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terça-feira, 27 de novembro de 2018

Samba, resistência e democracia - quarta, 28/11/2018 - 18 horas

Prezad@s,

Repassando convite do prof. Paulo Gajanigo do  Departamento de Ciências Sociais da UFF:

"(...) gostaria de divulgar evento que estou organizando em parceria com Giovane Nascimento, da UENF. Exibiremos o documentário 'Kizomba: 30 anos de um grito negro na Sapucaí', produzido pelo Departamento Cultural da Vila Isabel. Após a exibição ocorrerá uma roda de conversa com a presença da Velha Guarda da GRBS Os Psicodélicos e de Vinícius Natal (diretor do Dep. Cultural da Vila Isabel)."


O evento irá acontecer na próxima quarta-feira, dia 28/11, 18 horas, na quadra dos Psicodélicos aqui em Campos. 

sexta-feira, 27 de julho de 2018

CARTA DENÚNCIA: Violações no Açu - Tirador de leite, vaqueiro, campeiro, retireiro, camponês, lavrador ou agricultor?

CARTA DENÚNCIA: Violações no Açu

Tirador de leite, vaqueiro, campeiro, retireiro, camponês, lavrador ou agricultor?

Por Ana Maria Costa*

Açu/São João da Barra, 26 de julho de 2018.


Se perguntarmos a profissão dos membros das aproximadas 15 famílias que vivem a saga do gado, desde que suas terras foram expropriadas pelo então governador, e hoje presidiário, Sergio Cabral e entregue ao homem mais rico do Brasil na época e hoje também em prisão domiciliar, Eike Batista, eles certamente vão falar das atividades que desenvolvem desde o nascer do sol até o momento em ele se põe, e a escuridão os obrigam a descansar. 

Até há uns dez anos atrás, não havia lugar melhor para se viver, eles dizem. A lida com os animais e a terra era realizada com a tranquilidade que o campo propicia. Contada, principalmente, pelos mais velhos, percebemos o trabalho é duro e intenso, mas prazeroso! Chega a parecer bucólica e prazerosa a vida vivida é sentida por essas famílias. 

Mas, logo que o monstro, metáfora usada por alguns para descrever o Megaempreendimento, que é o Porto do Açu, chegou a paz e o sossego foram também destruídos por ele.

 As terras foram invadidas pela empresa, hoje Prumo Logística S.A., as moradias destruídas, as famílias e seus animais, que para alguns, complementavam a renda familiar, para outras era a única renda para a manutenção e reprodução das mesmas.

 Nesse processo de expropriação das terras em que essas não foram utilizadas, deixando inclusive de cumprir a sua função social, uma vez que foram apenas destruídas esvaziadas as moradias, benfeitorias, histórias, sentidos e significados, para facilitar a especulação fundiária, pois até hoje, mais de uma década, menos de 10% (dez por cento) desta área, foi ocupada com todas as obras do porto, bem como, das empresas do retro porto. Assim, os agricultores tiveram que usar essas terras ociosas para alimentar o seu gado, tornando-se itinerantes em seu próprio chão.

 E agora, mesmo a terra não cumprindo com a função social, a empresa/Prumo Logística S. A., junto ao Estado/CODIN, conseguem que o juiz Leonardo Cajueiro, ordene a retirada do gado dessas famílias trabalhadoras, com prazo final para o dia 27/07/2018.

 Nesse período, a Defensoria apresentou alguns argumentos e pedidos que não foram apreciados, motivando que entrasse com embargos.

 Desse modo, vimos por meio dessa carta, questionar onde está a Ampla Defesa? O Contraditório? E ao mesmo tempo alertar a sociedade de mais essa injustiça praticada em nome da acumulação, concentração e centralização da riqueza nessa região e no país. Que simplesmente, em uma década, o domínio privado das terras, já alcança quase que 30 mil hectares de terras em função do projeto Minas Rio, somando terras privadas e unidades de conservação (em que parte é terra pública, mas com destinação vinculada ao empreendimento) em Conceição de Mato Dentro/MG, no Açu em São João da Barra/RJ e nas áreas de servidão de todo o percurso dos 525 quilômetros do mineroduto das ´das cavas para exploração do minério nas Montanhas em Minas Gerais, até os mares, para exportação, até então do minério no Porto do Açu. Solicitamos ampla divulgação.

* Ana Maria Costa - Professora da UFF Campos/RJ, participa do Núcleo de Estudos sobre Trabalho, Cidadania e Desenvolvimento (NETRAD). Email para contato: costa_ana@id.uff.br.  

sexta-feira, 24 de novembro de 2017

Tudo novo de novo? - Breves reflexões sobre a ação coletiva

Tudo novo de novo?* - Breves reflexões sobre a ação coletiva**

George Gomes Coutinho ***

Quando eu elaborava meu primeiro trabalho acadêmico dotado de algum fôlego, no caso minha primeira monografia na UFF/Campos no início deste século, tive a afortunada experiência de ser orientado pelo professor José Luiz Vianna da Cruz, uma das rochas fundamentais da sociologia e dos estudos sobre desenvolvimento regional entre nós. Muita água correu no Paraíba do Sul desde então. O professor José Luiz, daquela relação formal entre orientador e orientando de graduação, se tornou posteriormente meu amigo, colega de Departamento de Ciências Sociais e prossegue sendo um interlocutor/conselheiro. Tanto é que hoje em dia ouso chamá-lo simplesmente de “Zé” em uma demonstração singular de respeito e carinho que tenho por ele.

Voltando ao início deste século, minha monografia tinha por tema os movimentos sociais na universidade pública. O Zé, do alto de sua experiência, me apresentou uma questão logo no início de nossos trabalhos formulada de maneira simples e objetiva. Afinal, se estávamos falando de movimentos sociais, o que os move? Se a pergunta era sintética e elegante, a resposta (ou as respostas) me levou a trafegar pelas águas turvas das noites em claro. A pergunta do Zé tocava realmente no que era fundamental. Quais seriam os “móveis” da ação coletiva? Arrisco dizer que de lá pra cá parte de meus trabalhos foram tentativas de responder a essa pergunta de forma direta ou indireta e certamente parcela do conhecimento sistemático sobre a política enquanto fenômeno se estrutura nos arredores dos dilemas da ação coletiva.

Na conjuntura atabalhoada em que vivemos Aluysio Abreu Barbosa em uma conversa telefônica amistosa decidiu reencarnar a pergunta do Zé trazendo para o nosso contexto. Senti na pele que de fato as grandes questões não desaparecem. Elas se atualizam de acordo com as especificidades de cada momento histórico. Aluysio inclusive não me colocou “pouca coisa”. Ele nota, de forma correta, que os grandes movimentos coletivos brasileiros ocorridos desde o arrefecimento da ditadura civil-militar até 2015, perpassando o Fora Collor de 1992 e o junho de 2013 nas regiões metropolitanas do país, não são tudo farinha do mesmo saco. De fato não são. Todavia, vamos tentar ver o mínimo estrutural que os aproxima e o muito que diferencia estes grandes movimentos que tem a rua por cenário. Causando estranheza ao leitor, justamente o que os assemelha e os distancia envolve responder a pergunta do Zé: quais os móveis?

Teoricamente, de Karl Marx (1818-1883) a Mancur Olson (1932-1988), o que move grupos e classes que engendram ação coletiva, o “grande móvel”, é o interesse. É justamente o que aglutina e torna possível a ação coletiva e associativa dos sindicatos, movimentos sociais tradicionais, grupos de pressão, movimentos de massa, etc.. Seja a Associação Nacional de Rifles da América, o Greenpeace, O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo ou o pessoal da Tradição, Família e Propriedade. Coloquei exemplos tão discrepantes não tanto para causar desconforto ao leitor. Apenas quis demonstrar que estes grupos, a despeito do seu posicionamento no espectro político, se são de esquerda ou direita, progressistas ou conservadores, todos se agrupam em prol de algum interesse comum e compartilhado. A associação “reduz custos” que seriam simplesmente impossíveis para um indivíduo isolado e a ação coletiva visa permitir que se alcance um objetivo ou um conjunto de objetivos.

Antes de prosseguir, venho declarar minha discordância sobre a morte da política ou o que seria um processo de despolitização no Brasil contemporâneo. Eu concordo que exista um arrefecimento da política tradicional sem dúvida, algo que está na raiz da crise da democracia representativa no mundo. Não por acaso partidos, seja aqui ou na Europa, apresentam um déficit de legitimidade considerável entre seus eleitores. Porém, a política envolve tomar decisões dotadas de caráter vinculante como diria o alemão Niklas Luhmann (1927-1998). Portanto, se a morte é inevitável para tudo o que é vivo, a política é inescapável para todos(as) que vivem em sociedade. Decisões que tem impacto coletivo, seja sobre os parâmetros curriculares do Ensino Médio ou regras de tributação, são da natureza da política. Porém, há a mudança de agendas, novos temas emergentes e das formas de se fazer política, algo que retomarei adiante.

Prosseguindo, se os interesses demarcam a ação coletiva para gregos, troianos e baianos, não podemos ignorar a modulação fornecida pelos valores, visões-de-mundo, ideologias, elementos simbólicos, etc.. Neste ponto TFP e MST tem obviamente posicionamentos inconciliáveis sobre a questão agrária por exemplo. As agendas dos movimentos, a maneira pela qual os interesses se particularizam e dão robustez para a operacionalização da ação, são obviamente distintos. Contudo, temos momentos em que estes movimentos, de natureza mais particularizada, transcendem seu público de adeptos e simpatizantes atingindo a sociedade como um todo. A pauta originária de um grupo torna-se uma pauta consensual entre diversos grupos e classes. Olhemos para o movimento “Diretas Já” na longínqua década de 1980.

Nas “Diretas” o contexto explica. Se a ditadura civil-militar jamais foi um consenso total na sociedade brasileira, o que redundou nos movimentos de resistência insurrecionais (luta armada) e civilistas (atuação nas instituições), é impossível não reconhecer que um regime que durou 21 anos não tenha gozado de legitimidade entre amplos setores da população. Todavia a ressaca produzida pelo “Milagre”, o cenário de hiperinflação galopante e pauperização, tornou o descontentamento incontrolável. Inclusive a atuação da grande mídia oligopolista, até então entusiasta de primeira hora ao golpe de 1964, deu sua contribuição e reverberou o processo de perda de legitimidade dos militares no poder.  Neste ponto da história o que era um movimento perene em prol do retorno dos ritos democráticos de uma contra-elite minoritária (partidos de esquerda, intelectuais e artistas), se tornou um movimento de massa que transcendeu classes e grupos. Só o amplo consenso formado explica em um mesmo palanque gente como Ulisses Guimarães, Fernando Henrique Cardoso e Luis Inácio Lula da Silva.

O movimento da “Diretas” foi um movimento de massa cujo interesse era o de reinstituir a normalidade democrática. Considero equivocado considerar a “Diretas” um movimento de esquerda, embora que atores tradicionais deste espectro político, o que inclui sindicatos, partidos e movimentos sociais, tenham dado suporte inegável ao que vimos no Brasil na década de 1980. Os atores tradicionais auxiliaram na fisionomia do movimento de massas inclusive pelo acúmulo de expertise em se manterem organizados, a despeito de terem atuado durante boa parte do século XX na ilegalidade ou semi-legalidade. Igualmente forneceram um discurso, muitas vezes contundente, expresso em palavras de ordem onde a crítica da situação econômica era absolutamente oportuna para o momento.

Também o “Fora Collor” na década de 1990 mantém alguns dos aspectos que citei acima:1) transcende a crítica de uma contra-elite minoritária; 2) encontra apoio e reverberação da mídia oligopolista; 3) é dotado de uma fisionomia de esquerda pelo protagonismo de certos atores tradicionais, embora que o consenso naquele momento quanto ao impeachment tenha abarcado diversos grupos sociais para além do espectro político mencionado. 

A questão é que o mundo mudou muitíssimo de lá para cá. A chamada “revolução informacional”, que se potencializa a partir do final da década de 1990, já inclui novas formas de comunicação e interação na sociedade. Ao mesmo tempo tivemos os anos do lulismo neste século XXI, onde os atores tradicionais da esquerda ingressaram nas instituições e tanto passaram a ser “vidraça” quanto tiveram sua atuação contestatória consideravelmente diminuída. Afinal, movimentos e partidos tornaram-se governo. Nesse ínterim novas pautas ganharam ainda mais corpo e possibilitaram o protagonismo de atores que não se sentiam plenamente contemplados pelos movimentos tradicionais de esquerda. Esse diagnóstico não é meu, boa parte da literatura sobre movimentos sociais aponta para esta questão. Aqui, dentre as novidades, falo do movimento ambiental, feminista, movimento negro, grupos LGBTT, etc.. A natureza, este agente difuso, ganha porta-vozes humanos. Jessé Souza (1960), sociólogo brasileiro, ironicamente chama este grupo de “classe média de Oslo”, brasileiros que adotam uma agenda ambiental e de sustentabilidade digna dos nórdicos.  E os afetos e a expressividade adquirem uma enorme relevância onde o clássico problema das diferenças materiais entre as classes sociais passa a ser secundário. Não por acaso o filósofo francês Luc Ferry (1951) aposta que a intimidade, as relações afetivas, é um tema amplamente mobilizador neste século XXI.

Um outro ponto, ao qual não canso de lembrar, é o da fadiga das democracias representativas liberais no mundo todo na nossa conjuntura. Devo este diagnóstico ao sociólogo polonês Zygmunt Bauman (1925-2017). A alta financeirização das economias nacionais, processo que se inicia na década de 1970, torna os governos reféns diretos da pauta fornecida pelas grandes instituições financeiras. Em suma: o que prometem nas campanhas eleitorais não é efetivamente realizado inclusive por constrangimentos e acordos que moldam os orçamentos governamentais. Parte da crise de legitimidade da social democracia européia é explicada por este fator. Na esteira da fragilização dos partidos social democratas, os partidos tradicionais moderados sofrem por inércia. Portanto, a crise da democracia representativa liberal é seguramente também uma crise dos partidos e lideranças tradicionais, um problema que não é só brasileiro.

O junho de 2013 no Brasil se insere neste macro contexto absolutamente complexo. Não foram os atores tradicionais de esquerda que organizaram os movimentos. Pelo contrário. Em várias cidades brasileiras estes atores foram até mesmo hostilizados. Naquele momento muitos analistas ficaram atônitos. O que houve?

Junho de 2013 foi um dos maiores testes da capacidade de aglutinação coletiva das novas formas de comunicação e interação. Como vimos, é inegável o barulho causado. Naquele momento o slogan “Vem Pra Rua” ou o Movimento Passe Livre sintetizam uma pauta reivindicatória que envolveu desde o seu estopim, no caso a revogação do aumento do preço das passagens urbanas, até a crítica ao uso de dinheiro público para as grandes obras que seriam necessárias para a realização dos mega-eventos vindouros. Tanto a Copa do Mundo quanto as Olimpíadas do Rio estavam na lista de prioridades do Estado brasileiro.

Notem que por mais que tenham se apresentado como “movimentos pulverizados”, haviam pautas reivindicatórias que apontavam tanto para o direito de mobilidade urbana quanto implicavam, mesmo que de forma um tanto inábil, na tentativa de influir no processo de tomada de decisão sobre os orçamentos governamentais. Em contraposição ao investimento nos mega-eventos os manifestantes clamavam, mesmo que sem muita precisão, por mais investimentos em saúde e educação. Neste ínterim, até pelo caráter inovador, os grupos políticos tradicionais não conseguiram interlocução ou mesmo captar as demandas apresentadas, dotá-las de objetividade política.

Ali abriu-se uma caixa de Pandora. Os métodos de mobilização, até então jamais vistos no cenário tupiniquim, foram depois largamente utilizados. Inclusive há semelhanças de métodos com o que ocorreu aqui e na Primavera Árabe: redes sociais, novas formas dinâmicas de interação, etc..

Cabe notar que os movimentos da chamada “nova direita” no Brasil se utilizaram depois fartamente tanto da estética de mobilização dos grupos de junho de 2013 quanto até mesmo de nomenclaturas e slogans. Afinal, o “Movimento Passe Livre”, o MPL, de alguma inspirou o “Movimento Brasil Livre”, não por acaso MBL. O slogan “Vem Pra Rua” tornou-se um movimento homônimo.

Nesse ínterim uma pletora de questões aflorou. Trata-se de uma constelação de fatores. Aqui a frustração econômica causada pelo término da era das commodities implicou uma enorme dificuldade de manutenção das políticas econômicas e sociais do lulismo continuadas por Dilma Rousseff. Este é um ponto crucial para entendermos a insatisfação que gerou os movimentos de massa pós-2013. Para além disso os movimentos da “nova direita” passam a vocalizar demandas e perspectivas de grupos da sociedade que até então não encontravam representantes dotados da capacidade de síntese necessária e com enorme habilidade em utilizar as redes sociais. Não quer dizer que não existissem as visões-de-mundo mais conservadoras. Apenas não haviam encontrado grupos que vocalizassem esses sentimentos difusos.

Nesse ínterim, já desde ação penal 470, o “mensalão”, a grande mídia monopolista engrossou de forma sistemática a narrativa que associou o Partido dos Trabalhadores de forma inequívoca, por vezes quase exclusiva, ao fenômeno da corrupção. Por outro lado, no âmbito da política tradicional, Dilma lidou diretamente com um governo dotado de capacidade decisória limitada e um Congresso Nacional rebelde liderado por Eduardo Cunha.

O que tornou os movimentos de massa diferenciados não foi tanto o uso das táticas de comunicação novas já experimentadas em 2013. O que há de novo é o conteúdo apresentado e pela primeira vez desde a redemocratização a ausência de atores ou pautas usualmente apresentadas pela esquerda tradicional. Até 2013 encontrávamos pautas de reivindicação inclusivas, de ampliação direitos. De 2013 em diante não houve sequer a fisionomia de esquerda. Neste ponto do diagnóstico concordo plenamente com Aluysio que me chamou a atenção para este fato.

Contudo é difícil dizer, conforme afirmei anteriormente, que a “política morreu”. Outros grupos, dotados de alta capacidade de negociação jamais arrefeceram. As mudanças que vivenciamos de 2016 para cá na legislação social são obra de grupos que se não redundam em grandes movimentos de massa, até pela natureza silenciosa com que atuam, são tão ou mais eficientes no diálogo com o sistema político tradicional. São grupos de pressão dotados de alto poder de fogo oriundos das 6 mil famílias que concentram boa parte da riqueza nacional. Promovem uma ação coletiva menos visível dado o convencimento promovido pelo dinheiro. Neste sentido na atual conjuntura é desnecessário inflar grandes movimentos da nova direita nas ruas e lidamos com uma contra-elite, pelo flanco esquerdo, profundamente fragilizada e carente de legitimidade.

O que ficará disso tudo? Como já disse Wanderley Guilherme dos Santos (1935), um dos decanos da ciência política brasileira, “o futuro não é materialmente verificável”. O que temos certeza é que a revolução informacional das últimas décadas, se modificou o cotidiano das nossas sociedades, não poderia ter efeito muito diferente nas mobilizações coletivas. Estas, tal como outrora, permanecem guiadas por interesses sendo este o móvel aglutinador. Todo o restante sobre o amanhã ainda “não decantou”. Aguardemos.  Porém, os “móveis” da questão do Zé prosseguem.

* Uma confissão tardia, sincera e necessária neste 03 de dezembro de 2017. Tomei de empréstimo o título do "cantautor" brasileiro Paulinho Moska. Moska lançou em 2003 o disco e a canção "Tudo novo de novo" que inspirou diretamente a forma como batizei esse texto. Se todos somos um pouco ladrões, e creio que somos, espero que a minha condição de réu confesso pelo menos amenize a pena vindoura.

** Texto publicado originalmente  em 24 de novembro de 2017 no blog "Opiniões" do jornalista Aluysio Abreu Barbosa. O blog "Opiniões" é parte do grupo Folha da Manhã de Campos dos Goytacazes, RJ. Disponível em: http://opinioes.folha1.com.br/2017/11/24/origem-da-serie-ruas-do-brasil-resumida-por-george-gomes-coutinho/


*** Professor de Ciência Política no Departamento de Ciências Sociais da UFF/Campos dos Goytacazes

domingo, 23 de abril de 2017

Reparação histórica no Açu - 2ª edição

Reparação histórica no Açu - 2ª edição *

George Gomes Coutinho **

A História humana detém em seu rol de atrocidades  injustiças que ocorreram e continuam a ocorrer nos diversos pontos do globo. No entanto, o reconhecimento pleno de massacres, perseguições e outras tantas práticas opressivas que apequenam a espécie humana só recentemente tem se tornado objeto de atenção.

Políticas e ações de reconhecimento, neste tipo de caso em particular, implicam que agrupamentos factualmente opressores e a sociedade como um todo reconhecem que em determinado momento histórico moveram e/ou desviaram outros grupos sociais contra a sua vontade de sua própria trajetória. Estou dizendo que o direito de autodeterminação foi negado a etnias, tribos, grupos ou seguidores de uma determinada crença. Este processo de dominação não separa violência simbólica da física e se estende por gerações até que o ciclo das ações persecutórias, onde a humilhação faz parte do cardápio, é quebrado.

Por vezes agrupamentos sociais aguardam séculos por este tipo de reparação. Em outros casos há janelas históricas que podem abreviar o tempo de espera. Afinal “o tempo é muito longo para aqueles que esperam” como diria o escritor norte-americano Henry Van Dyke Jr (1853-1933).

Na última quarta-feira, dia 19 de abril, a ASPRIM (Associação dos Proprietários Rurais e de Imóveis do Município de São João da Barra) e o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) reocuparam parte das terras tomadas pelo empreendimento nacionalmente conhecido como “Porto do Açu”. O fato abriu uma janela de reparação histórica.

 O processo de retirada das famílias originais do 5º distrito de São João da Barra não transcorreu sem traumas, algo que incluiu até mesmo indenizações questionáveis, intimidações e outras práticas no mínimo controversas. Para além disso dois agentes indiscutivelmente importantes para este processo, o “Barão de São João da Barra” Eike Batista e Sergio Cabral Filho, ex-governador do Rio de Janeiro, encontram-se no Complexo Penitenciário de Gericinó, antigo Complexo de Bangu.

Reparações históricas não mudam o passado. Mas, podem modificar o daqui por diante.


* Texto original publicado no jornal Folha da Manhã em 22 de abril de 2017. Nesta "2ª edição" digital fiz uma leve modificação na forma do texto. Contudo, o conteúdo propriamente é o mesmo da versão impressa.

** Professor de Ciência Política no Departamento de Ciências Sociais da UFF/Campos dos Goytacazes

quarta-feira, 19 de abril de 2017

Nota - Reocupação das Terras do Açu - São João da Barra, RJ

Na jornada de luta camponesa Pequenos Agricultores e Sem Terra retomam as terras do Açu

Os pequenos agricultores do Açu, 5º distrito de São João da Barra, Norte do Estado do Rio de Janeiro junto com o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) reocuparam na manhã desta quarta-feira (19/04), às 5h da manhã, suas terras., após oito anos afastados por força do decreto do governo estadual Nº 41.195, de 19 de junho de 2009.
Esta ação faz parte da jornada nacional de luta pela terra que ocorre em todo o Brasil, de 17 a 21 de abril.

As terras foram tomadas pela empresa LLX do empresário Eike Batista e visava a implantação de um distrito industrial na área do entorno do Porto do Açu. Através de um termo precário, a Codin (Companhia de desenvolvimento industrial do estado do Rio de Janeiro) autorizou a empresa do Eike a entrar e tomar posse destas terras. 
Cerca de 500 pequenos proprietários foram desapropriados. Uma pequena parte recebeu indenização em valores irrisórios. A maioria questiona na Justiça os termos desta desapropriação.

A decisão de voltar para as terras foi tomada pelos agricultores e organizada pela Asprim (Associação dos Proprietários Rurais e de Imóveis do Município de São João da Barra) que luta desde 2009 contra as desapropriações.

Os pequenos proprietários e seus apoiadores entendem que os objetos que teriam justificado o decreto de desapropriação e nortearam a tomada da terra deixaram de existir.
As empresas que ocupariam a enorme área: siderúrgicas (duas), cimenteiras (duas); usinas termelétricas, estaleiros e outras há muito já anunciaram suas desistências, desde que os negócios de Eike Batista foram ao chão. 

O porto saiu da propriedade da LLX e foi para o fundo americano EIG que, para ficar livre de Eike rebatizou a empresa que controla o Porto do Açu como Prumo. Assim, não há nenhuma razão para que o decreto continue em vigor.

Se, já não bastasse, as prisões do ex-governador Sérgio Cabral e do Eike Batista permitiram que viesse à tona todas as negociatas que acompanharam todo este processo que eram denunciadas pelos agricultores e agora, eliminando de vez, os objetivos e a base legal para que o decreto continue em vigor.

O representante da Asprim, Rodrigo Santos diz que “estamos voltando para o que nunca deixou de ser nosso. Voltaremos a produzir e exigimos que nos devolvam as escrituras de nossas propriedades. Fomos roubados por ladrões que estão presos e nada mais justifica que não possamos voltar para as nossas terras e à produção”. 

Segundo o dirigente estadual do MST, Marcelo Durão, a retomada das terras no 5º Distrito no mês de abril, representa não só o apoio aos agricultores do Açu e a denúncia a todas as violações aos direitos humanos vivenciadas, mas também, o enfrentamento ao processo de reconcentração de terras, da venda de terras do Brasil aos estrangeiros, a criminalização aos movimentos sociais e a defesa intransigente do direito à terra como garantia à alimentação adequada e a preservação do modo de vida camponês na contemporaneidade.

A animação e disposição dos agricultores ao voltarem às suas terras é emocionante. Eles contam com o apoio de toda a população contra as injustiças que sofreram, exigem a devolução de suas terras e a anulação do decreto.

Contatos: Rodrigo Santos – 22 999570801; Marcelo Durão: 21 -980551545; Alcimaro: 22 998027515

São João da Barra, 19 de abril de 2017.