tentam responder: que bicho é esse, o homem?
Ainda, indicam caminhos morais e éticos. Projetam uma idéia de sociedade, etc..
O
liberalismo é, neste sentido, também um continente. Desde o século XVII o
debate interno nesta tradição nunca cessou. Há idas e vindas, como em todo
movimento de pensamento, o que inclui controvérsias e críticas internas. Mas,
se trata de uma vastíssima e rica tradição que permite, inclusive, o diálogo
com diversas bandeiras progressistas bastante arejadas. Talvez até mais do que
as que encontramos em diversos grupos tradicionais na esquerda do espectro
político.
O que
espanta é a versão raquítica e adestrada deste liberalismo que circula no
mainstream tupiniquim. Um liberalismo pobre, simplesmente “anti-Estado” armado
de um discurso afetivo e ressentido quase edipiano. Como se não bastasse, não
desconsiderando as contribuições liberais para a democracia alhures, nosso
liberalismo flerta com o autoritarismo. É um oximoro. Tal como os marxistas
vulgares, boa parte dos liberais de verde-amarelo se contentam em repetir
palavras de ordem preguiçosamente. Finalizando, padecem de covardia intelectual
ao não levarem as últimas conseqüências suas próprias premissas. Mal sabem que
defendem mais o atraso do que imaginam.
** Professor
de Ciência Política no Departamento de Ciências Sociais da UFF/Campos dos
Goytacazes
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