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quinta-feira, 1 de novembro de 2018
domingo, 7 de outubro de 2018
Policiais Federais em defesa do Estado Democrático de Direito
Por Paulo Sérgio Ribeiro
Dos tantos manifestos públicos produzidos por categorias profissionais relevantes para a sociedade brasileira, um, em especial, causou-me admirável surpresa. Trata-se do manifesto de policiais federais em defesa da legalidade democrática no país.
Como esse manifestou chegou-me às mãos?
Prestei serviço à Secretária Nacional de Segurança Pública (SENASP), órgão subordinado ao Ministério da Justiça, entre os anos de 2010 e 2014. Minha lotação de ofício era Brasília-DF, mas minha lotação funcional fora o Estado de Alagoas. Neste, por meio de um acordo de cooperação técnica entre o Ministério da Justiça e a Polícia Federal, nós, assessores em ciências sociais do Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (PRONASCI), tivemos ao nosso dispor uma sala na Superintendência Regional da Polícia Federal, sediada na capital alagoana, Maceió.
Foram tempos de valioso aprendizado profissional como sociólogo em um dos setores mais áridos da política nacional: segurança pública. Não menos, uma experiência quase etnográfica junto àqueles homens e mulheres investidos de um poder estatal cujo exercício caracteriza a real medida do quão próximo (ou distante) estamos de viver em uma ordem política na qual indagar "quem controla os controladores?" se coaduna com uma cultura legal que sedimente a proteção contra o arbítrio de qualquer natureza.
Lá fiz amigos cujo vínculo mantive e com os quais compartilho preocupações sobre a crise institucional deflagrada com o golpe parlamentar de 2016 e agravada com a ascensão do fascismo enquanto gramática política que inviabiliza a solução negociada dos graves impasses aos quais esquerda e direita estão submetidas e, sobremaneira, fomenta um estado de anomia nas relações sociais que contrapõe pessoas de modo cada vez mais violento e irracional.
O amigo policial que repassou o texto do manifesto (ver abaixo) relatou-me que seus autores são minoria na instituição e, assim sendo, julgam por bem não exibir seus nomes na ampla divulgação que desejam para o mesmo, para evitar represálias. Longe de mim tecer um julgamento sobre essa cautela em tempos pra lá de bicudos. O ingresso desses homens e mulheres na carreira policial ocorre sob rigoroso processo seletivo e, desde o primeiro dia de sua etapa de formação na Academia Nacional de Polícia (ANP), recai sobre seus ombros o peso esmagador do "efeito instituição", isto é, a socialização organizacional na qual o balanço entre recompensas e punições resulta, quase sempre, na dissociação entre o significado da função pública que assumirão e a autonomia de pensamento diante dos dilemas éticos que lhe são inerentes. Noutros termos, na aceitação complacente do status quo.
De 2016 para cá, os policiais federais, salvo honrosas exceções, foram tragados pelo "novo normal jurídico" inaugurado pela Operação Lava Jato, levando-os a subestimar a instrumentalização política de sua atividade-fim ou, pior, a regozijar-se dela em razão de preferências partidárias que não fazem mais questão sequer de disfarçar no curso de investigações criminais, promovendo, pois, uma perigosa perda de credibilidade de um órgão do Poder Executivo Federal cuja missão institucional integra o rol dos interesses estratégicos do Estado brasileiro. Por tudo isso, saúdo os policiais federais que, reivindicando um papel civilizador para a polícia, reiteram o compromisso republicano para com seus concidadãos e entendem ser o silêncio cúmplice o pior escudo diante da ofensiva conservadora que desafia nossa soberania popular.
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MANIFESTO DE POLICIAIS FEDERAIS PELA LEGALIDADE E DEMOCRACIA
O movimento denominado “Brasil
Legal & Democrático”, sem vinculação partidária e formado por policiais
federais de todo o Brasil, vem manifestar seu compromisso inalienável com a
democracia, o respeito aos direitos humanos e a sua responsabilidade com a luta
pela construção de uma sociedade livre, justa, plural e solidária.
Repudiamos todo e qualquer
discurso de cunho fascista, de incentivo ao ódio, preconceito, intolerância e
discriminação, assim como a apologia à tortura ou à execução de infratores. Propostas
superficiais e inexequíveis manipulam o senso comum e o compreensível
sentimento de medo, impotência e desesperança da população brasileira, frente
ao assustador crescimento dos índices de violência e criminalidade, da
corrupção, aliada à falência do nosso modelo de investigação criminal, bem como
do nosso sistema político de forma geral.
Esse discurso fácil e
irresponsável tem acirrado o sentimento de divisão e plantado uma perigosa
semente de autoritarismo, minando a possibilidade de diálogo e os fundamentos
da sociedade brasileira.
Não passam de populismo e de
oportunismo eleitoral, com consequências imprevisíveis para a democracia e o
bem estar social, as promessas de repressão à criminalidade que afrontem o
Estado Democrático de Direito, os princípios legais e os direitos humanos. Também
são de discutível eficácia para redução da criminalidade propostas de
enfrentamento da violência que pregam o uso de mais violência, assim como o
armamento indiscriminado da população civil.
Dar “carta branca” para que
polícias matem mais, definitivamente, não é a solução para redução de
homicídios e outros crimes violentos. Infelizmente, os policiais brasileiros já
são os que mais matam e também os que mais morrem no mundo, de acordo com dados
recentes, divulgados pelo Anuário Brasileiro de Segurança Pública.
As estratégias para a diminuição
dos números da violência e a melhoria dos índices de resolução criminal devem
ser baseadas em critérios técnicos e científicos, com absoluto respeito aos
direitos humanos e ao Estado Democrático de Direito. Aliás, a defesa dos
direitos humanos e dos princípios legais consta da galeria de valores e,
inclusive, está presente no hino da nossa Polícia Federal.
Os programas de governo da
maioria dos presidenciáveis, além de outras ações fundamentais para a reversão
do atual quadro de insegurança pública, omitem a necessidade de profundas
reformas democratizantes das instituições policiais, que há anos vêm sendo
defendidas por diversos atores sociais, dentre estudiosos e os próprios
policiais brasileiros. As principais propostas são de adoção de carreira única,
do ciclo completo e da desmilitarização das instituições policiais. As relações
hierárquicas e o ambiente interno das polícias precisam ser pacificados e
democratizados, assim como de resto a sociedade brasileira.
Finalmente, defendemos que os
órgãos de controle externo e a Polícia Federal sejam constantemente
aperfeiçoados e orientados por princípios republicanos, para que ações contra a
corrupção não se transformem em instrumento de perseguição política ou
exposição midiática de pessoas investigadas. Sobretudo, que essas instituições
respeitem integralmente os princípios constitucionais de cidadania, dignidade
da pessoa humana, pluralismo e direitos humanos, que protegem não apenas os
cidadãos, mas também os profissionais de segurança pública, não só da Polícia
Federal, que frequentemente têm seus direitos afrontados pelo arbítrio e autoritarismo,
que ainda persistem nas instituições policiais brasileiras.
Movimento Brasil
Legal & Democrático
quarta-feira, 3 de outubro de 2018
quinta-feira, 7 de dezembro de 2017
Manifesto em defesa do Estado de Direito e da Universidade Pública no Brasil
Nós, intelectuais, professores, estudantes e dirigentes de instituições acadêmicas, vimos a público manifestar nossa perplexidade e nosso mais veemente protesto contra as ações judiciais e policiais realizadas contra a universidade pública que culminaram na invasão do campus da UFMG e na condução coercitiva de reitores, dirigentes e administradores dessa universidade pela Polícia Federal no dia 6 de dezembro de 2017.
O Brasil, nos últimos anos, vivencia a construção de elementos de exceção legal justificados pela necessidade de realizar o combate à corrupção. Prisões preventivas injustificáveis, conduções coercitivas ao arrepio do código penal tem se tornado rotina no país.
Neste momento amplia-se a excepcionalidade das operações policiais no sentido de negar o devido processo legal em todas as investigações relativas à corrupção violando-se diversos artigos da Constituição inclusive aquele que garante a autonomia da universidade.
É inadmissível que a sociedade brasileira continue tolerando a ruptura da tradição legal construída a duras penas a partir da democratização brasileira em nome de um moralismo espetacular que busca, via ancoragem midiática, o julgamento rápido, precário e realizado unicamente no campo da opinião pública.
Nos últimos meses, essas ações passaram a ter como alvo a universidade pública brasileira. Cabe lembrar aqui que a universidade pública, diferentemente de muitas das instâncias do sistema político, está submetida ao controle da CGU e do TCU, respeita todas as normas legais e todos os princípios da contabilidade pública em suas atividades e procedimentos. Portanto, não existe nenhum motivo pelo qual devam se estender a ela as ações espetaculares de combate à corrupção.
A universidade pública brasileira tem dado contribuições decisivas para o desenvolvimento da educação superior, da pós-graduação, da ciência e tecnologia que colocaram o Brasil no mapa dos países em desenvolvimento. Somente universidades públicas brasileiras estão entre as 20 melhores instituições de ensino e pesquisa da América Latina, de acordo com o Times Higher Education Ranking. A UFMG, sempre bem colocada nesses rankings internacionais, possui 33.000 alunos de graduação, 14.000 alunos de pós-graduação, conta com 75 cursos de graduação, 77 cursos de mestrado e 63 cursos de doutorado. Além de sua excelência em educação e pesquisa, a UFMG se destaca por suas ações de assistência e extensão nas áreas de saúde e educação.
Nesse sentido, intelectuais e membros da comunidade universitária exigem que seus dirigentes sejam respeitados e tratados com dignidade e que quaisquer investigações que se mostrarem necessárias com relação a atividades desenvolvidas na universidade sejam conduzidas de acordo com os princípios da justiça e da legalidade supostamente em vigência no país e não com o objetivo da espetacularização de ações policiais de combate à corrupção. Está se constituindo uma máquina repressiva insidiosa, visando não só coagir, mas intimidar e calar as vozes divergentes sob o pretexto de combater a corrupção. Seu verdadeiro alvo, porém, não é corrupção, mas o amordaçamento da sociedade, especialmente das instituições que, pela própria natureza de seu fazer, sempre se destacaram por examinar criticamente a vida nacional.
Não por acaso o alvo dessa violência contra a universidade e seus dirigentes foi exatamente um memorial que tenta recompor os princípios da justiça e do estado de direito extensamente violados durante o período autoritário que se seguiu ao golpe militar de 1964. O Memorial da Anistia tem como objetivo explicitar os abusos autoritários perpetrados nesses anos de exceção porque apenas a sua divulgação permitirá que as gerações futuras não repitam o mesmo erro.
Nesse sentido, intelectuais, professores e estudantes conclamamos todos os democratas desse país a repudiarem esse ato de agressão à justiça, à universidade pública, ao estado de direito e à memória desse país.
Paulo Sérgio Pinheiro (ex ministro da secretaria de estado de direitos humanos)
Boaventura de Sousa Santos (professor catedrático da Universidade de Coimbra)
André Singer (professor titular de ciência política usp e ex-secretário de imprensa da presidência)
Ennio Candotti (ex-presidente e presidente de honra da SBPC)
Newton Bignotto (professor do Departamento de Filosofia da UFMG)
Leonardo Avritzer (ex-presidente da Associação Brasileira de Ciência Política)
Fabiano Guilherme dos Santos (presidente da ANPOCS)
Maria Victória Benevides (professora titular da Faculdade de Educação da USP)
Roberto Schwarz (professor titular de Literatura da Unicamp)
Renato Perissinoto (presidente Associação Brasileira de Ciência Política)
Fábio Wanderley Reis. (Professor Emérito da UFMG)
Cícero Araújo (Professor do Departamento de Ciência Política da USP)
Sérgio Cardoso (Professor do Departamento de Filosofia da USP)
Marilena de Souza Chauí (Professora titular do Departamento de Filosofia da USP)
Fábio Konder Comparato (Professor Emérito da Faculdade de Direito da USP)
Ângela Alonso (professora do Departamento de Sociologia da USP)
Juarez Guimarães (professor do Departamento de Ciência Política da UFMG)
Michel Löwy. (Pesquisador do CNRS, França)
Adauto Novaes (Arte e Pensamento)
Maria Rita Kehl (psicanalista)
Thomás Bustamante (Professor da Faculdade de Direito da UFMG)
Lilia Moritz Schwarcz (Professora do Departamento de Antropologia da USP)
Gabriel Cohn (ex-diretor da Faculdade de Filosofia da USP)
Marcelo Cattoni (professor da Faculdade de Direito da UFMG)
Amélia Cohn (professora do Departamento de Medicina Preventiva da USP)
Dulce Pandolfi (Historiadores pela Democracia)
Bruno Pinheiro Reis (Vice-diretor e professor do Departamento de Ciência Política da UFMG)
Oscar Vilhena Vieira (Diretor e professor da Faculdade de Direito da FGV-SP)
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