Contra o argumento ad hominem*
George Gomes Coutinho **
Dentre os sintomas identificáveis
no Brasil contemporâneo politicamente polarizado se apresenta de forma constrangedora
um inegável empobrecimento discursivo expresso em nossa opinião pública. Deste grave problema podemos identificar déficits
cuja parte da responsabilidade cabe aos grupos formuladores, aqueles que
usualmente apresentam as grandes sínteses e propostas coletivas. Políticos
tradicionais, intelectuais profissionais ou não e ativistas dos movimentos
coletivos talvez se vejam fragilizados na sua posição de formuladores. Há
razões múltiplas. Seja pela incapacidade de criação de idéias e projetos
realmente inovadores e convincentes ou os outros tantos que sofreram e sofrem arranhões
em sua credibilidade e, por fim, há também os que encontram entraves derivados
da dificuldade de transpor as barreiras de comunicação que possam atingir
corações e mentes neste momento de crise política.
As conseqüências deste vazio são
diversas e o aparecimento de proposições requentadas, simplórias e pouco
críveis é somente uma delas. Mas, irei me ater a que considero como uma das
conseqüências mais insidiosas e destrutivas: a larga utilização do argumento ad
hominem como arma política.
Ad hominem, termo oriundo do
latim utilizado para caracterizar argumentos falaciosos e/ou ilógicos,
significa “ao homem” ou “à pessoa”. Em outros termos, diante do interlocutor
não são discutidas as propostas e projetos de sociedade em pauta. De forma pouco
nobre, o objetivo é destruir a pessoa. Abandona-se o debate saudável e plural
de idéias que leva água ao moinho de qualquer sociedade democrática em prol da eliminação
moral. Não por acaso, a despeito do posicionamento político, a prática do que
os adeptos chamam de “escracho” em lugares públicos, sendo praças, aeroportos
ou restaurantes os locais de preferência para o uso deste expediente, guarda
afinidades com o linchamento. Como forma de justiçamento, seria linchamento
simbólico portanto. A indignação, justa
em determinadas ocasiões, se mostra com a máscara anônima do ódio em meio ao
grupo. Por tudo isso, o argumento ad hominem é somente a expressão violenta e
anti-democrática da incapacidade de construir consensos.
* Texto publicado no Jornal Folha da Manha de Campos dos Goytacazes em 06 de agosto de 2016
** Professor
de Sociologia no Departamento de Ciências Sociais da UFF/Campos dos Goytacazes
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