Bipolaridade
redistributiva*
George
Gomes Coutinho **
No último número da revista Novos
Estudos CEBRAP, publicada pelo Centro Brasileiro de Análise e Planejamento em
junho deste ano, um artigo me instigou. “O Brasil tornou-se mais conservador?”
foi o provocativo título e não é pouca coisa na desnorteante conjuntura
brasileira.
O artigo foi escrito por Marta
Arretche, professora de ciência política na USP cuja carreira é direcionada
desde o início da década de 1990 por análises de políticas públicas, e por
Victor Araújo, doutorando e orientando de Arretche no Programa de Pós-Graduação
em Ciência da USP. Não irei entrar nos meandros metodológicos que os autores
adotaram. Por enquanto basta que o(a) leitor(a) saiba que a dupla se utilizou
de dados coletados em diferentes momentos entre 2008 e 2014 para tentar
responder a pergunta do título do artigo.
Mas, antes de prosseguir,
Arretche e Araújo definem o conservadorismo tomando como referência o Estado e
sua atuação. Em outros termos: conservadora seria a perspectiva que defende uma
atuação distanciada do Estado na intervenção em questões sociais, como, por
exemplo, na redução das disparidades sociais.
A resposta para a pergunta sobre
o aumento de nosso conservadorismo, mesmo que ainda inconclusiva por necessitar
de outras pesquisas e abordagens, é sim. Há um pequeno aumento de nosso
conservadorismo espantosamente entre as camadas mais pobres. Porém o aumento
desta preferência conservadora não é dramático e não modifica de forma
substantiva a preferência majoritária nas diferentes classes sociais por um
Estado interventor no enfrentamento das nossas desigualdades.
Contudo, há algo que causa
perplexidade e deve ser considerado com seriedade tanto por agentes políticos
tradicionais quanto pelos analistas. Não obstante a preferência progressista
sobre a atuação do Estado, apresenta-se o rechaço na maioria da população
quanto a uma maior taxação enquanto fonte para financiar a atuação do mesmo
Estado. É bipolar! A maioria deseja uma sociedade menos desigual. Todavia, sem
fontes que financiem esse projeto coletivo. Não por acaso os discursos
gerenciais fazem tanto sucesso com o eleitorado neste momento.
* Texto publicado no jornal Folha da Manhã em 29 de julho de 2017.
*Professor de Ciência Política no
Departamento de Ciências Sociais da UFF/Campos dos Goytacazes
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