Weltanschauung e o judiciário*
George
Gomes Coutinho **
Os movimentos de reflexão após a condenação
unânime de Luis Inácio Lula da Silva pela 8º Turma do TRF-4, o famoso “3 X 0 de
Porto Alegre”, iniciaram logo após o término do julgamento em 2ª instância. O
volume de informações e análises é assombroso. Desde o Mensalão, a gênese desta
conjuntura em que vivemos, há contribuições disponíveis que atendem o gosto do
freguês que tem o direito de buscar o que lhe apetece. Pode tanto se contentar
com notinhas e memes quanto também se encontram disponíveis artigos de fôlego,
teses, livros, seminários, etc.. Estamos diante de fauna diversificada.
A um
olhar que se pretenda “objetivo” neste momento cabem algumas tarefas: 1) o
exercício de tentar mirar para além dos interesses imediatos, paixões,
preferências e maniqueísmos; 2) a tentativa de “organizar” mentalmente toda
essa poeira que resiste em repousar.
Voltando
para a última quarta-feira, irei me concentrar em somente um dos muitos ângulos
possíveis de análise: o discurso de defesa/ataque de parte do judiciário
federal brasileiro. Não desconsiderando a importância de se discutir as
inconsistências diversas e “inovações” jurídicas adotadas do Mensalão para cá,
há uma visão de mundo compartilhada entre parte dos membros do judiciário
brasileiro. Irei me utilizar da proposição de Sigmund Freud (1856-1939) ao
explicar a Weltanschauung ou simplesmente “visão de mundo”, opção do
tradutor Paulo César de Souza na versão publicada pela Companhia das Letras em
2010 das “Obras Completas”.
Citando Freud: “Entendo que uma
visão de mundo é uma construção intelectual que, a partir de uma hipótese
geral, soluciona de forma unitária todos os problemas de nossa existência, na
qual, portanto, nenhuma questão fica aberta, e tudo que nos concerne tem seu
lugar definido.”.
Há o sutil, o “não dito” além das
tecnalidades no discurso de desembargadores. Parte do discurso referendando a
condenação apresentou um judiciário que crê que faz “direito positivo”
(desprezando materialidade) e opera em nome do “Estado de Direito” (de forma
seletiva). Em nome desta visão de mundo, que expressa mais uma fé do que fatos
incontestáveis, se apresentam cruzados pós-modernos contra os infiéis. Coeteris paribus, o futuro é sombrio.
* Texto publicado em 27 de janeiro no jornal Folha da Manhã de Campos dos Goytacazes, RJ.
** Professor de Ciência Política no
Departamento de Ciências Sociais da UFF/Campos dos Goytacazes
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