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terça-feira, 21 de junho de 2022

A vitória da esquerda na Colômbia - Milton Lahuerta

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A vitória da esquerda na Colômbia **

Milton Lahuerta***


Gustavo Petro e Francia Marquez, o presidente e a vice-presidente, que acabaram de ser eleitos na Colômbia, realizaram um feito histórico, já que esta é a primeira vez que a esquerda conquista o governo do país. Ex-guerrilheiro do M 19, Petro, com bastante experiência na política institucional, e Francia Marquez, uma mulher negra de origem popular, que se especializou em direito ambiental, disputaram as eleições com um discurso de pacificação e de construção de consensos democráticos. De certo modo, isso que poderia soar estranho é explicável, pois a história da Colômbia, ainda que conhecida por sua extrema violência política, tem sido marcada nas últimas décadas pela busca do entendimento entre as forças políticas que atuam no país. 

Historicamente, mesmo que o país não tenha tido experiências ditatoriais, a não ser por um breve período, desde o assassinato de Gaetán na década de 1950, a sociedade colombiana vivenciou momentos de extrema dramaticidade política e policial, com grupos armados -- à esquerda e à direita -- se combatendo e com essa guerra sendo amplificada pela eclosão e pela potência do narcotráfico a partir dos anos 1970. 

Nas duas últimas décadas, a esquerda colombiana de origem guerrilheira vem dando mostras sistemáticas de sua decisão de se integrar à institucionalidade política democrática, entregando as armas, disputando eleições e se apresentando como alternativa de governo. A vitória de Petro é, portanto, o resultado de uma longa caminhada e, a despeito do terrorismo digital da extrema direita que o apresenta como um perigoso subversivo, o mais provável é que ele busque governar implementando um programa econômico moderado e sustentável, ainda que socialmente orientado. O apoio dado à chapa por economistas como José Antonio Ocampo, ex-diretor geral da CEPAL, e Rudolph Hommes, ex-Ministro da Fazenda de Gaviria, à época da Constituinte e da abertura política, é um forte indício de que isso deverá ocorrer.


* Disponível em: https://www.newframe.com/cartoon-a-bit-more-red/, acessso em 21 de jun. de 2022.


** Publicado originalmente no perfil do autor no Facebook (https://www.facebook.com/milton.lahuerta) em 19 de jun. de 2022. Reproduzimos aqui com a autorização do próprio Milton.


*** Milton Lahuerta é professor de Teoria Política na Faculdade de Ciências e Letras da Universidade Estadual Paulista, Campus de Araraquara. É autor de inúmeros artigos, capítulos de livros e coletâneas nas áreas de pensamento social brasileiro, sociologia dos intelectuais e teoria política. Publicou, em 2014, o seu "Elitismo, autonomia, populismo - Os intelectuais na transição dos anos 1940" pela editora Andreato.

sexta-feira, 8 de outubro de 2021

Por uma teoria sociológica sistêmica e pós-colonial da América Latina


Por uma teoria sociológica sistêmica e pós-colonial da América Latina* 

* Publicado originalmente em Scielo.br 

O estudo “Por uma Sociologia Sistêmica Pós-Colonial da América Latina” propõe uma teoria sociológica sistêmica pós-colonial para analisar a América Latina enquanto região da sociedade mundial moderna. O autor toma a teoria da sociedade de Niklas Luhmann como ponto de partida para este esforço de construção teórica, que consiste em combinar a análise da unidade da sociedade mundial com a consideração das diferenças e variedades regionais construídas em seu interior. Para alcançar este objetivo o estudo identifica e propõe solução para um problema fundamental na teoria da diferenciação funcional da sociedade formulada por Luhmann: Sua descrição da transição à sociedade moderna enxerga somente um processo de diferenciação funcional singular e interno à Europa, desconsiderando, como os pós-coloniais costumam dizer, o papel da “diferença colonial” na constituição da transição para a modernidade. Para compreender a globalidade das diferenças regionais, a teoria dos sistemas precisa não apenas investir em estudos sobre a globalização dos sistemas funcionais a partir do século XIX, tendo a Europa como o núcleo difusor dos processos sociais globais, mas sobretudo questionar e revisar sua descrição da própria transição para a sociedade moderna, realizando uma profunda autocrítica.

Por isso, o autor propõe rever a tese da transição à sociedade mundial funcionalmente diferenciada a fim de escapar da narrativa da singularidade ocidental, segundo a qual outras regiões recebem, sempre de fora para dentro, estruturas sociais e semânticas gestadas primeiramente na Europa. A ideia é recontar a história da modernidade, substituindo a narrativa única de uma diferenciação funcional desenvolvida inicialmente no interior da Europa e depois expandida para o resto do mundo por narrativas plurais sobre a experiência de cada contexto “geo-histórico” como parte do desenvolvimento “entrelaçado” e “múltiplo” de sistemas funcionais globais. O diálogo com a crítica “pós-colonial” conduz o autor à tese de que, também na teoria dos sistemas, é necessário reescrever a história do ocidente a partir das relações e diferenças que o constituíram.

O argumento principal é que é possível propor uma recepção da teoria da sociedade mundial de Luhmann que corrija seus componentes eurocêntricos, permitindo construir uma concepção não culturalista e não essencialista da América Latina. Processos e estruturas da regionalização são considerados como variações normais da modernidade global, e esta, por sua vez, enquanto dinâmica societária diferenciada e não estacionária. Nesta recepção crítica da sociologia de Luhmann, a construção da América Latina como regionalização semântica e estrutural deixa de ser vista como desvio, sob o signo da falta, da modernidade plena de outras regiões. A modernidade contemporânea não é identificada com nenhuma região específica do planeta, embora se reconheça a centralidade da Europa em sua emergência. Todas as regiões, assim como outras configurações estruturais, se constroem a partir da modernidade global, na qual estruturas neocoloniais se reproduzem, mas não constituem um sistema unitário como nas relações coloniais do passado pré-moderno, e sim um conjunto de relações centro/periferia fragmentadas pela lógica da diferenciação funcional da sociedade. O unitarismo estrutural característico do colonialismo, com sua relação entre “centro” e “periferia” válida em todas as dimensões, é rompido pela diferenciação funcional, que impõe uma fragmentação da oposição centro/periferia em múltiplas diferenças entre “centros” e “periferias” no interior dos distintos sistemas funcionais.

Para o autor, a diferenciação funcional não apenas fragmenta e rompe com o primado da colonialidade; ela também produz o horizonte e as condições de possibilidade de crítica e transformação semântica e estrutural das assimetrias entre povos, Estados e nações. Ele identifica um deficit de autorreflexão no pós-colonialismo, que pretende fazer uma crítica “externa” da modernidade/colonialidade, como se o horizonte normativo de uma “humanidade compartilhada”, que também orienta em última instância a crítica pós-colonial, não dependesse de uma formação societária na qual a colonialidade não é a forma primária, necessária e naturalizada de constituição de relações e unidades sociais. O ponto central é que a diferenciação funcional da sociedade mundial produz a contingência das estruturas de desigualdade social em toda as suas formas: A referência ao ideal de que “somos todos humanos” é uma fonte conhecida da semântica moderna da inclusão de todas as pessoas nos sistemas funcionais  de uma sociedade pós-tradicional e pós-colonial, na qual diferenças ontológicas entre pessoas, grupos, povos, nações, classes, gêneros, etnias etc. podem ser observadas como construções contingentes e arbitrárias passíveis de transformação.

Para ler o artigo, acesse:

DUTRA, R. Por uma Sociologia Sistêmica Pós-Colonial da América Latina. Dados [online]. 2021, vol.64, no.01 [viewed 28 September 2021]. https://doi.org/10.1590/dados.2021.64.1.229. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0011-52582021000100206&lng=en&nrm=iso

Links externos:

Dados – Revista de Ciências Sociais – DADOS: www.scielo.br/dados

Página Institucional do Periódico: http://dados.iesp.uerj.br/

quarta-feira, 20 de janeiro de 2021

Vanguardas sul-americanas

Fonte: Medium.

Vanguardas sul-americanas

A coragem é a virtude primária e fundante da ação política. Sem ela, não há atividade, não há luta, não há grandeza e não se conquista a glória. A coragem é uma virtude que requer o exercício permanente de sua pedagogia. Caso contrário, ela fenece e morre em um corpo político – Estado, partido ou movimento. (Aldo Fonazieri)



Paulo Sérgio Ribeiro


Vanguarda, palavra que acolhemos em nosso idioma com significado próximo de sua expressão original em francês: aquele que guarda posição avançada (avant-garde) em relação aos acontecimentos, demonstrando originalidade ou pioneirismo na maneira como os traduz e/ou neles intervém. Em sua política interna, Chile e Argentina, nossos vizinhos sul-americanos, se fazem vanguarda ao experimentar processos de mudança social com um potencial transformador, já que as comportas do poder instituído tiveram de abrir-se para dar vazão às energias utópicas que os movem.

Em abril de 2021, 155 constituintes serão eleitos, sendo metade homens e metade mulheres, para reescrever a Carta Magna do Chile, processo que atingiu seu ponto de inflexão com o plebiscito de outubro passado, quando chilenos(as) retomaram sua soberania para dizer, com quase 80% do total de votos, um sonoro “não” à Constituição promulgada pela ditatura de Augusto Pinochet no começo dos anos 1980. Uma vez alcançada a primeira versão do texto constitucional, uma nova consulta popular far-se-á necessária em 2022 para sua aprovação final.

Na Argentina, por sua vez, o Senado aprovou no último 30 de dezembro um projeto que reconhece a legalidade e o acesso ao aborto para mulheres até a 14ª semana de gestação. A despenalização da interrupção voluntária da gravidez foi uma demanda vocalizada por coletivos feministas de modo a ocupar por meses o debate público argentino, a ponto de reverter a corrente de opinião majoritária do seu país, não deixando, pois, alternativa ao Senado senão rever seu veto de dois anos atrás a semelhante projeto de lei.

Em ambos os cenários, um horizonte se avizinha: a equidade de gênero na sociedade política em conjunção com valores políticos recriados pela sociedade civil, na medida em que seus grupos minoritários, até então subalternizados, mostram-se capazes de encontrar uma nova direção na História ao mobilizar recursos próprios para dirigir a si mesmos.  

Na Convenção Constituinte chilena, é bom frisar, há variáveis difíceis de prever ou controlar pelos seus atores políticos, pois, como salienta o sociólogo chileno Esteban Silva, ainda é uma questão em aberto a representatividade de associações e movimentos que emergem de setores sociais à margem da política institucional, bem como dos seus povos originários, haja vista a clivagem manifesta nos votos da capital, Santiago, que opuseram o “não” de suas regiões afluentes ao “sim” de suas periferias à reforma constitucional:



Volviendo à Argentina, as franquias conquistadas por suas cidadãs no âmbito dos direitos reprodutivos ganham ares de efeito-demonstração para povos sul e mesoamericanos bastante díspares no que respeita às lutas contra as opressões que encontram nas relações entre os sexos seu lócus concreto. Enquanto Argentina e Chile caminham a passos largos para devolver às mulheres os corpos que elas habitam, Brasil, Venezuela, Paraguai e Guatemala mantêm restrições legais que as empurram para a clandestinidade dos abortos e, logo, para a subcidadania ratificada pelas chances desiguais de sobreviver a eles.

Ora, alguém indagaria, por que voltar nossa atenção para a conjuntura chilena e a argentina enquanto o Brasil vive o seu pandemônio na pandemia? As respostas seriam muitas e cada uma delas guardaria em si o seu grão de complexidade, mas bem poderia resumir como a oportunidade de, pelas lentes da história comparada, avaliar como realidades nacionais não tão distantes assim do estado de coisas em que imergimos no Brasil podem servir de parâmetro para reencontrarmos a mobilização permanente da sociedade civil, um aggionarmento que não se confunde com o mero reagir às instituições, mas que toma a luta institucional como meio e não um fim em si mesmo, potencializando a revolta popular em torno de diretrizes consequentes para um novo pacto social. 


Chile e Argentina estão dirigindo o seu futuro ao rever o seu passado autoritário. No Brasil, até quando a transição infinita da ditadura civil-militar será um saque irremissível ao nosso futuro?

terça-feira, 18 de junho de 2019

Ctrl+c/Ctrl+v n.4 - Entrevista Emir Sader


Nesta manhã de 18 de junho fui convidado pela equipe do programa Folha no Ar da Radio Folha FM para compor a bancada de entrevistadores do professor Emir Sader que está em Campos para o lançamento de seu “Lula e a esquerda do século XXI”, livro recém lançado de sua autoria pela Editora da UERJ e pelo Laboratório de Políticas Públicas na mesma instituição. Quem desejar adquirir um exemplar por R$30,00 a unidade basta escrever diretamente para o professor: emirsader@uol.com.br

Por conta de um compromisso com a TVT que requisitou o prof. Emir em sua participação no Jornal Brasil Atual ,  acabou que eu concebi uma breve entrevista abordando questões da conjuntura política nacional e local:







Já a entrevista propriamente do prof. Sader onde conversamos sobre Brasil, América Latina, Lula, neoliberalismo e #vazajato está disponível nos vídeos seguintes: