domingo, 23 de abril de 2017

Reparação histórica no Açu - 2ª edição

Reparação histórica no Açu - 2ª edição *

George Gomes Coutinho **

A História humana detém em seu rol de atrocidades  injustiças que ocorreram e continuam a ocorrer nos diversos pontos do globo. No entanto, o reconhecimento pleno de massacres, perseguições e outras tantas práticas opressivas que apequenam a espécie humana só recentemente tem se tornado objeto de atenção.

Políticas e ações de reconhecimento, neste tipo de caso em particular, implicam que agrupamentos factualmente opressores e a sociedade como um todo reconhecem que em determinado momento histórico moveram e/ou desviaram outros grupos sociais contra a sua vontade de sua própria trajetória. Estou dizendo que o direito de autodeterminação foi negado a etnias, tribos, grupos ou seguidores de uma determinada crença. Este processo de dominação não separa violência simbólica da física e se estende por gerações até que o ciclo das ações persecutórias, onde a humilhação faz parte do cardápio, é quebrado.

Por vezes agrupamentos sociais aguardam séculos por este tipo de reparação. Em outros casos há janelas históricas que podem abreviar o tempo de espera. Afinal “o tempo é muito longo para aqueles que esperam” como diria o escritor norte-americano Henry Van Dyke Jr (1853-1933).

Na última quarta-feira, dia 19 de abril, a ASPRIM (Associação dos Proprietários Rurais e de Imóveis do Município de São João da Barra) e o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) reocuparam parte das terras tomadas pelo empreendimento nacionalmente conhecido como “Porto do Açu”. O fato abriu uma janela de reparação histórica.

 O processo de retirada das famílias originais do 5º distrito de São João da Barra não transcorreu sem traumas, algo que incluiu até mesmo indenizações questionáveis, intimidações e outras práticas no mínimo controversas. Para além disso dois agentes indiscutivelmente importantes para este processo, o “Barão de São João da Barra” Eike Batista e Sergio Cabral Filho, ex-governador do Rio de Janeiro, encontram-se no Complexo Penitenciário de Gericinó, antigo Complexo de Bangu.

Reparações históricas não mudam o passado. Mas, podem modificar o daqui por diante.


* Texto original publicado no jornal Folha da Manhã em 22 de abril de 2017. Nesta "2ª edição" digital fiz uma leve modificação na forma do texto. Contudo, o conteúdo propriamente é o mesmo da versão impressa.

** Professor de Ciência Política no Departamento de Ciências Sociais da UFF/Campos dos Goytacazes

Nenhum comentário:

Postar um comentário