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segunda-feira, 5 de março de 2018

Manifesto sobre a intervenção federal e militar no Rio de Janeiro

Defensores de Direitos Humanos e comunidade acadêmica pelo direito de defender a Democracia
A Comunidade Acadêmica, entidades e personalidades dedicadas à defesa da democracia e dos direitos humanos vêm a público expressar séria preocupação com a decretação de intervenção federal no estado do Rio de Janeiro, medida que indica a opção pela lógica militar para enfrentar os importantes problemas de segurança pública, com consequências sumamente graves para a população que vive nos territórios com maior incidência de violência.
As Forças Armadas, como demonstram experiências anteriores, não são resposta adequada aos problemas de violência interna. Tanto pela forma apressada e espetaculosa, quanto pelo conteúdo impreciso e alheio aos estudos realizados por instituições conhecedoras dos problemas de segurança do estado, o decreto atual não se coaduna com as práticas do Estado Democrático de Direito e a necessária participação e opinião daqueles que serão diretamente afetados, abrindo um precedente inédito, desde a redemocratização, de intervenção militar sobre o poder de gestão civil e social.
No contexto da grave crise política, econômica e institucional que vive o país e ameaça a nossa soberania, as manifestações de autoridades civis e militares reivindicando amplos poderes e salvo-conduto para o exercício ilimitado da violência pelas forças de intervenção contra suspeitos provocam perplexidade e nosso absoluto repúdio.
Recordamos que, em democracia, mesmo quando um Estado atua para conter situações emergenciais de violência, há princípios que jamais podem ser revogados, como o são o direito à vida e à dignidade, a proibição da tortura e de toda forma de discriminação, o respeito à legalidade e à irretroatividade da lei penal e o direito do cidadão de ser julgado por um tribunal imparcial e independente. 
Reafirmando o papel constitucional das Forças Armadas na defesa do Estado brasileiro, somos conscientes e solidários às demandas por estrutura e recursos para que bem possam desempenhar sua missão e, como sociedade civil e acadêmica, estamos preparados para colaborar em iniciativas democráticas, observatórios e medidores, visando a um projeto estável de segurança pública, cidadania e inclusão para o futuro da sociedade fluminense. 
Em consórcio com as demais entidades democráticas, seguiremos monitorando as ações decorrentes da intervenção, objetivando garantir os direitos civis, políticos e sociais da população do estado do Rio de Janeiro, com pleno respeito aos direitos da pessoa humana, sempre com o objetivo de fortalecer os fundamentos da democracia no Brasil.
Fonte: Change.org
Acessível em:
https://www.change.org/p/presid%C3%AAncia-da-rep%C3%BAblica-manifesto-sobre-a-interven%C3%A7%C3%A3o-federal-e-militar-no-rio-de-janeiro

sábado, 24 de fevereiro de 2018

Intervenção para quem precisa

Intervenção para quem precisa*

George Gomes Coutinho **

Os dias imediatamente após as comemorações carnavalescas trouxeram para a população brasileira em geral, e a fluminense em particular, o inusitado. No dia 16/02 o anúncio intempestivo de uma Intervenção Federal pegou muita gente de calças curtas. Desconfio que até mesmo os policy makers fluminenses se viram em igual condição.

Afinal, que cazzo quer o Governo Federal na atual conjuntura? A medida foi recebida com críticas e ceticismo por uma enorme gama de pesquisadores. Cabe ressaltar o ineditismo da situação: nunca antes na História do Brasil redemocratizado assistimos algo assim. Não se trata, portanto,  de medida insignificante. É dotada de inegável excepcionalidade e implica o reconhecimento de que algo vai muito mal com as nossas instituições, a despeito da cantilena que apregoa o oposto desde 2016. Isso não desconsiderando a medida ser respaldada pela Constituição Federal de 1988. Para além disso, por qual razão seria o Rio o objeto da Intervenção? Justamente o estado da federação que não se encontra na pior situação em termos de violência urbana, não obstante a reconhecida tragicidade de sua condição estrutural.

Ainda, cabe perguntarmos se era esse o encaminhamento mais adequado, afinal a intervenção retira a autonomia decisória do estado no que tange a segurança pública. Isso é grave. Está se afirmando que o estado tornou-se incapaz de gerir este setor. Mas, seria só esse? É falta de expertise mesmo? A segurança pública é o maior e mais grave problema do Rio de Janeiro nesse momento? Oras, e as outras áreas fundamentais de atendimento da população? O problema é de gestão ou seriam opções suicidas de contigenciamento orçamentário que provocaram o atual cenário? No rastro das perguntas inconvenientes: como estabelecem um prazo, um limite temporal para a intervenção, sem terem delimitado objetivos claros?

Muitas dúvidas diante de tema tão espinhoso. E uma única certeza para o momento. A mudança de pauta na opinião pública. A segurança pública do Rio tornou-se, mais uma vez, o “assunto do momento” em ano eleitoral. Conseguiram o intento após a Reforma Previdenciária ter subido no telhado. A jogada é maquiavélica se foi para mera mudança de direcionamento dos holofotes.

* Texto publicado em 24 de fevereiro de 2018 no jornal Folha da Manhã de Campos dos Goytacazes, RJ.


** Professor de Ciência Política no Departamento de Ciências Sociais da UFF/Campos dos Goytacazes