sábado, 1 de julho de 2017

Temer, Janot e a razão

Temer, Janot e a razão*

George Gomes Coutinho**

Nesta semana mais uma vez tivemos um noticiário político tumultuado. Dentre os embates e acusações, que se tornaram rotina nos últimos anos, um me chamou a atenção: a troca de acusações entre Michel Temer, o presidente não eleito, e Rodrigo Janot, atual Procurador-Geral da República. Como conseqüência mais óbvia e rápida deste estranhamento entre presidência e Procuradoria-Geral da República, justamente no momento em que ocorreram as eleições para o cargo de Procurador-Geral, Temer quebra a tradição iniciada pelos governos petistas em 2003 e nomeia o segundo lugar mais votado dentre os Procuradores da República. O silêncio ensurdecedor de boa parte da grande mídia corporativa constrange o observador atento da conjuntura. Fico a me perguntar se não causaria estardalhaço, protestos e congêneres se algum dos mandatários petistas tivesse feito esta opção.

Cabe lembrar que na Era FHC em lugar de um Procurador-Geral da República tivemos, na prática, o que ficou conhecido como “Engavetador Geral da República”, onde os processos eram solenemente ignorados sempre que fosse conveniente. Não falamos de pouca coisa afinal.

Retomando as atuações de Temer e Janot, acredito que em momentos de ânimos inflamados certos conteúdos são apresentados de forma muito elucidativa.

Temer foi bastante duro em suas críticas. Apontou falhas jurídicas na peça de acusação que tem se tornado praxe em parte das ações do Ministério Público Federal. Esta crítica não é feita solitariamente por Temer. Em mais de uma ocasião foram apontados abusos que apenas tornam nosso Estado Democrático de Direito cada vez mais esquálido. Para além disso questionou a legitimidade do que considerou serem “ilações”. Nesta questão Temer também não está sozinho. É uma opção demasiado arriscada pautar acusações sem a devida materialidade de provas. Ainda mais chocante são condenações apriori pautadas por “indícios” e narrativas. Assim voltaremos para as rotinas inquisitoriais da Idade das Trevas.

Contudo, Temer não desconstruiu em nada o núcleo do argumento de Janot: as ligações intestinas entre empresariado e presidência. No final talvez Janot e Temer estejam corretos.

* Texto publicado no jornal Folha da Manhã em 1º de julho de 2017


** Professor de Ciência Política no Departamento de Ciências Sociais da UFF/Campos dos Goytacazes

Nenhum comentário:

Postar um comentário