segunda-feira, 31 de agosto de 2020
Eleições norte-americanas 2020 – Parte II – Pós-lançamento da campanha republicana
Eleições norte-americanas 2020 – Parte II – Pós-lançamento da
campanha republicana
domingo, 30 de agosto de 2020
Eleições norte-americanas 2020 – Parte I – Lançamento da candidatura democrata
Eleições
norte-americanas 2020 – Parte I – Lançamento da candidatura democrata
Aluysio Abreu Barbosa[1]
Entre
o final da noite de ontem e o início desta madrugada[2], Joe Biden fez o discurso
que fechou a convenção democrata que lançou sua candidatura a presidente dos
EUA, em 3 de novembro. Pregou a união para que seu país saia da sua maior crise
humanitária, líder mundial em mortes pela Covid-19, e econômica desde a Grande
Depressão de 1929. E evocou o exemplo de outro democrata, que há 87 anos venceu
outro vírus, o da pólio, para reerguer os EUA e fazê-los o país mais poderoso
do mundo: Franklin Delano Roosevelt. Ao usar o exemplo do passado, Biden se mostrou atento às vozes
do presente. Emocionou-se ao lembrar suas próprias perdas, pessoais e
profundas, para mostrar empatia com as famílias do seu país devastadas pelas
mais de 170 mil mortes pela Covid. Como ressaltou estar atento às vozes dos
jovens que saíram as ruas dos EUA, sendo seguidos no mundo para protestar
contra a discriminação racial e por mais justiça social. E voltou a se
emocionar ao repetir as palavras que lhe disse, no velório do pai, a filha pequena
de George Floyd: “Meu pai mudou o mundo. Meu pai mudou o mundo”. Biden também foi duro. Deixou claro que os EUA não tolerarão
mais intervenções externas em sua democracia. E citou como exemplo a Rússia do
ditador Vladimir Putin, que usou hackers na criação de fake news para ajudar a
eleger Donald Trump presidente em 2016. A quem criticou duramente pela condução
dos EUA na crise da Covid, pelas pesadas perdas em vidas humanas, empregos e
empresas: “Não precisa de muita retórica.
Apenas julguem pelos fatos: 170 mil mortos, 5 milhões de infectados, 15 milhões
de desempregados, mais de 10 milhões sem plano de saúde, uma em cada seis
pequenas empresas fechando”. O candidato democrata garantiu que, se eleito, será diferente ao
governar para todos, não apenas aos apoiadores: “Vou trabalhar muito duro para quem não me apoiou. Esse é o trabalho de
um presidente”. Lembrou das minorias e prometeu privilegiar a maioria, sem
as benesses tributárias de Trump às grandes fortunas. Das quais prometeu cobrar
os impostos necessários para garantir direitos previdenciários e de saúde à
população: “Eu não quero punir ninguém. Mas já passou o tempo dos que mais
ganham ficarem isentos de impostos. É hora dos ricos pagarem mais. É preciso
contribuir com mais seguridade social”. Biden não é um orador brilhante como Barack Obama, a quem
agradeceu por ter servido como vice-presidente por oito anos. Nem um
comunicador histriônico, mas habilidoso, como Trump. Ele é o que os
estadunidenses chamam de “regular guy”
(“cara normal”). Talvez não por acaso, aos brasileiros, “Joe” seja uma gíria
para “mano”. Mas, às vezes, homens comuns são alçados por um contexto maior.
Como o que pareceu se reforçar ontem, com a prisão de Steve Bannon,
estrategista da exitosa campanha de Trump em 2016. De cujo governo saiu para
articular uma aliança internacional da extrema-direita, inclusive com o clã
Bolsonaro. E foi parar em cana por desviar recursos de um fundo para construir
um muro entre os EUA e o México. “Dê luz às pessoas. São
palavras para o nosso tempo. O presidente atual deixou o país no escuro por
muito tempo. Dou a minha palavra: se me levarem à presidência, serei uma fonte
de luz, não de escuridão”, pregou Biden. E depois completou: “Toda eleição é importante. Mas essa é ainda
mais. Chegamos a um ponto de inflexão. Tempos de perigo, e também de
oportunidades extraordinárias. Podemos escolher um caminho diferente, um
caminho de reformar, unir. Isso vai determinar o que os Estados Unidos serão no
futuro. A decência, a ciência, o caráter. Tudo isso está em jogo”. Falou
para os EUA. Que se o elegerem presidente em novembro, como indicam até aqui as
pesquisas, ecoarão no mundo. No Brasil,
por exemplo, se Biden vencer em novembro, toda a política externa do governo
Jair Messias Bolsonaro (sem partido) implode.
* “We The People” de Mindy Sommers. Disponível em: https://fineartamerica.com/featured/we-the-people-map-america-mindy-sommers.html
[1] Jornalista,
poeta e diretor de redação do jornal Folha da Manhã.
[2] O
texto em questão, aqui republicado com autorização do autor, foi postado
originalmente poucas horas após o lançamento da candidatura de Joe Biden q para presidência dos EUA neste ano de 2020. O post
original pode ser conferido em: https://www.facebook.com/aluysio.abreubarbosa.3/posts/1383124231876350
quinta-feira, 20 de agosto de 2020
segunda-feira, 17 de agosto de 2020
Democracia e Marxismo: a perspectiva de Ellen Wood
As Coordenações dos Cursos de Ciências Sociais da UFF-Campos e o Blog Autopoiese e Virtu convidam para a Live:
“Democracia e Marxismo: a perspectiva de Ellen Wood”
Convidado: Prof. Jefferson F. do Nascimento – IFSP/Sertãozinho-SP
– PPGPol/UFScar
Mediação: Prof. George Coutinho – UFF/Campos, RJ
25/08/2020 – 16 horas – Terça-Feira
Inscrições gratuitas em: https://www.even3.com.br/
Evento de lançamento do livro “Ellen Wood: o resgate da classe e a
luta pela democracia” de Jefferson Ferreira do Nascimento.
quinta-feira, 13 de agosto de 2020
Notas sobre o antifascismo à brasileira – parte I
Notas sobre o antifascismo à brasileira – parte I
“Nada mais parecido com um fascista que um pequeno burguês assustado” – Bertold Brecht.
Paulo Sérgio Ribeiro
Na expressão fascismo, há uma tessitura histórica a recomendar cautela ao observador contemporâneo, pois é grande o risco de se perder em sua labiríntica polissemia. Por sua vez, se o antifascismo se insinua como um front em meio ao descalabro que é o Governo Bolsonaro, é fortuito esboçar sua análise conceitual sem deixar de lado a matéria viva na qual ela se faz possível, a saber, a situação concreta na qual estamos metidos até o pescoço em busca de uma direção consequente.
Primeira observação: evocar o antifascismo como forma de opor-se a Jair Bolsonaro e a tudo que sua trajetória pública implica – sobretudo, quando vomita o revisionismo histórico de 1964 – não é algo nascido no calor das últimas horas. Lembremos, para ficar num só exemplo, a proibição, por parte do Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro (TRE-RJ), de uma faixa antifascista no pórtico da Faculdade de Direito da Universidade Federal Fluminense (UFF), em outubro de 2018[1], para não subestimarmos o caráter disruptivo que a denúncia do fascismo mantém após décadas de sua gênese na Itália dos anos 1920, liderada por Benito Mussolini, o Duce, até os estertores da Segunda Guerra Mundial.
Mesmo sem pretensão de realizar uma exegese do fascismo italiano, convém indagar como aquela experiência serve de diagnóstico àqueles(as) que vislumbrem no antifascismo um horizonte comum das lutas sociais impulsionadas pela irresponsabilidade do Executivo Federal na gestão da crise econômica e da pandemia da Covid-19. Desde já, livremo-nos de uma exigência tola de formalismo metodológico: provavelmente, a maioria das pessoas que replicam em suas redes virtuais o símbolo antifascista não tem a menor ideia do que foi o fascismo em solo europeu e isso, em si, não chega a ser um problema para quem almeje a revitalização da esfera pública. Se o pensamento político nada mais é do que um movimento de pensamento, não serei eu a exigir duas cópias autenticadas no cartório oficial da cultura erudita para quem queira fazer do antifascismo sua causa.
Para tatear as pegadas deste monstro secular, recorro à interlocução de Eric Hobsbawn em seu “Era dos Extremos”[2]. Tal escolha, por certo, não o toma por obra definitiva sobre o fascismo[3], mas tão somente como uma referência oportuna para desatar alguns nós górdios do que venha a ser o seu contraponto entre nós, brasileiros(as), diante da agenda de reformas que se desenrola sob o bolsonarismo sem, todavia, estar reduzida a ele. O monstro a que aludimos releva-se, em chave psicanalítica, como a irracionalidade humana latente que engendra um movimento cíclico de repressão-rebelião-restauração que, em cada época, adquire fisionomia própria.
Na época focalizada por Hobsbawn, as três primeiras décadas do século XX, malgrado o mundo já ter testemunhado sua Primeira Grande Guerra, a “civilização liberal” ainda parecia um futuro promissor para um seleto grupo de Estados independentes organizados em torno de valores antitéticos aos regimes de força. Mais do que um arranjo institucional, tratava-se de uma cultura política herdeira do Iluminismo, na medida em que seus principais atributos – governo constitucional com representantes livremente eleitos e submetidos ao domínio da lei; e liberdades civis asseguradas aos cidadãos enquanto um conjunto de direitos sustentado pelo aprendizado coletivo sobre a dignidade da “pessoa humana” – eram tributários de uma noção difusa de melhoria do gênero humano – o reluzente progresso – a ser informada cada vez mais pelo debate público mediado pela educação e pela ciência.
Desnecessário dizer que a antessala desse (frágil) triunfo da civilização burguesa correspondia à existência de domínios coloniais, sem, claro, esquecermos de alguns poucos Estados que consistiam em verdadeiras autocracias. Contudo, no Ocidente, um vendaval autoritário destronaria as crenças coletivas da modernidade oitocentista que mostrava ainda vigor sob aquele verniz civilizatório: se, como aponta Hobsbawn[4], antes da Marcha sobre Roma (1922), contavam-se mais de 60 Estados independentes nos continentes europeu e americano que, com maior ou menor consistência, poder-se-iam chamar de democracias liberais, em 1944, pouco mais de dez Estados persistiriam com tais regimes políticos.
O declínio do liberalismo ocorria pari passu com o ensaio geral de uma nova conflagração entre potências imperialistas. Não obstante, salienta Hobsbawn[5], a ameaça às instituições que o espelhavam vinha apenas da direita política. A contar com as teses estapafúrdias (e nem por isso menos eficazes na “guerra híbrida” em que estamos) de uma extrema-direita hiperativa nas redes virtuais, não surpreende que a regressão operada por forças políticas de variado matiz conservador seja atribuída, pasmem, mais uma vez ao espantalho do comunismo. Eleger o último como o álibi da violência estrutural do capitalismo sempre foi um ardil irresistível em um sistema socioeconômico cuja incapacidade de produzir solidariedade social nada mais faz do que devolver àquela violência estrutural sua nudez e crueza nos períodos de agudização das crises de acumulação capitalista.
Na presente década (2011-2020), mal passado o crash de 2008, tornou-se um dado sensível para a geopolítica a rearticulação de uma direita internacional com virulência equivalente à sua congênere que flertou com o fascismo no entreguerras. Todavia, tal aggiornamento reacionário não parece, até prova em contrário, uma ameaça imediata aos regimes democráticos. Ao menos, é o que sugere um insuspeito periódico liberal, The Economist[6], ao divulgar (adotando critérios teóricos e metodológicos que não discutiremos aqui) um ranking de países segundo a eficiência ou debilidade do desempenho de suas instituições democráticas. Nele, o Brasil seria classificável como uma “democracia imperfeita”. Sim, eu sei, soa um tanto eufemístico para quem sobreviveu até aqui em solo brasileiro.
Perdoem o argumento de autoridade, mas se o maior liberista que o Brasil foi capaz de oferecer ao mundo, José Guilherme Merquior (1941-1991), admite que nem todas as conquistas democráticas no Ocidente podem ser tributadas às forças explicitamente liberais[7], não haveria por que ignorar o que está em jogo na reiteração de falácias sobre aquela que viria o grande rival delas: a revolução social, como máxima expressão da crítica ao capital e, não menos, como veio narrativo das tradições de esquerda em disputa por uma consciência possível.
Na longa guerra civil europeia (1914-1945), os comunistas propriamente ditos sempre foram minoria nos movimentos trabalhistas da maioria dos países e, quando se mostravam suficientemente fortes e coesos, foram ou estariam na iminência de serem massacrados. O medo de uma revolução anticapitalista era real, porém seus potenciais agentes não estavam incondicionalmente comprometidos com esse fim: na Rússia soviética, o movimento revolucionário além fronteiras recuaria depois da Primeira Guerra e os movimentos social-democratas (de orientação marxista) aceitavam sem maiores senões a democracia representativa, convertendo-se meramente em partidos da ordem [8].
Se houve uma segunda onda revolucionária durante e após a Segunda Guerra, ressalva Hobsbawn, o “perigo vinha exclusivamente da direita”[9] quanto à derrubada de governos constitucionais. Guardados os condicionantes inerentes à “Era da Catástrofe” em face da falência do programa neoliberal no século XXI, é razoável indagar sobre o “perigo” da nova articulação global de uma direita tentada a dobrar a aposta diante da crise de legitimação do capital, pois, tal como no aludido cenário de guerra total, é desaconselhável esquecer que o “rótulo ‘fascismo’ é ao mesmo tempo insuficiente mas não inteiramente irrelevante”[10].
Se tal advertência procede, na sequência, buscarei sumariar como Hobsbawn tipifica as forças que punham abaixo os regimes liberal-democráticos e, por conseguinte, contextualizar tais dinâmicas no que concerne ao antifascismo no Brasil de Bolsonaro.
[1][1] UOL. TRE tira faixa antifascista da UFF e fiscais vão à UERJ; OAB acusa censura, edição de 26/10/2018. Disponível (aqui)
[2] Cf. HOBSBAWN, Eric. Era dos Extremos. O breve século XX: 1914-1991. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.
[3] George Gomes Coutinho faz um excelente cotejo de outras referências igualmente relevantes em texto derivado de sua participação, a convite do Cineclube Marighela, como debatedor do filme “A Onda”, intitulado “Reflexões sobre o Fascismo” (aqui).
[4] Op. cit., p.114-115.
[5] Idem.
[6] UOL. Brasil cai em índice que mede democracias no mundo. Edição de 22/01/2020. Disponível (aqui)
[7] Cf. MERQUIOR, José Guilherme. O liberalismo – antigo e moderno. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1991, p.18.
[8] Cf. HOBSBAWN, Eric. Era dos Extremos. O breve século XX: 1914-1991. São Paulo: Companhia das Letras, 1995, p. 116.
[9] Ibid. ibidem.
[10] Idem.