domingo, 1 de outubro de 2017

Populismo judicial

Populismo judicial *

George Gomes Coutinho **

Desde 2016 ouvimos do Governo Temer e dos setores mais integrados da grande mídia que as instituições estão “funcionando”. Além disso estariam “fortes”. É quase um mantra. De fato, no que tange funcionários trabalhando e rotinas burocráticas, as instituições estão operando no cotidiano. O que devemos nos perguntar é se estão funcionando bem. E para quem?

Dizer pura e simplesmente que as instituições estão “funcionando”, nos moldes do que descrevi no parágrafo anterior, tem algo de cinismo ou auto-engano. Olhemos para o nosso judiciário. Ao vermos a conexão estabelecida entre ministros, juízes, procuradores e a grande mídia, algo que se avoluma pelo menos desde a Ação Penal 470, o famoso “Mensalão” de 2005, centenas ou talvez milhares de arbitrariedades foram praticadas para todos os gostos. Este modus operandi, que prossegue até o presente, envolve vazamentos seletivos de informações para a grande mídia, atropelamentos do processo legal, contorcionismos constitucionais, negação de princípios e garantias fundamentais e o uso espetacularizado do aparato de segurança pública. Por vezes até mesmo em nossa Suprema Corte, o STF, os posicionamentos individuais e coletivos “jogam com a galera”. Ou seja, a opinião pública, nem sempre qualificada, em determinadas ocasiões guia aqueles que deveriam se pautar pelo rigor em suas decisões. Ao mesmo tempo há a perniciosa legitimação fornecida pelas multidões a cada um dos arbítrios.

A tudo isso o ministro Gilmar Mendes chamou há alguns anos atrás de “populismo judicial” e recentemente atualizou na variante “populismo constitucional”. Justo ele que se utiliza de uma atuação fortemente midiática sempre que julga conveniente.

Compreendo o quadro de hipertrofia conjuntural do judiciário em duas vertentes. A primeira delas envolve o ineditismo da atuação arbitrária e ilegal subindo os degraus da hierarquia social. Afinal, as classes populares há muito conhecem a “mão pesada do Estado” e o arbítrio, algo que só agora parte das elites vivenciam. O outro ponto é o estado terminal em que se encontra a nossa democracia representativa. No esvaziamento de legitimidade da classe política o judiciário entra no jogo fazendo o que jamais deveria fazer: política.

* Texto publicado em 30 de setembro de 2017 no jornal Folha da Manhã de Campos dos Goytacazes, RJ. 


** Professor de Ciência Política no Departamento de Ciências Sociais da UFF/Campos dos Goytacazes

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