“Reforma”, legitimidade e
democracia*
George
Gomes Coutinho **
As reações diante da “Reforma”
Trabalhista, sendo que esta ganhou efetividade uma semana atrás, não me causam
estranheza. Ainda ocorrem debates quentes, com críticas severas por um lado e tentativas
de reafirmar positivamente os supostos benefícios das mudanças na CLT por
outro. No âmbito prático há agentes do judiciário que se recusam a tornar a
“Reforma” norma. Há os entusiastas que abraçam as modificações na legislação
acreditando que produzirão avanços significativos nas relações de trabalho
brasileiras. Contudo, hoje não irei discutir o conteúdo das mudanças. Minha
ótica será a do campo político.
O cenário descrito no parágrafo
anterior é mais um dos alertas amarelos, quase vermelhos, desde as eleições de
2014. Observadores dentro e fora do país notam que as instituições brasileiras,
tomando a conjuntura a partir de nossa última eleição presidencial, não gozam
de plena saúde. O burburinho ruidoso e as resistências no espaço público tendo
em mira a “Reforma” são mais e maus novos sinais. A legitimidade da “Reforma”,
algo que vai além da legalidade e a incorpora, está em jogo desde sua
proposição.
Que se trata de uma mudança
estrutural nas relações de trabalho da população ninguém discute. Contudo, a
opção de modificações “pelo alto”, em algo tão profundo e dotado de tamanho
impacto no cotidiano, tem produzido as reverberações que estamos assistindo.
Oras, legitimidade envolve a “dominação consentida”.
Para que medidas dotadas de impacto coletivo tomem corpo no cotidiano é preciso
que ocorra a aceitação, de forma ou de outra, entre os agentes. Nas
democracias, onde formalmente se impõe a via pacífica e dialógica no exercício
do poder, a legitimidade se torna um ponto ainda mais caprichoso e acresce
complexidade ao sistema. Por essa razão dificilmente as tentações autoritárias
irão desaparecer totalmente do imaginário político. Afinal, “enfiar goela
abaixo” uma medida economiza tempo e saliva.
Voltando ao debate da “Reforma”
Trabalhista, encontramos um processo de implantação sem amplo consenso formado.
Vejo este caso específico como um ensaio do que pode vir por aí no caso
previdenciário: mais uma proposta “pelo alto” que produzirá ruído. Muito ruído.
* Texto publicado em 18 de novembro de 2017 no jornal Folha da Manhã de Campos dos Goytacazes, RJ.
** Professor de Ciência Política no
Departamento de Ciências Sociais da UFF/Campos dos Goytacazes
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