Modus operandi
temerário*
George
Gomes Coutinho **
Ao acompanhar o trâmite do que o
governo Temer, entusiastas e parte considerável da grande mídia e empresariado
chamam de “reforma” trabalhista, o que na verdade implica na transfiguração de
uma CLT jamais plenamente implantada, podemos notar uma regularidade no
processo político. Há um modus operandi verdadeiramente temerário que fere de
maneira ainda mais grave a já combalida saúde da democracia brasileira.
Até o presente momento na
audaciosa agenda do governo Temer foram apresentados os seguintes pontos
vitoriosos do governo: 1) a “reforma” do ensino médio; 2) a chamada “PEC dos
gastos” (onde investimentos e gastos espantosamente tornaram-se sinônimos); 3)
a aprovação na última quarta-feira da “reforma” trabalhista na Câmara dos
Deputados. Decerto eu poderia listar outras vitórias do governo e derrotas de
diversos grupos da sociedade. Mas, irei me centrar no que chamam de “reformas”.
O(a) leitor(a) certamente notou que
utilizo o termo “reformas” entre aspas. Na verdade considero o substantivo
feminino “reforma” nesse contexto um eufemismo. Em última instância as
propostas aprovadas e a vindoura “reforma” da previdência mudam a configuração
das relações entre Estado, mercado e sociedade de maneira profunda no Brasil.
Justamente por isso o tratamento deveria ser outro.
Até o momento temos um presidente
da Câmara organicamente alinhado e hábil ao utilizar manobras regimentais
derivando em uma rotina legislativa rápida e aflitiva. Em anexo, setores não
alinhados com as propostas são politicamente desconsiderados, o que empobrece o
debate e a qualificação das “reformas”. Em meio a tudo isso parte substantiva
da grande imprensa ignora qualquer contraponto gerando um samba de uma nota só
na arena pública brasileira, algo que só é parcialmente quebrado por mídias
mais pluralistas ou alternativas e de menor alcance de audiência. Aos críticos
das “reformas” ainda pesa a desqualificação por serem a priori “petistas”, a
despeito de muitos não terem qualquer afinidade com o PT. Tudo indica que o
modus operandi se repetirá na questão previdenciária e a ambiência
anti-democrática prossegue.
* Texto publicado no jornal Folha da Manhã em 29 de abril de 2017
** Professor de Ciência Política no
Departamento de Ciências Sociais da UFF/Campos dos Goytacazes