As interpretações mais ou menos sistemáticas produzidas na academia sobre o fenômeno político brasileiro, seja na prática de uma "sociologia política" ou entre os ensaístas oriundos de diversas áreas de conhecimento, ou mesmo as produzidas após a institucionalização do primeiro programa de pós-graduação propriamente em Ciência Política, em 1966 na UFMG, quase sempre seguiram uma certa "vocação pública".
Por "vocação pública" compreendo a disposição do conjunto de pesquisadores que se defrontam com o fenômeno "poder", algo que não é monopolizado de forma incontestável por um único campo de conhecimento, na busca por ofertar análises, interpretações, dados e afins, de modo a dialogar com a sociedade. Evitarei propositalmente o termo "esfera pública" por compreender que o conceito pode levantar polêmicas teóricas ou empíricas francamente desnecessárias.
Inclusive, evidentemente este não é um caminho de mão única. Se nossos analistas ofertam análises para a sociedade, esta, invariavelmente pauta boa parte da pesquisa realizada entre nós. Afinal, a academia não é dotada integralmente de agentes praticantes de solipsismo....
Retomando, justamente por estas análises deterem um "outro patamar" analítico, algo um tanto diferente das esbaforidas e muitas vezes viciadas "opiniões" encontradas fartamente na imprensa, penso que parte da "missão" da academia é assim cumprida. Ao romper com o por vezes necessário insulamento discursivo, algo que gera decerto pesquisas de fôlego e promove a formação/treinamento de novos profissionais para o próprio campo, especialmente aqui os cientistas políticos brasileiros apresentam contribuições criativas, por vezes provocativas.. Mas.. nunca inúteis. Justamente por todas que selecionei saírem da vala comum desnorteada encontrada alhures.
Irei apontar três profissionais da ciência política brasileira que neste momento se dedicam a este papel um tanto incômodo, o de comentarem a conjuntura em um momento delicado como esse no Brasil. Decidiram "surfar" a onda perigosa, indomável e imprevisível do movimento histórico.. Por isso mesmo são importantes.
O primeiro deles é Wanderley Guilherme dos Santos. Como já chamei a atenção aqui, WGS prossegue com suas análises, muitas vezes contra-intuivas, em seu blog: http://insightnet.com.br/segundaopiniao/. Justamente por serem contra-intuitivas, as polêmicas nem sempre justas pululam nos comentários....
Outro que destaco é Fabiano Santos (IESP/UERJ) que concedeu uma longa e densa entrevista para Miguel do Rosário em seu "Cafezinho". A entrevista nos apresenta um conjunto de cenários, análise de comportamento de grupos, temas espinhosos como o impeachment e preocupações com a democracia representativa brasileira. A entrevista, intitulada "Opção pelo golpe vai ser cobrada na história" pode ser acessada aqui: http://www.ocafezinho.com/2015/09/15/fabiano-santos-opcao-pelo-golpe-vai-ser-cobrada-na-historia/
Finalizando as sugestões de leitura, Adriano Codato da UFPR tem se dedicado a compreender o fenômeno do crescimento da direita brasileira, seja em termos discursivos ou propriamente demográfico/eleitorais. Neste diapasão Codato, que já mantém uma larga experiência na análise das elites políticas brasileiras, concedeu entrevistas para o Mediapart (aqui), Valor Econômico (aqui), Agência Pública (aqui).... Ainda, sobre o autor, recomendo a visita em seu blog: o "Sociologia Política" que mantém um bom e eclético acervo sobre a área e análises de conjuntura.
Em suma, mesmo que dentre as narrativas em disputa na ciência política brasileira exista uma tentativa de se construir uma aura de uma ciência "ensimesmada", talvez aqui encontremos uma prova de cientistas políticos menos umbigocêntricos do que se poderia supor.