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quarta-feira, 15 de maio de 2019

VIVA A BALBÚRDIA UNIVERSITÁRIA!



O professor José Luis Vianna da Cruz* nos brinda com mais um texto em que a fina ironia e o rigor analítico guiam seu olhar atento para a conjuntura nacional:

VIVA A BALBÚRDIA UNIVERSITÁRIA!
O Governo Federal de plantão está tentando destruir a Educação, com requintes de crueldade. O que está fazendo com o Ensino Superior e as Instituições Federais é um crime de lesa-humanidade, a pretexto de uma certa “balbúrdia universitária”!
Não vou defender a Universidade pela linha do ensino, da extensão e das pesquisas, ou seja, da contribuição para a Ciência, Tecnologia e Inovação. É cinismo e hipocrisia não reconhecer isso, principalmente graças à Universidade Pública e Gratuita.
Vou destacar a Universidade pelo seu papel essencial na formação do cidadão, nos campos da sociabilidade, da cultura, das artes e da política; vou exaltá-la pela linha da liberdade, da crítica, da independência, da autonomia e da luta por um mundo melhor.
Nessa linha, a Universidade é pura balbúrdia. Ela questiona e sacode os valores estabelecidos, as convenções fossilizadas, o conformismo submisso, a subalternidade, a passividade, a falta de crítica, as formas de dominação, a ordem injusta e a alienação. Ao lado da reflexão, do conhecimento, da ciência e da experimentação, é função da Universidade praticar a rebeldia, a indignação e o inconformismo, e se comprometer com as lutas pelas mudanças direcionadas para a construção de um mundo melhor.
Nós, Universitários da Balbúrdia, somos pela contestação da ordem conformista e pela construção de um outro mundo, solidário, democrático, generoso, equitativo e harmônico, em termos humanitários e ambientais. Por isso, marchamos ao lado dos pobres, dos favelados, dos ambientalistas, dos militantes da diversidade de gênero e raça, dos camponeses, dos indígenas, dos sem teto e sem terra, dos excluídos; enfim, das minorias e maiorias invisibilizadas, destituídas e descartadas pelas elites.
Por ser democrática, a Universidade possui todos os defeitos e virtudes. Tudo o que temos, de bom e ruim, é vivenciado e trabalhado publicamente, como numa Democracia.
Na Universidade seguimos leis, normas, portarias, hierarquia, rituais, calendário, organogramas e cronogramas. A pressão por produtividade está sufocando a autonomia e a liberdade necessárias à criatividade. Somos uma das instituições mais engessadas e fiscalizadas da nossa Nação. Toda essa ordem é seguida e contestada, simultaneamente. A balbúrdia é justamente a liberdade e a autonomia na institucionalidade.
A Universidade é, obrigatoriamente, escola de política. E o Movimento Estudantil é um grande formador de cidadãos. Eu comecei minha formação política como Presidente da LAECE, o Grêmio do Liceu de Humanidades de Campos, em 1968, graças ao estímulo da Profa. Arlete Sendra, uma das nossas maiores intelectuais. Continuei minha formação política no Diretório Acadêmico do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da UFRJ, ocupando a Diretoria entre 1975 e 1978, quando me formei. A queda da Ditadura e o retorno da Democracia devem muito à Balbúrdia Universitária. No Norte Fluminense, nós, da galera da balbúrdia universitária, vimos construindo, há décadas, um imenso e eficiente Complexo de Ensino Superior, nacionalmente destacado.
Deixem a Universidade em paz! Viva a balbúrdia universitária!
José Luis Vianna da Cruz – da Balbúrdia Universitária

Doutor em Planejamento Urbano e Regional (UFRJ) e Professor Colaborador da UFF/Campos dos Goytacazes.

domingo, 7 de abril de 2019

A UENF continua sendo asfixiada financeiramente no governo Witzel. Até quando resistirá?


Publicado originalmente no Blog do Pedlowski (aqui).

A UENF continua sendo asfixiada financeiramente no governo Witzel. Até quando resistirá?

Por Marcos Antonio Pedlowski *

A visita da Comissão de Ciência e Tecnologia da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (ALERJ) ao campus da Universidade Estadual do Norte Fluminense (UENF) na última sexta-feira (05/04) serviu para que seu presidente, o deputado estadual Waldeck Carneiro (PT), testemunhasse os efeitos devastadores da contínua falta de verbas de custeio que a instituição continua sofrendo quase 4 meses após o início do governo Witzel. 

É que, apesar da aprovação da chamada PEC 47 em dezembro de 2017, a UENF continua ainda sem receber suas verbas de custeio, o que implica na incapacidade de honrar compromissos com seus fornecedores, a começar pelos serviços essenciais de água, eletricidade, limpeza e segurança. A inexistência de verbas de custeio está inviabilizando o funcionamento de equipamentos de variados usos para as atividades essenciais dentro da UENF e ameaça ainda a paralisação completa das atividades que ocorrem diariamente dentro da instituição, incluindo importantes pesquisas que poderiam e deveriam ser prioridade para o novo governador, mas aparente e estranhamente não o são.

A falta de verbas de custeio causa ainda a repetição de um esquema pernicioso onde os professores e servidores acabam tendo que usar seus próprios salários para impedir que a UENF chegue a um estado de completa insolvência. À guisa de exemplo pessoal, apenas na semana passada, usei recursos pessoais advindos da minha única fonte de renda, que é o meu salário, para consertar dois equipamentos de estabilização de corrente elétrica que haviam queimado. A isso se soma a colocação de uma nova porta da sala em que meu grupo de pesquisas procura continuar exercendo suas atividades. Mas também já compro há vários anos a água consumida e os produtos de limpeza que são usados na sala que ocupo. Em todos esses casos, a decisão era a de deixar ficar quebrado e sujo ou gastar dinheiro próprio para manter as coisas funcionando dentro de um ambiente de trabalho decente.  Acabei optando por usar meu salário para fazer o “show continuar”. Entretanto, fico pensando até quando poderei continuar cometendo este tipo de “luxo”, na medida em que meus salários estão sem correção desde 2014, apesar do Regime de Recuperação Fiscal assinado pelo (des) governador Pezão indicar a possibilidade da reposição das perdas inflacionárias anuais.

Para agravar a situação, a base partidária do governo Witzel está tentando levar à frente uma indecorosa Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que, sob a desculpa esfarrapada de apurar desvios ideológicos nas universidades estaduais, busca instaurar um clima de terror persecutório em ambientes onde deveria predominar a autonomia universitária.  Aliás, falando em autonomia, o próprio governador Witzel está dando sua contribuição para interferir na vida das universidades ao enviar, na calada da noite, um projeto de lei que visa interferir na escolha dos reitores das universidades, indo de encontro ao que está estabelecido na Constituição Estadual. Em outras palavras, além da asfixia financeira, as universidades estaduais do Rio de Janeiro estão convivendo com um clima de perseguição política e tentativas de subordinação política por parte do governo do estado.

A situação da UENF é um capítulo à parte para mim, pois vejo todos os dias os esforços que são realizados para gerar conhecimento científico de excelência em seus vários centros de pesquisa. Ao longo de pouco mais de um quarto de século, a UENF já desenvolveu muita coisa interessante, a começar por sementes adaptadas ao clima regional. Além disso, há, entre seus professores e estudantes, pessoal altamente qualificado e que tem contribuído para que a universidade seja reconhecida dentro e fora do Brasil como uma experiência de sucesso na formação de recursos humanos qualificados.

Diz-se que o governador Wilson Witzel já expressou pretensões de ser candidato nas eleições presidenciais de 2022 e que, para isso, irá tentar se diferenciar do presidente Jair Bolsonaro. Pois bem, uma boa área para ele se diferenciar é exatamente a da ciência e tecnologia, onde o governo federal vem cortando verbas a passos largos e ameaçando destruir o antes emergente sistema nacional de ciência e tecnologia. Para tanto, o governador Witzel deveria priorizar as universidades estaduais que, apesar de todo o ataque sofrido durante os anos de Sérgio Cabral e Luís Fernando Pezão, continuam sendo classificadas entre as melhores do Brasil e da América Latina. E, tomando a UENF como exemplo, nem precisa gastar fortunas para que o resultado apareça, apenas que libere o mirrado orçamento aprovado pela ALERJ para o ano de 2019. Aliás, há que se frisar que a UENF não está pedindo muito, apenas que se cumpra pelo menos o orçamento a que tem direito.

A decisão com que o governador Wilson Witzel está defrontado é muito simples: vai investir nas universidades e em nosso sistema estadual de ciência e tecnologia ou vai continuar o ataque impiedoso que foi começado por Sérgio Cabral e Pezão? Da resposta que for dada pelo governador, dependem não apenas as universidades e institutos de pesquisa, mas a possibilidade de um futuro menos sofrível para o povo do Rio de Janeiro. É que a coisa é muito simples: para sair do atoleiro em que nos encontramos, será fundamental superar o atraso tecnológico em que a economia fluminense está imersa. Para superar essa atraso, a receita é simples e direta: investir em desenvolvimento científico.

* Geógrafo; Professor associado ao Laboratório de Estudos do Espaço Antrópico (LEEA) da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (UENF); Pesquisador/colaborador externo do Centro de Ecologia, Evolução e Alterações Ambientais da Universidade de Lisboa.

terça-feira, 12 de março de 2019

Composição do orçamento federal e outras histórias que as tias do WhatsApp não te contam sobre a Previdência...

Composição do orçamento federal e outras histórias que as tias do WhatsApp não te contam sobre a Previdência...

Por Paulo Sérgio Ribeiro

Se há um assunto indigesto para estudantes de Administração, de Direito e de Economia, verdadeiro terror dos concursandos de todo o Brasil, este atende pelo nome de Administração Financeira e Orçamentária, vulgo “AFO”. A esta altura, imaginamos que os(as) leitores(as) já tenham fugido. Relevemos. Aquilo que nos pede motivação nem sempre é o que nos faz ver o mundo mais colorido... 

Sendo assim, tentemos uma abordagem que não nos faça envelhecer dez anos sob o jargão do “burocratês” ou do “economês”.

Poderíamos nos contentar com a ilustração acima, que trata da execução orçamentária do Governo Federal no ano de 2018. Mas como o diabo mora nos detalhes, visitemos inicialmente aquele texto que já teve os seus dias de glória e que anda hoje entregue à poeira do tempo: a Constituição Federal de 1988. Qual pista nossa “Lei Maior” oferece sobre administração financeira e orçamentária? 

De substancial, que temos não um, mas três orçamentos anuais: orçamento fiscal, orçamento da seguridade social e orçamento de investimento das empresas em que a União, direta ou indiretamente, detenha a maioria do capital social com direito a voto. Tais orçamentos integram o dito “orçamento federal”, uma expressão usual para a Lei Orçamentária Anual (LOA). 

Em tese, a Previdência Social, uma peça do orçamento da seguridade social, articula-se com os demais orçamentos na LOA sem prejuízo dos fundamentos constitucionais que lhe são próprios, especialmente o princípio da solidariedade entre gerações que já tivemos oportunidade de debater em texto anterior (aqui). Essa autonomia do nosso sistema de proteção social é assegurada por suas múltiplas fontes de custeio, notadamente nos regimes públicos da Previdência Social.

Porém, na prática a teoria é bem outra, considerando toda a sorte de mistificação neste Cavalo de Tróia que a gestão Bolsonaro/Guedes quer fazer passar com a Reforma da Previdência. “Que prática é esta?”, indagariam os(as) nossos(as) valentes três leitores(as) que chegaram até aqui. Nada mais do que confundir orçamento fiscal com orçamento da seguridade social, sobrepondo o primeiro ao segundo.  

Ora, não é esta a tônica de quem defende a reforma previdenciária desde o ilegítimo governo de Michel Temer? Avacalhar o debate previdenciário animando a torcida com o bumbo midiático em torno do “rombo na Previdência”. 

Onde mora o busílis? Na concepção do que venha a ser déficit previdenciário. Replicar qual se fosse uma criança na 9ª série ou o presidente no Twitter que déficit é a situação na qual despesas superam receitas ("tá ok?") diz tudo e não resolve nada.

“Credo em cruz! Tripudiaram da lógica!”, suspeita o(a) leitor(a) sobrevivente.

Ora, bastaria olharmos a “pizza” lá em cima para confirmar a lógica das coisas no alerta certeiro do economista Eduardo Fagnani[1]: enquanto algumas poucas milhares de famílias beneficiam-se da grossa fatia do produto interno bruto (PIB) absorvida pelo pagamento de juros e serviços da dívida - despesas financeiras (ou “gastos secundários” para os fluentes em economês...) que ultrapassam 40% do orçamento federal e são mantidas intocáveis pela Emenda Constitucional nº 95, que congelou os gastos sociais por 20 anos[2] -, trabalhadores(as) e empregadores(as) contribuem o equivalente a 7,5% do PIB com despesas previdenciárias - quase 25% do orçamento - cujos beneficiários(as) diretos(as) e indiretos(as) somam 80 milhões de brasileiros(as). 

Diante deste colossal conflito distributivo, criam-se questões artificiais. Sem delongas, falemos o óbvio: são artificiais porque tal “rombo” inexiste. O governo de Jair Bolsonaro, em linha com o governo golpista que o antecedeu e sob beneplácito dos jornalões, faz tábula rasa do que aquele texto que anda fora de moda – a Constituição de 88 – diz a respeito do custeio da Previdência Social.

É simplesmente inconstitucional fazer crer que o custeio da Previdência Social esteja desvinculado do orçamento da seguridade social, o qual é gerido conforme o modelo tripartite de financiamento: Governo, empresas e trabalhadores. Essa tríplice forma de custeio viabiliza o Regime Geral da Previdência Social (RGPS), responsável pelos benefícios e serviços previdenciários da massa dos(as) trabalhadores(as) abrangidos pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

Afinal de contas, qual é a cretinice aqui? Nada mais que um blefe contábil: omitir, nas narrativas sobre a Previdência Social, as obrigações constitucionais do Governo Federal com o custeio da Seguridade Social. A participação do Estado brasileiro no orçamento da seguridade social ocorre mediante recolhimento de tributos específicos (COFINS, CSLL entre outros) cuja arrecadação tem sido desviada de sua finalidade original para cobrir despesas financeiras. Para Maria Lúcia Fatorelli, coordenadora da Auditoria Cidadã da Dívida, o nó górdio da questão tributária no Brasil é camuflado com doses cavalares de desonestidade intelectual [3]:

O rombo das contas públicas não está nem nunca esteve na Previdência Social. O rombo das contas públicas está é no sistema da dívida pública. 

Ora, malgrado se mantenham a Desvinculação das Receitas da União (DRU) – retirada de recursos da Previdência Social para outros fins – e as recorrentes isenções a determinados setores econômicos no âmbito das contribuições previdenciárias –, pasme, em plena crise de arrecadação com a galopante informalização das relações de trabalho que jaz no desemprego e subemprego massivos –, ainda assim a Seguridade Social apresenta-se superavitária.

A Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (ANFIP) é cristalina na desconstrução que faz do blá blá blá sobre o “rombo” na Previdência Social, ao expor o saldo positivo no balanço entre receitas e despesas seguindo estritamente o que diz a Constituição Federal acerca do orçamento da seguridade social[4]:

Desde a aprovação da Constituição até 2015 (inclusive) o superávit de recursos na Seguridade Social tem sido impressionante, conforme dados oficiais anualmente segregados pela Anfip. A sobra de recursos foi, por exemplo, de R$72,7 bilhões em 2005; R$ 53,9 bilhões em 2010; R$ 76,1 bilhões em 2011; R$ 82,8 bilhões em 2012; R$ 76,4 bilhões em 2013; R$ 55,7 bilhões em 2014; e R$11,7 bilhões em 2015.

A inversão ideológica no debate previdenciário, reiteramos, é tomar a Seguridade Social por mero apêndice do orçamento fiscal. 

Sob o mantra do "controle dos gastos", cresce a falácia de que o orçamento da seguridade social tenha de estar a reboque de uma política econômica comprometida com o interesse privado dos(as) que vivem de rendas com a rolagem da dívida pública. Trocando em miúdos: bancos e demais agentes do mercado financeiro. Política essa que, reeditando o ideário neoliberal, mostrou-se, em diferentes cenários nacionais, incapaz de balizar qualquer resposta coerente à crise da arrecadação e ao desemprego estrutural. 

Ao(à) leitor(a) que chegou até aqui (ufa!), pedimos um último esforço: olhe novamente para a "pizza" lá em cima.

E aí, você que não é o Paulo Guedes, o Luciano Huck nem a "tia do WhatsApp" (que queria porque queria chamar o Huck de genro...)? Saciado(a) com a fatia que te sobrou?