Mostrando postagens com marcador desigualdades sociais. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador desigualdades sociais. Mostrar todas as postagens

terça-feira, 27 de dezembro de 2022

A dor não acolhida dos (meninos)-jogadores da seleção brasileira

*


A dor não acolhida dos (meninos)-jogadores da seleção brasileira

 

Tábata Berg**

 

Quem me conhece, sabe que sou apaixonada por futebol, apesar de ter passado a última década e meia um tanto brochada. E sei que, como tão bem nos ensinou Galeano, futebol e política encontram-se fundamentalmente imbricados. A Copa escancarou várias dessas tessituras. Não vou falar aqui do que tem sido tão debatido no plano do macro, solo pútrido que contamina todas a dimensões do espetáculo, isto é, dos acordos econômicos milionários, da superexploração do trabalho imigrante, da misoginia, homofobia e racismo que estruturam o futebol como uma poderosa instituição capitalista.

Vou me deter a algumas impressões mais subjetivas.

Logo após o primeiro jogo do Brasil, aquele que Neymar saiu machucado e Richarlyson fez uma bela partida com um gol que foi uma obra de arte, eleito pela FIFA como o mais bonito do campeonato, as minhas redes progressistas foram tomadas por publicações sérias e memes que contrapunham esses dois craques da seleção. Ressalto, de antemão, que acho legítimo que Neymar tenha sido responsabilizado por seus posicionamentos políticos. No entanto, incomodou-me profundamente o prazer sádico, típico da branquitude, em rivalizar dois homens negros e periféricos. Expurgar o próprio mal para o outro, nesse caso, Neymar, é uma estratégia colonial, talvez a mais basilar. Sugiro leituras atentas, não apenas proforma, de Lélia Gonzalez, Toni Morisson, Fanon.

Depois foi a vez da carne folheada à ouro. Vi várias postagens de pessoas cujo próprio existir é um impacto ambiental e social, que são partícipes de instituições ainda profundamente excludentes, como é o caso das nossas universidades, apontando o dedo! Novamente... Expurgar o mal é uma delícia, né, meu filho?!

Quando o Brasil perdeu, vieram outras postagens. Dois padrões nessas publicações me são particularmente indigestos.

Em primeiro lugar, aquele que reproduzia a noção de "meninos" do futebol como uma reposição não mediada do machismo, especialmente vinculada à irresponsabilidade afetiva e ao abandono paterno - aspectos amplamente difundidos no caso do jogador Militão. Não pretendo entrar nos entremeios desse caso. Ressalto, o patriarcado, com a consequente reprodução de um padrão de maternidade/paternidade que responsabiliza com uma desigualdade abissal mulheres e homens pelos cuidados de crianças e idosos atravessa as mais distintas posições e condições sociais. Todavia um olhar interseccional e, portanto, mais acurado nos possibilita não perder de vista as singularidades que conformam masculinidades não-hegemônicas. Houve de modo difuso uma certa identificação do caso do Militão com essa meninice tipicamente tupiniquim. Em contraposição há uma paternidade e afetividade responsáveis encarnada no jogador argentino (branco) Lionel Messi. É particularmente interessante, nesse contexto de contraposição, o silenciamento de paternidades ativas como a exercida pelo jogador Neymar Jr. O racismo é estrutural justamente por operar também de modo difuso e silencioso.

 A identificação da tríade ausência parterna, masculinidades negras e periféricas e meninice é profundamente perversa, pois esconde todo o processo histórico no qual o escravismo impossibilitou homens negros de constituirem famílias e estabelecerem vínculos afetivos e familiares duradouros, impossibilidade que foi atualizada no pós-abolição seja pelas políticas de barreiramento (Moura, 1977), seja pelo genocídio aberto empreendido pela República brasileira contra a população negra, em particular, contra o homem negro (Gonzalez, 1984; Nascimento, 1977).

E , ainda, se ser “menino” tem sido amplamente utilizado para desresponsabilizar sujeitos brancos de suas ações, como podemos ver no caso de crimes que envolvem jovens brancos, não podemos fazer uma simples transposição para os homens negros, nesse caso, “menino”, “moleque”, “garoto” é mobilizado como marca de uma subumanidade. Os infantes, como bem nos mostra Lélia Gonzalez, são aqueles sem direitos plenos, aqueles pelos quais e dos quais se fala. Segundo a autora:

 

“temos sido falados, infantilizados (infans, é aquele que não tem fala própria, é a criança que se fala na terceira pessoa, porque falada pelos adultos) [...] A primeira coisa que a gente percebe, nesse papo de racismo é que todo mundo acha que é natural. Que negro tem mais é que viver na miséria. Por que? Ora, porque ele tem umas qualidades que não estão com nada: irresponsabilidade, incapacidade intelectual, criancice, etc. e tal” (GONZALEZ, 1984, p. 225).

 

Mesmo ganhando milhões, homens negros e periféricos, seguem sendo tratados como meninos. Negar aos oprimidos a sua plena condição de sujeito, capaz de se responsabilizar e falar por si, continua sendo fundamental para que a estrutura capitalista do futebol siga tutelando-os, ao mesmo tempo em que reproduz estigmas raciais e de classe.

O outro padrão, mas que me parece intrinsecamente ligado a esse, foi a minimização da dor dos jogadores diante da derrota. Vale ressaltar que se dedicar a esportes de alta performance demanda um investimento libidinal exorbitante e, portanto, um grande sofrimento diante da derrota. Sabendo disso, qual é o peso dessa derrota para sujeitos cujo existir é absolutizado pelo futebol? E isso num sentido literal, pois o esporte para muitos desses jogadores pode ter representado a linha tênue que os separou do encarceramento ou mesmo da morte violenta. 

Na derrota para a Croácia, eu chorei com os jogadores da seleção,  li seus relatos no instagram com o coração partido. Inclusive, o de Neymar, que entregou tudo nos últimos jogos e que pode ter tido a última oportunidade de vencer uma Copa do Mundo.

Sim, sujeitos periféricos podem sofrer! O direito ao sofrimento, à demonstração de fragilidade diante da dor tem sido um direito há tempo demais exclusivo dos humanos plenos. Tem dúvida? Veja as estatísticas de como às mulheres negras têm sido negado analgesia em procedimentos médicos ou como homens indígenas e negros lideram os números de sucídio no país. "Mas eles ganham milhões!", por trás desse pensamento expresso, há outro mais fugidio, a ausência do direito à humanidade plena a qual homens negros e periféricos encontram-se submetidos, no caso, ao direito tão primordial de sofrer e ser acolhido na derrota.

 

Referências

 

Gonzalez, Lélia. Revista Ciências Sociais Hoje, Anpocs, 1984, p. 223-244.

Moura, Clóvis. O negro: de bom a mau cidadão?, 2021 (1977).

Nascimento, Abdias. O genocídio do negro brasileiro: processo de um racismo mascarado. São Paulo: Editora Perspectiva, 2016 (1977).

* Portinari, "Futebol em Brodowski', trabalho de 1935. Disponível em: https://www.arteeblog.com/2018/06/pinturas-de-futebol.html, acesso em 27 de dezembro de 2022.

** Tábata Berg é Doutora em Sociologia pela Universidade Estadual de Campinas e integra o Grupo de Pesquisa Mundo do Trabalho e suas Metamorfoses, o GPMT, também na Unicamp. Tábata organizou e lançou neste longo ano de 2022, junto de Flávio Lima e Murilo van der Laan, a obra “Trabalho e Marxismo: questões contemporâneas”: https://lutasanticapital.com.br/products/o-livro-trabalho-e-marxismo-questoes-contemporaneas.

 

segunda-feira, 17 de janeiro de 2022

O aprofundamento da indignidade - Fabrício Maciel

 

*


O aprofundamento da indignidade**


FABRÍCIO MACIEL ***


O Brasil hoje é um daqueles países que foi dominado pelo autoritarismo negacionista da extrema direita, o que se concretizou na trágica eleição de Jair Bolsonaro. Entretanto, não pretendo ficar aqui preso ao que eu costumo chamar de “ilusões da conjuntura”. Entender o agravamento dos conflitos de classe e o aprofundamento da indignidade do trabalho é tarefa que exige um duplo movimento. Primeiro, precisamos sim de um panorama claro sobre a conjuntural atual. Em um segundo momento, entretanto, é necessário reconstruir os aspectos estruturais mais profundos que nos trouxeram até aqui.

Sobre as questões da conjuntura, é preciso tentar escapar do que eu costumo chamar de “novelização da política”. Em praticamente todo o mundo, a mídia se especializou em transformar o cotidiano do campo político em um grande espetáculo. Na dita sociedade do conhecimento e na modernidade reflexiva, parece crítico mostrar o tempo inteiro o que os atores políticos estão fazendo. Ficamos todos presos nesta novela, acompanhando a cada semana seus novos episódios. O problema é que isso esconde o tempo inteiro sistematicamente o que acontece no campo econômico, ou seja, as profundas transformações estruturais pelas quais vem passando o capitalismo nas últimas décadas.

É exatamente aqui que precisamos dedicar a nossa atenção. Em um movimento descritivo e analítico, posso dizer que o Brasil na atual conjuntura vivencia um grave aprofundamento da precariedade e da indignidade do trabalho e das relações entre as classes sociais. Isso reflete um cenário global, mas também nos apresenta especificidades do Brasil. Aqui vale destacar que os conceitos de precariedade e de trabalho precário apenas descrevem situações de trabalho que são obviamente ruins e que apenas se aprofundam. Com a ideia de indignidade eu procuro ir além e tematizar as dimensões morais e simbólicas da situação.

Na conjuntura brasileira atual, marcada pelos governos antidemocráticos de Michel Temer e Jair Bolsonaro, um aspecto decisivo do aprofundamento da indignidade foi a aprovação de uma reforma trabalhista que é explicitamente contra as necessidades dos trabalhadores. Em resumo, sem a presença do Estado nas negociações, a reforma fragiliza os trabalhadores permitindo aos empregadores toda a tomada de decisão em seu favor. Ou seja, trata-se explicitamente de uma nova forma de autoritarismo de mercado.

Neste cenário, proponho a ideia de indignidade para pensar a condição imoral e inaceitável na qual se encontra hoje pelo menos 30% da população brasileira. Trata-se aqui do patamar mínimo de dignidade que uma pessoa precisa, ou seja, o mínimo para seu sustento material e existencial. A ideia de dignidade da pessoa humana, que consta na constituição brasileira, remete-se a este mínimo, que não é garantido para todos. No cenário brasileiro, Jessé Souza definiu esta nossa subclasse como sendo a “ralé”, que vive abaixo do padrão mínimo de cidadania.

Além destes, que vivem realmente na miséria e praticamente não tem nenhum trabalho, pelo menos mais 30% dos brasileiros, ou seja, uma classe trabalhadora precarizada, realiza o que eu defino como trabalho indigno. Trata-se do trabalho incerto, sem vínculos e sem salário garantido, o que também não oferece o mínimo para garantir a dignidade em termos materiais e morais. Com isso, temos mais ou menos 60% da população brasileira, ou seja, nossas classes populares, 30% vivendo abaixo da linha da dignidade e mais 30% vivendo no limite da dignidade.

A explicação para este triste cenário não é simples e não se resume às discussões sobre a conjuntura, como se tem feito. Este tem sido nosso principal inimigo teórico e empírico. Tem sido comum, por exemplo, e isso não apenas no Brasil, atribuir a vitória da extrema-direita nas eleições e todas as suas graves consequências aos erros da esquerda na conjuntura anterior. Mesmo que a esquerda e seus partidos tenham cometido erros, esta interpretação é falsa, pois não reconstrói as razões estruturais e históricas que nos trouxeram até aqui. Com isso, a conjuntura política dominada pela extrema-direita apenas aprofunda, mas não explica, a condição de indignidade das classes populares e o fosso entre estas e as classes dominantes. Ou seja, a ascensão da extrema-direita ao poder é consequência, e não causa, da condição de indignidade produzida pelo capitalismo contemporâneo.

Na Alemanha, a obra de Klaus Dörre nos ajuda a compreender isso que ele tem chamado, seguindo a socióloga americana Arlie Horschild, de “história profunda”. Com a metáfora da “fila de espera”, Dörre vem analisando há anos como a precarização do trabalho sempre levou frações da classe trabalhadora a aderirem ao sentimento e à mentalidade da extrema-direita. Assim, para compreendermos o cenário mais amplo que nos trouxe até aqui, precisamos fazer uma reconstrução histórica das mudanças estruturais do capitalismo nas últimas décadas.

Quando revisitamos as obras de alguns dos principais analistas do capitalismo contemporâneo como Claus Offe, Ulrich Beck, Robert Castel, André Gorz, Boltanski & Chiapello, dentre outros, como eu tenho feito nos últimos anos, o que descobrimos é o espectro da indignidade chegando também nos países centrais. A precariedade e a indignidade do trabalho sempre foi a marca estrutural de países periféricos como o Brasil. Entretanto, desde a década de 1970, esta tem sido o principal produto do capitalismo global, como mostram os estudos destes autores.

Ainda que de maneira conjuntural no centro, em países como a Alemanha, com a fragmentação do Estado de bem-estar social, a condição de indignidade tem sido uma ameaça real para um número cada vez maior de pessoas, especialmente de imigrantes. Ou seja, trata-se aqui do aumento de uma ralé global. Entretanto, países ricos como a Alemanha ainda conseguem garantir um patamar mínimo de dignidade para os mais necessitados, com programas do governo, o que é impossível em países de miséria estrutural como o Brasil. Considerando que sempre tivemos uma ralé estrutural como aspecto central de nossa sociedade, com a atual conjuntura de extrema-direita este cenário apenas se aprofunda e agrava.

Na conjuntura anterior, na qual o Brasil foi conduzido pelos governos de esquerda do Partido dos Trabalhadores, ainda que a miséria estrutural não tenha sido alterada, presenciamos a melhora relativa da vida de nossa classe trabalhadora, apoiada por ações efetivas do governo. Não por acaso, a principal figura neste contexto, o ex-presidente Lula da Silva, é hoje o nome mais cotado pelo povo brasileiro para vencer as eleições à presidência neste ano.

Neste trágico cenário, as classes dominantes no Brasil apresentam aspecto profundamente conservador, o que explica em grande parte a eleição de Jair Bolsonaro. Diante das mudanças na conjuntura anterior, que melhoraram a vida de fração considerável da classe trabalhadora, a elite brasileira, seguida fielmente pela alta classe média, apresentou profundo incômodo, o que aprofundou o ódio e a intolerância em relação aos menos privilegiados. Assim, temos um cenário de relações indignas entre as classes sociais, no qual os mais privilegiados se sentem ameaçados em sua condição social.

Em uma pesquisa que venho realizando há cinco anos no Brasil, com executivos, encontrei resultados que em boa parte nos ajudam a compreender por que os mais privilegiados se sentem incomodados com a mudança social, o que em grande medida conduziu ao voto na extrema-direita. Em entrevistas realizadas com mais de 60 executivos brasileiros, procurei compreender três aspectos centrais. O primeiro diz respeito a sua origem social, o que significa origem de classe. O segundo nos remete ao estilo de vida. O terceiro mobiliza o posicionamento político e sua relação com a condição de classe.

Com isso, o que encontramos, no primeiro aspecto, é que a grande maioria tem origem privilegiada, tendo nascido na alta classe média brasileira. Em sua maioria, os pais eram empresários ou profissionais liberais, o que nos permite caracterizar a existência de um “habitus corporativo”, transmitido de pai para filho. Por sua condição de classe, estes executivos tiveram acesso às melhores escolas e à melhor formação possível, muitos deles estudando no exterior desde a juventude.

Sobre o estilo de vida, constatamos que este é guiado pelo que podemos definir como uma “mentalidade de mercado”. Ao longo da pesquisa, investigamos as principais revistas lidas pelos executivos, como a Forbes Brasil, por exemplo, que defendem uma visão de mundo extremamente meritocrática. Seu estilo de vida também é marcado por alto nível de consumo, o que pode ser visto no volume de bens e reflete suas altas remunerações.

Por fim, o posicionamento político dos executivos é radicalmente conservador, defendendo explicitamente a mentalidade ultra meritocrática do mercado. Esta visão de mundo é afinada com sua condição privilegiada de classe, avessa às possibilidades de mudança social. Não por acaso, quando perguntados sobre uma série de questões sociais no Brasil, os executivos culpam o Estado e defendem o mercado. Eles são, por exemplo, a favor da reforma trabalhista e da previdência, reformas estas de conteúdo explicitamente contrário aos interesses da classe trabalhadora.

Além disso, quando perguntados sobre em quem votariam para presidente em 2018, poucos assumiram o voto em Bolsonaro, que ainda não era o candidato explícito do mercado. A maioria disse que votaria em nomes explicitamente ligados ao mercado, como Geraldo Alckmin, Henrique Meireles e Álvaro Dias. Quando perguntados sobre a figura pública que mais admiravam, a maioria respondeu Sérgio Moro. Não por acaso, trata-se do juiz que prendeu Lula da Silva e protagonizou toda a farsa jurídica contra ele. Agora, em 2022, Moro é um nome bem cotado para concorrer à presidência da república no Brasil.

Diante de tais resultados, podemos constatar que as classes dominantes no Brasil são profundamente conservadoras e insensíveis aos interesses dos mais pobres. Pelo contrário, desde a conjuntura anterior, seu posicionamento político ultra meritocrático foi o principal responsável pelo aprofundamento da indignidade que agora afeta pelo menos 60% da população brasileira. Foi este posicionamento que em grande medida pavimentou o caminho para a ascensão da extrema-direita e suas graves consequências sociais e políticas. Diante deste trágico cenário, temos um recado das classes populares: o nome de Lula da Silva desponta novamente em primeiro lugar nas pesquisas. Vejamos o que há de acontecer.

* Retirantes - Cândido Portinari. Disponível em: https://masp.org.br/acervo/obra/retirantes-da-serie-retirantes-1944-1945. Acesso em 17 de janeiro de 2022.

** Texto base de palestra realizada no Instituto de Sociologia da Universidade de Educação de Freiburg, Alemanha, em janeiro de 2022. Uma primeira versão deste ensaio foi publicada no site A Terra é Redonda (Disponível em: https://aterraeredonda.com.br/o-aprofundamento-da-indignidade/?doing_wp_cron=1642435747.4199209213256835937500 acesso em 16 de janeiro de 2022). Republicamos aqui no blog com a autorização do autor.

*** Fabrício Maciel é professor de teoria sociológica do Departamento de Ciências Sociais da UFF-Campos e do PPG em sociologia política da UENF.

sexta-feira, 8 de outubro de 2021

Por uma teoria sociológica sistêmica e pós-colonial da América Latina


Por uma teoria sociológica sistêmica e pós-colonial da América Latina* 

* Publicado originalmente em Scielo.br 

O estudo “Por uma Sociologia Sistêmica Pós-Colonial da América Latina” propõe uma teoria sociológica sistêmica pós-colonial para analisar a América Latina enquanto região da sociedade mundial moderna. O autor toma a teoria da sociedade de Niklas Luhmann como ponto de partida para este esforço de construção teórica, que consiste em combinar a análise da unidade da sociedade mundial com a consideração das diferenças e variedades regionais construídas em seu interior. Para alcançar este objetivo o estudo identifica e propõe solução para um problema fundamental na teoria da diferenciação funcional da sociedade formulada por Luhmann: Sua descrição da transição à sociedade moderna enxerga somente um processo de diferenciação funcional singular e interno à Europa, desconsiderando, como os pós-coloniais costumam dizer, o papel da “diferença colonial” na constituição da transição para a modernidade. Para compreender a globalidade das diferenças regionais, a teoria dos sistemas precisa não apenas investir em estudos sobre a globalização dos sistemas funcionais a partir do século XIX, tendo a Europa como o núcleo difusor dos processos sociais globais, mas sobretudo questionar e revisar sua descrição da própria transição para a sociedade moderna, realizando uma profunda autocrítica.

Por isso, o autor propõe rever a tese da transição à sociedade mundial funcionalmente diferenciada a fim de escapar da narrativa da singularidade ocidental, segundo a qual outras regiões recebem, sempre de fora para dentro, estruturas sociais e semânticas gestadas primeiramente na Europa. A ideia é recontar a história da modernidade, substituindo a narrativa única de uma diferenciação funcional desenvolvida inicialmente no interior da Europa e depois expandida para o resto do mundo por narrativas plurais sobre a experiência de cada contexto “geo-histórico” como parte do desenvolvimento “entrelaçado” e “múltiplo” de sistemas funcionais globais. O diálogo com a crítica “pós-colonial” conduz o autor à tese de que, também na teoria dos sistemas, é necessário reescrever a história do ocidente a partir das relações e diferenças que o constituíram.

O argumento principal é que é possível propor uma recepção da teoria da sociedade mundial de Luhmann que corrija seus componentes eurocêntricos, permitindo construir uma concepção não culturalista e não essencialista da América Latina. Processos e estruturas da regionalização são considerados como variações normais da modernidade global, e esta, por sua vez, enquanto dinâmica societária diferenciada e não estacionária. Nesta recepção crítica da sociologia de Luhmann, a construção da América Latina como regionalização semântica e estrutural deixa de ser vista como desvio, sob o signo da falta, da modernidade plena de outras regiões. A modernidade contemporânea não é identificada com nenhuma região específica do planeta, embora se reconheça a centralidade da Europa em sua emergência. Todas as regiões, assim como outras configurações estruturais, se constroem a partir da modernidade global, na qual estruturas neocoloniais se reproduzem, mas não constituem um sistema unitário como nas relações coloniais do passado pré-moderno, e sim um conjunto de relações centro/periferia fragmentadas pela lógica da diferenciação funcional da sociedade. O unitarismo estrutural característico do colonialismo, com sua relação entre “centro” e “periferia” válida em todas as dimensões, é rompido pela diferenciação funcional, que impõe uma fragmentação da oposição centro/periferia em múltiplas diferenças entre “centros” e “periferias” no interior dos distintos sistemas funcionais.

Para o autor, a diferenciação funcional não apenas fragmenta e rompe com o primado da colonialidade; ela também produz o horizonte e as condições de possibilidade de crítica e transformação semântica e estrutural das assimetrias entre povos, Estados e nações. Ele identifica um deficit de autorreflexão no pós-colonialismo, que pretende fazer uma crítica “externa” da modernidade/colonialidade, como se o horizonte normativo de uma “humanidade compartilhada”, que também orienta em última instância a crítica pós-colonial, não dependesse de uma formação societária na qual a colonialidade não é a forma primária, necessária e naturalizada de constituição de relações e unidades sociais. O ponto central é que a diferenciação funcional da sociedade mundial produz a contingência das estruturas de desigualdade social em toda as suas formas: A referência ao ideal de que “somos todos humanos” é uma fonte conhecida da semântica moderna da inclusão de todas as pessoas nos sistemas funcionais  de uma sociedade pós-tradicional e pós-colonial, na qual diferenças ontológicas entre pessoas, grupos, povos, nações, classes, gêneros, etnias etc. podem ser observadas como construções contingentes e arbitrárias passíveis de transformação.

Para ler o artigo, acesse:

DUTRA, R. Por uma Sociologia Sistêmica Pós-Colonial da América Latina. Dados [online]. 2021, vol.64, no.01 [viewed 28 September 2021]. https://doi.org/10.1590/dados.2021.64.1.229. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0011-52582021000100206&lng=en&nrm=iso

Links externos:

Dados – Revista de Ciências Sociais – DADOS: www.scielo.br/dados

Página Institucional do Periódico: http://dados.iesp.uerj.br/

quinta-feira, 6 de maio de 2021

Por que apoiar a “Ocupa Novo Horizonte”?

 


Por que apoiar a “Ocupa Novo Horizonte”?*

* Publicado originalmente no Blog do Pedlowski.

Bruna Machel**

Estamos acompanhando nas últimas semanas a ação judicial da Realiza Construtora contra centenas de famílias sem-teto em Campos dos Goytacazes.  A ação se deu em função da ocupação realizada no dia 13 de Abril, quando mais de 200 famílias adentraram o conjunto habitacional Novo Horizonte (Pq Aeroporto), oriundo do programa Minha Casa Minha Vida (MCMV). Segundo noticiado, essas casas estariam finalizadas desde 2016 sem cumprir sua função social.

Na ocasião da ocupação, tão logo tomaram ciência, advogados populares acionaram a Defensoria Pública Estadual, enquanto movimentos sociais passaram a prestar apoio à ocupação. Nosso objetivo sempre foi impedir qualquer tipo de violação aos direitos humanos durante o cumprimento da liminar de reintegração de posse, como também defender, por princípio, o direito à moradia para todas as famílias que de fato precisam.

A partir da nossa presença na ocupação podemos estimar que são aproximadamente mil pessoas vivendo todos esses dias com falta de água e energia elétrica, e acesso muito restrito a alimentação, viabilizada graças à cozinha comunitária que funciona com a solidariedade de apoiadores.

É importante dizer que não se trata de pessoas que escolheram viver uma “aventura inglória” em meio a pandemia e sob forte risco de violência policial. Ao contrário, encontraram na luta um lugar político de esperança frente ao contexto de tragédia social a que estão submetidos.

Porém, nesta sociedade orientada pela cultura capitalista, o debate sobre a ocupação logo ganharia um tom moralista com reiteradas tentativas de deslegitimação. Acusações de “oportunismo” e “baderna” passaram a circular nas redes sociais.

Não demoraria muito para que algumas das famílias contempladas pelo programa MCMV se somassem às vozes divergentes, realizando alguns pequenos protestos – embora muitas outras tenham se incorporado à ocupação.

Diante da polêmica sobre a questão da legitimidade, nos cabe uma reflexão atenta.  Notem, as famílias da “Ocupa Novo Horizonte” não possuem situação social diferente das que foram sorteadas pelo MCMV, todas da faixa 1 com renda familiar total de até 1.800,00 (menos de 1 salário mínimo e meio). Constitui, nesse sentido, certa unidade social de trabalhadores pobres periféricos, formada por uma maioria populacional negra. Todas em situação que se enquadram pela Assistência Social como condição de pobreza.

O que as divide objetivamente? A questão da segurança jurídica.

Um povo dividido pela incompetência do Estado Capitalista

A quem restou um pouco de bom-senso nesses tempos de obscurantismo, convido a refletir sobre o papel do Estado (burguês) aqui. Há um sorteio que define quem terá e quem não terá assegurado o direito à moradia, garantida nos marcos da Constituição Federal de 1988. Pois bem. Então, na ausência de um projeto público universal de moradia, coloca-se em seu lugar a força do “acaso”, onde quem não é contemplado pela SORTE é excluído da possibilidade de morar dignamente, ainda que esteja comprovadamente em situação de vulnerabilidade social. Depois, como se não fosse humilhante o bastante, este sujeito social é apontado como marginal, pois, afinal, por que haveria de organizar uma ocupação e não aceitar a sarjeta? Sim, é o que chamamos de criminalização da pobreza.

A dimensão do problema é gravíssima e afeta pelo menos 7,78 milhões de famílias brasileiras. Uma massa de pessoas que vivem amontoadas em casas de parentes ou pagam aluguel abrindo mão de pelo menos uma alimentação por dia, ou, quando no extremo da dificuldade, param em abrigos para pessoas em situação de rua. São relatos que podemos ouvir nas ruas da Ocupa Nova Horizonte ou em qualquer periferia deste Brasil.

Por isso afirmamos que as ocupações urbanas, sejam elas espontâneas ou organizadas por movimentos de luta por moradia, são fundamentais para viabilizar uma saída emergencial às situações extremas, além de denunciar a incompetência do Estado e todo o modelo capitalista de sociedade. Em via de regra, por serem ações radicalizadas de classe, são tratadas como inconvenientes a serem resolvidos pela violência policial. Há poucos dias, por exemplo, 38 famílias foram acordadas com tratores derrubando suas casas no Distrito Federal. A ação extremamente truculenta colocou abaixo até mesmo uma escola comunitária que atendia às crianças. E assim acontece sem qualquer constrangimento em todo o território nacional.

Logo, o Estado diante da Ocupa Novo Horizonte tende a operar a proteção jurídico-policial a favor da propriedade privada, criminalizando, por sua vez, a pobreza. Em poucos dias está previsto o despejo em Campos e estaremos ao lado dessas famílias.

Em resumo, podemos concluir que assinam juntos a “certidão de barbárie”, todos os entes federativos da União que estão mais ou menos enfiados nessa tragédia. Desde a omissão política da Prefeitura Municipal de Campos quando não oferece aproximação, acolhimento e projeto que atenda a demanda concreta dessa multidão de sem-tetos; Tanto do Governo Estadual que nada faz de efetivo pelo povo do Rio de Janeiro; Até o Governo Federal que vem desmontando o programa MCMV, suspendendo a construção de novas casas populares destinadas a pessoas pobres – Faixa 1; E todas as outras instâncias públicas que atuam para fortalecer as desigualdades sociais, perpassando evidentemente pelo papel estratégico do Judiciário.

Já aos bons deputados, juízes e gestores públicos que possuem alguma dimensão de comprometimento com a classe trabalhadora pobre deste município, haverá espaço para se somar a disputa institucional a favor do direito à moradia digna. A hora é agora de comprovar quem é quem no tabuleiro político deste Estado. Daqui da base seguiremos firmes na luta.

** Designer, Assessora de Comunicação Sindical e Presidente da Associação Resista Campos.

terça-feira, 6 de abril de 2021

A desigualdade como problema moderno

Fonte: Clacso.

A desigualdade como problema moderno*

Roberto Dutra**

* Publicado originalmente em Folha 1.

A sociedade moderna é a primeira sociedade em que a desigualdade é percebida como problema social. Quanto mais trivial este fato parece ser, mais as pré-condições sociais desta problematização são esquecidas. Compreender a desigualdade não é só explicar causalmente seu surgimento, sua reprodução e sua mudança, mas também as condições sociais que tornam possível problematizar este fenômeno e observar suas causas não como um dado da natureza, mas como estruturas sociais que podem ser modificadas.

Como é possível que a vida social nos permita ver a desigualdade como um problema e não como garantia natural de ordem? A crítica e a problematização da desigualdade social do ponto de vista da justiça e igualdade pressupõem uma ordem social que seja compatível com a mutabilidade destes fenômenos. Na maior parte da história social da humanidade a desigualdade não foi um problema, mas sim um dado da natureza aceito como tal pelos humanos. Nem toda ordem social comporta a problematização e a mudança das estruturas de desigualdade social. Tanto a crítica da desigualdade quanto as idéias sobre justiça social que orientam esta crítica, incluindo as utopias políticas e o “igualitarismo primitivo” dos sociólogos (Müller, 2002, p. 497-498), pressupõem uma ordem social na qual a mudança das estruturas de desigualdade possa ocorrer sem que esta ordem social desmorone. A mudança das estruturas de desigualdade requer certa continuidade institucional e cultural na sociedade. A idéia de que podemos transformar as estruturas de desigualdade social é muito mais do que uma expectativa sociológica projetada na sociedade (Sachweh, 2011, p. 581): é uma conquista evolutiva da sociedade moderna, que está diretamente ligada à transição para um novo tipo de ordem social, na qual o princípio da igualdade orienta a participação dos indivíduos na política e no direito. É somente como resultado de práticas sociais específicas destas esferas que a desigualdade deixa de ser vista como um dado natural para ser percebida como um obstáculo à realização de determinadas normas e valores sociais. A problematização jurídica e política da desigualdade é o resultado da diferenciação da sociedade em esferas sociais autônomas (economia, política, direito, ciência, família, religião, artes etc.), que abre um horizonte de observação no qual assimetrias entre indivíduos e grupos sociais podem ser percebidas como contingentes e arbitrárias.

A igualdade moderna é complexa (Walzer, 2003): não supõe e nem exige a eliminação de toda e qualquer assimetria social, mas daquelas assimetrias que se somam umas as outras e geram um processo de acumulação de vantagens e desvantagens que destroem a possibilidade de igualdade no acesso a um padrão de vida considerado “digno” e “civilizado” em cada contexto. A igualdade moderna é complexa, não absoluta, porque a sociedade não é uma unidade, mas uma pluralidade de esferas. É este tipo de igualdade complexa que chamamos de cidadania. A pluralidade estrutural criada a partir da diferenciação da sociedade em esferas disponibiliza um horizonte comparativo que coloca as desigualdades em situação de maior ou menor pressão por legitimação. Formas de desigualdade típicas de uma esfera (como as desigualdades de classe produzidas na economia e no sistema de ensino) podem ser contrastadas com formas de igualdade vigentes em outras esferas (como a igualdade formal vigente no sistema político e no sistema jurídico). Em sociedades estamentais como o sistema feudal e o colonial, havia uma unidade estrutural que bloqueava o horizonte comparativo e com isso contribuia para a legitimação não problemática da desigualdade.

Em sua clássica sociologia da cidadania, Marshall (1967) vincula explicitamente o desenvolvimento da busca por igualdade à superação desta unidade estrutural característica de sociedades estamentais e com isso à diferenciação da sociedade em instituições funcionalmente especializadas. Em sociedades feudais, afirma, “não havia nenhum princípio sobre a igualdade dos cidadãos para contrastar com o princípio de desigualdade de classes”(Marshall,1967, p. 64). Com a diferenciação da sociedade em esferas autônomas, ao contrário, a desigualdade de classe deixa de estar fundada em seu próprio direito, e passa a ser “um produto derivado de outras instituições” (Marshall, 1967, p. 77). As duas coisas também podem ser afirmadas em relação às relações de gênero, raça/etnia e à própria divisão política do mundo em nacionalidades (o lado excludente do princípio da cidadania que Marshall não abordou): assim como as relações de classe, elas são constitúidas e observadas em contraste com formas de igualdade vigentes em outras esferas, especialmente com a igualdade formal de natureza política e jurídica, e são produto derivado de outras instituições.

A desigualdade pode deixar de ser um problema

O horizonte cognitivo e normativo que condiciona a problematização da desigualdade não é um dado. Como a hipótese sobre a possível formação de uma sociedade “neofeudal” sugere, este horizonte pode ser eliminado da vida social: a institucionalização da igualdade em determinadas esferas sociais, como o direito e a política, pode ser removida pela formação de estamentos capazes de suprimir a diferenciação da sociedade em esferas. A desigualdade pode deixar de ser um problema para se tornar novamente um dado natural.

Esta possível eliminação do horizonte cognitivo e normativo da igualdade eliminaria também as condições de possibilidade da crítica social da desigualdade. Vale repetir: Esta crítica social é institucionalizada através da introdução e desenvolvimento de direitos de cidadania universalistas, dependendo diretamente das estruturas do sistema político e do sistema jurídico: É somente porque todos os cidadãos têm formalmente o mesmo status político e jurídico que as desigualdades em outras esferas da vida se tornam um problema que deve ser revolvido a partir de decisões políticas e jurídicas: “A distinção entre igualdade e desigualdade constitui um paradoxo. Quanto mais iguais nos tornamos, segundo o paradoxo, mais descobrimos desigualdades, algumas delas de natureza infinitesimal” (Müller, 2002, p. 497).

Recentemente, alguns estudiosos têm levantado a hipótese da refeudalização e renaturalização das desigualdades sociais na sociedade mundial contemporânea (KALTMEIER, 2020; KOTKIN, 2020; DURAND, 2020; ROTH, 2021). Para Joel Kotkin e Olaf Kaltmeier, a classe economicamente dominante está se transformando em um estamento global que concentra recuros econômicos, políticos e culturais no topo da pirâmide social, destrói as classes médias e constrói aquela fusão de dimensões da desigualdade que elimina qualquer esfera da igualdade capaz de servir de contraponto às assimetrias sociais existentes. O novo estamento global passa a dominar a subjulgar as elites políticas, jurídicas e culturais. Surgiria um novo tipo de ordem social de estamentos fechados que suplanta a diferenciação da sociedade em esferas autônomas. Para Cédric Durand, estaríamos diante da formação de um “tecnofeudalismo” como resultado da evolução recente da economia de conquista de dados e espaços digitais: as plataformas corporativas que conquistam, concentram e administram o “mar de dados” (Big Data) produzidos pela multidão de indivíduos e organizações tornam-se “senhores feudais”, dos quais estes indivíduos e organizações passam a depender de modo radicalmente assimétrico. Para Steffen Roth, a possibilidade de formação de uma sociedade neoestamental deve ser tratada como um cenário improvável ao lado de outros possíveis. Ele advoga que a entronização do valor da saúde, como possibilidade surgida da pandemia da Covid-19, produziria a cosmovisão adequada para sustentar e legitimar esta hierarquia neoestamental pós-moderna: povos sanitarimente inferiores poderiam ser governados e colonizados por povos sanitariamente superiores:

“Em uma sociedade mundial da saúde "neo-medieval", seria fácil e óbvio medir não apenas funções específicas, mas praticamente todos os papéis, valores ou comportamentos tendo como parâmetro sua contribuição ou ameaça à saúde. O surgimento de classes, castas ou Estados correspondendo a diferentes níveis de saúde, pureza, infecção ou poluição seria uma consequência provável” (ROTH, 2021, p. 7).

Como vimos, a diferenciação da sociedade em esferas e a igualdade política e jurídica são condições de possibilidade para que a desigualdade seja problematizada, criticada e politizada na sociedade. O aumento da desigualdade e da dependência econômica em relação às corporações que controlam Big Data, e a prevalência de um sistema social (saúde) sobre os outros parecem ser condições necessárias, mas não suficientes para apontar o colapso das condições de problematização da desigualdade. Para que ocorra este colapso, o aumento da desigualdade e o surgimento da dependência na economia digital teriam que resultar não só na fusão das formas de inclusão e desigualdade de distintas esferas sociais, mas esta fusão teria também que eliminar o horizonte normativo e cognitivo da igualdade que permite a problematização da desigualdade. A prevalência do sistema econômico e das desigualdades econômicas teria que ser acompanhada pela formação de uma ordem social mais ampla, destituída de qualquer esfera na qual o valor da igualdade esteja institucionalizado e sirva de parâmetro imanente para politizar desigualdades observadas em outros sistemas sociais. Concretamente, esta ordem social mais ampla teria que ver destruída por completo a igualdade formal entre indivídos e povos, institucionalizada no sistema de Estados nacionais e na cidadania, para que a renaturalização da desigualdade pudesse substituir a igualdade complexa. O mesmo vale para a possibilidade de que o sistema da saúde venha a ocupar a posição de centralidade que a economia ocupa na maioria das situações, com a consequência de que a estrafificação sanitária se torne a dimensão capaz de fundir a agregar desigualdades em uma hierarquia social global, unitária e renaturalizada.

A prevalência de uma esfera social sobre outras é muito mais regra do que exceção na história da sociedade mundial moderna e não significa necessariamente a fusão de estruturas de desigualdade destas diferentes esferas. A formação de grupos estamentais também não basta para identificar o colapso da igualdade. Estruturas de desigualdade estamental especificamente modernas não apenas se formaram a partir de desigualdades de patrimônio e poder ao longo dos séculos XIX e XX (BOURDIEU, 2014), como também foram politizadas e em boa medida alteradas pela própria evolução das esferas sociais.

No entanto, a possibilidade do colapso da igualdade não pode ser descartada. O aumento vertiginoso das desigualdades econômicas, os obstáculos à superação de desigualdades raciais, étnicas e gênero em diferentes esferas sociais e a fragilidade institucional dos direitos igualitários de cidadania são fenômenos que apontam justamente para a possibilidade de desconstrução do horizonte normativo e cognitivo da igualdade e da consequente renaturalização das assimentriais sociais dos mais diversos tipos.

Bibliografia

BOURDIEU, P. Sobre o Estado. São Paulo: Cia das Letras, 2014.

DURAND, C. Technoféodalisme: Critique de l’économie numérique. Paris: Éditions La Découverte, 2020.

KALTMEIER, O. Refeudalisierung und Rechtsruck: soziale Ungleichheit und politische Kultur in Lateinamerika. Bielefeld: Bielefeld University Press, 2020.

KOTKIN, J. The coming of neofeudalism. A warning to the global middle class. New York: Encounter Books, 2020.

MARSHALL, T. H. Cidadania, Classe Social e Status. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1967.

MÜLLER, H-P. Die drei Welten der sozialen Ungleichheit: Belohnungen, Prestige

und Citzenship. Berliner Journal für Soziologie, n. 4 , p. 485-503, 2002.

ROTH, S. The Great Reset. Reestratification for lives, livelihoods, and the planet. Technological Forecasting and Social Change, v. 166, p. 1-8, 2021.

SACHWEH, P. Unvermeindbare Ungleicheiten? Alltagsweltliche Ungleichheitsdeutungen zwischen sozialer Konstruktion und gesellschaftlicher Notwendigkei. Berliner Journal für Soziologie, n. 21, p. 561-586, 2011.

WALZER, M. Esferas da justiça. Uma defesa  do pluralismo e da igualdade. São Paulo: Martins Fontes, 2003.

** Sociólogo. Mestre em Políticas Sociais. Doutor em Sociologia. Professor Associado do Laboratório de Gestão e Políticas Públicas (LGPP), Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (UENF).

quarta-feira, 9 de dezembro de 2020

Divulgação: Seminário "Por que defender os direitos humanos no Brasil contemporâneo?"


Em 2020 torna-se especialmente importante discutir o legado da DECLARAÇÃO UNIVERSAL  DOS DIREITOS HUMANOS. A pandemia intensificou a desigualdade sobre o globo e no Brasil em particular, vivemos o caos na saúde e na educação sem respostas efetivas do governo federal e com mortes por COVID-19 aumentando exponencialmente nas últimas semanas. Ao mesmo tempo experenciamos formas autoritárias de resolução dos conflitos, intervenção na autonomia das Universidades e o Estado alvejando crianças nas favelas. A situação prisional também é grave. Assim como os dados de violência contra a mulher. E por último, a volta do Brasil ao Mapa da Fome revela que vivemos duas crises simultâneas: uma crise sanitária e uma crise humanitária. Este debate será feito pelo Núcleo Cidade Cultura e Conflito nesta quinta as 16 horas, Dia Internacional dos Direitos Humanos. 

Fonte: NUCC/UENF. Disponível em https://www.facebook.com/nuc.uenf

sábado, 24 de outubro de 2020

O que faz a diferença no jogo das diferenças? Nota sobre o caso “Magazine Luiza”

                                                                                                                                                                                                                     Fonte: DCM (aqui).


O que faz a diferença no jogo das diferenças? Notas sobre o caso “Magazine Luiza”

 

Paulo Sérgio Ribeiro

 

O programa de trainee oferecido a homens e mulheres negros(as) pela Magazine Luiza – uma rede de lojas de departamento que se estende por todo o país – foi o estopim para reações as mais disparatadas. De um lado, há aqueles(as) que veem nela uma ação concreta de reparação histórica no seio do mundo corporativo; de outro, há quem nela confirme um atentado à isonomia nos processos de recrutamento e seleção de profissionais.


Creio ser uma tarefa inglória encontrar um ponto de convergência entre tais posicionamentos diante do antagonismo das visões de mundo aí postas. Não à toa, o rebuliço em torno desse programa de trainee me fez lembrar um livrinho que li nos meus tempos de graduação intitulado “O marxismo”[1], de Henry Lefebvre. Nessa pequena grande ousadia de juventude, Lefebvre revisava os fundamentos do marxismo sem esquecer de que sua gênese e desenvolvimento ocorriam em oposição a outras construções filosóficas de mesma envergadura.


Para Lefebvre, temos à disposição não mais do que três grandes concepções de mundo: o cristianismo, o individualismo e o marxismo. A primeira delas, filha dileta da Idade Média, preconizava uma hierarquia estática entre os seres, formas e atos, tendo em seu topo um Ser Supremo que, por óbvio, comprometeria qualquer postulação sobre a realidade com uma razão transcendental.


A segunda, localizada no alvorecer da era moderna (século XVI), encontra na imagem abstrata de um “indivíduo” uma espécie de prefiguração da realidade. Aqui, vige o pressuposto da razão enquanto uma relação constitutiva entre o particular e o universal que, tendo por referente a consciência individual, leva-nos a crer em acomodações espontâneas entre o interesse privado e o interesse geral, entre direitos e deveres, entre o natural e o humano. No pensamento econômico, a metáfora da “mão invisível” do mercado seria o exemplo mais bem acabado de tais “acomodações”.


A terceira, por fim, tanto nega a metafísica (uma hierarquia exterior aos indivíduos) quanto desmente a premissa de que a realidade seja discernível pelo exame de consciências isoladas, como o quer a visão individualista do mundo. Aqui, realidades que escapam à consciência imediata das pessoas – a natureza, as práticas sociais, o progresso técnico, as ideologias - se entrecruzam em um movimento que se revela contraditório em diferentes níveis: os homens lutam contra a natureza para dominá-la e, ao fazê-lo, dominam-se uns aos outros, reduzindo pessoas a coisas ao aliená-las dos meios e do sentido de sua ação sobre o mundo a partir da esfera do trabalho.


Por que essa “volta toda”, indagaria o(a) leitor(a)? Aonde se quer chegar com esse inventário de visões de mundo? A resposta é bem “scholar”, penso eu: se Lefebvre foi feliz ao associar a visão individualista de mundo ao liberalismo e a visão marxista à crítica do capital enquanto relação de dominação que se imiscui até no último reduto de nossa intimidade, temos aqui uma vereda aberta para analisar as possibilidades de crítica das desigualdades sob um enfoque liberal e, não menos, para apontar suas fragilidades sob o prisma do individualismo burguês.


Comecemos pelas fragilidades. No tocante ao caso “Magazine Luiza”, não haveria melhor mostra delas do que a propiciada pela Defensoria Pública da União (DPU) ao processar a rede varejista pelo programa de trainee voltado a candidatos(as) negros(as). Eis o argumento da DPU: o programa seria “ilegal”, pois a eleição de um público-alvo no programa incorreria em “violação de direitos de milhões de trabalhadores (discriminação por motivos de raça ou cor, inviabilizando o acesso ao mercado de trabalho)”[2]. Na ação civil pública, de autoria do defensor Jovino Bento Júnior, exige-se o pagamento por parte da Magazine Luiza de uma multa de 10 milhões de reais por danos morais coletivos[3]. No processo, há um fragmento que sintetiza a “tese” do defensor:

 

“A destinação exclusiva de todas as vagas do certame a candidatos negros gera tal discriminação no universo de trabalhadores que evidencia a desproporção entre o fim almejado e essa supressão radical de direitos da coletividade de trabalhadores”[4].

 

Tal tese – uma falácia sociológica, como veremos adiante – espelha um princípio de justiça que, na tradição de pensamento liberal, atende pelo nome de liberdade natural: todos(as) são livres para colocar à prova suas habilidades e aptidões em uma ordem social competitiva (economia de mercado) quando se assegura a igualdade formal de oportunidades. O alcance de uma posição social vantajosa é legítimo quando as instituições são capazes de eliminar barreiras legais ao exercício dos próprios talentos baseadas em diferenças orientadas por gênero, raça, etnia, procedência regional etc.


Na ótica do defensor, comprometido até a medula com esse princípio liberal de justiça, o programa de trainee em questão seria reprovável por conferir exclusividade, na preparação de futuros cargos de liderança, a um grupo racial em detrimento dos demais grupos existentes. Não seria exagero dizer que o DPU sugere que a Magazine Luiza pratique, digamos, “racismo reverso”.


Por que a “tese” do ilustre defensor não se sustenta? Ora, porque ela nada diz sobre a “arbitrariedade moral” na distribuição da riqueza. Explico: se a acumulação de capitais é resultante de uma distribuição prévia de capacidades naturais cujo aprimoramento e emprego se viabilizam com facilidade ou obstáculos em decorrência de fatores imprevisíveis (background familiar, o bendito “estar no lugar certo na hora certa”, boa sorte etc.), teríamos uma situação de desigualdade moralmente injustificável, uma vez que ela é derivada de circunstâncias e contingências alheias à vontade humana, negando assim qualquer virtuosismo à loteria genética que faculta a alguns(mas) serem herdeiros(as) e a outros(as) terem a “liberdade” de vender sua força de trabalho a qualquer preço. Se assim o é, a igualdade formal está condenada a ser aquela moeda falsa com a qual pagamos a má-fé de uma discriminação institucionalizada.


Mas não sejamos injustos: o “senso” de justiça social do senhor Jovino Jr. não é imune à crítica nem na própria DPU, que, diante da controvérsia a ganhar o noticiário nacional, emitiu uma nota esclarecendo que o ponto de vista dele não representa necessariamente o pensamento da instituição[5]. Também digno de nota foi o posicionamento da Procuradoria Federal do Cidadão do Ministério Público Federal, que afirma a legalidade da política de recursos humanos adotada pela Magazine Luiza[6], bem como de associações do Movimento Negro, que ajuizaram uma ação na qual se pede averiguação da conduta do defensor público[7]. A esta altura, não surpreende que o protagonista dessa celeuma tenha pedido afastamento do cargo[8].


Contendas jurídicas à parte, importa aqui compreender a pertinência de uma política de ação afirmativa e o porquê dela provocar tamanha reação entre aqueles(as) que têm por viseira o senso comum de classe média. Sendo direto: o que fazer a respeito do racismo?


Primeiramente, delimitar o conceito. De modo preliminar, por racismo se alude a um processo sócio-político em que pessoas são segregadas no espaço social em condições de privilégio ou de subalternidade na medida em que um grupo racial se faz hegemônico nas lutas pelo monopólio do poder social. Neste sentido, podemos lançar mão aqui de um livraço, “Racismo estrutural”[9], obra recente de Silvio Ameida que, atrevo-me a dizer, já nasce clássica. Vem a calhar a maneira como Almeida destrincha a concepção institucional de racismo, para ponderarmos tanto a razoabilidade quanto os limites de políticas de ação afirmativa tais como a desenvolvida pela Magazine Luiza.


Evidenciando as superficialidades de uma concepção individualista do racismo, isto é, daquele conjunto inarticulado de crenças pelas quais o racismo é reduzido a um comportamento “irracional” de indivíduos ou grupos considerados isoladamente – cuja explicação desagua em uma visão psicologizante das práticas racistas cotidianas (o/a racista seria alguém “anormal”) e cuja inibição requereria para alguns(mas) a mera aplicação de sanções penais -, a concepção institucional do racismo, para Almeida, toma o funcionamento das instituições como condição objetiva da reprodução de tais práticas.  


Instituições são constituídas pelos conflitos raciais e as respostas que elas são capazes de oferecer aos(às) envolvidos(as) dependerão de sua capacidade de “absorver” tais conflitos na produção de normas e padrões de comportamento. Para Almeida, a expressão “absorver” é prenhe de consequências, na medida em que as lutas sociais que atravessam as instituições tornam patente que o poder simbólico deriva sua eficácia da produção de consensos sobre a própria dominação que elas operam. No caso do racismo institucional, a hegemonização de interesses de homens (em sua maioria) e mulheres brancos(as) “faz com que a cultura, os padrões estéticos e as práticas de poder”[10] que lhes conferem homogamia de classe se tornem “o horizonte civilizatório do conjunto da sociedade”[11]. As declarações de Cristina Junqueira, uma das fundadoras do banco digital Nubank, em entrevista concedida recentemente ao Roda Viva, são um indício robusto do que venha a ser essa homogamia de classe[12].


Contudo, sugere Almeida, há uma espécie de gradiente de poder entre os grupos raciais no interior das instituições, pois, em determinadas circunstâncias, a manutenção do controle institucional não pode prescindir de certas “concessões” a grupos subalternizados quando se está em jogo um projeto político que mantenha inalteradas as condições socioeconômicas em que interesses privados se dissimulem como universais.


Aqui, há de ser ter cautela quanto a possíveis mal-entendidos.


Políticas de ação afirmativa visam a um objetivo cuja justificativa é autoevidente: ampliar a representatividade de minorias raciais de modo a contrabalançar os mecanismos discriminatórios entremeados ao funcionamento “normal” das instituições. Promover a diversidade nos espaços de poder implica que a imposição de padrões sociais que favoreçam a ascensão de homens e mulheres brancos(as) às posições de prestígio venha a ser posta em xeque pela necessidade dessas instituições se posicionarem diante das inevitáveis tensões que práticas antirracistas acarretem ao incorporá-las em sua política de recursos humanos. Não será este o caso da Magazine Luiza?


Das declarações de intenção vagas sobre o antirracismo à passagem para o terreno da experimentação institucional feita em nome de uma meritocracia equitativa, os ganhos coletivos são inegáveis. Contudo, conflitos distributivos têm uma dinâmica que desafia, a meu ver, os limites que o enfoque liberal nos faculta quanto às ações afirmativas. Retornando àquela tradição de pensamento, as ações afirmativas bem poderiam ser enquadradas sob outro princípio de justiça social: a igualdade liberal de oportunidades.


Por meio deste princípio, lembra Álvaro Vita[13], toma-se por equidade um arranjo institucional que efetive tanto quanto possível um ponto de partida igual para aqueles(as) que tenham as mesmas habilidades e destrezas e estejam com o mesmo grau de comprometimento para empregá-las. A medida do “possível” traduzir-se-ia em minorar os efeitos das vantagens sociais herdadas que condicionem o horizonte de realização pessoal atribuível ao ingresso nas carreiras ou negócios mais valorizados, bem como das discriminações de raça e de gênero praticadas de modo sistemático.


A plataforma civilizatória passível de ser projetada na decantação daquele princípio à realidade de um capitalismo periférico equivaleria a reabrir o debate sobre a excessiva concentração de propriedade e riqueza entre nós, posto sê-lo condição necessária para garantir serviços educacionais e de saúde “iguais para todos” e um recrutamento para os cargos de liderança em condições equitativas. Contudo, sob os auspícios da tradição liberal vista a partir daquele princípio, ressalva Vita[14], estão excluídos como “moralmente arbitrárias” circunstâncias que intervêm diretamente na ideação do futuro que uma pessoa venha a ter, tais como a classe social e o capital familiar e cultural. Desigualdades de classe são inevitáveis e, logo, admissíveis, ainda que resultem em desvantagens sociais cumulativas entre as gerações.


Luiza Helena Trajano, fundadora da Magazine Luiza, não titubeia em aderir à igualdade liberal de oportunidades, sobretudo pelas ambiguidades que tal perspectiva contém, já que se mostra contrária à taxação de grandes fortunas. A seu ver, garantida a “isenção” desse tipo de tributo a megaempresários(as) como ela, a doação voluntária tornar-se-ia compensatória para que mais impostos pudessem ser assumidos pelo 0,01% do qual participa[15]. Assim, a revisão do direito à herança – um fator de desigualdade par excellence – mantém-se interditada no debate brasileiro, evidenciando, no caso em tela, os impasses teóricos na articulação das categorias “raça” e “classe” no que respeita às lutas sociais pensadas sob uma perspectiva emancipatória – tema para um outro texto. 



[1] LEFEBVRE, Henry. O marxismo. São Paulo: Difusão Europeia do Livro, 1963 (Coleção “Saber Atual”).

[2] Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região. Ação Civil Pública Cível ACPiv 0000790-37.2020.5.10.0015. Acessível (aqui).

[3] Idem.

[4] Idem, p. 36.

[5] Jornal Correio Braziliense. DPU defende programa de trainee do Magalu após ação de defensor público. Edição de 06/10/2020. Disponível (aqui).

[6] Jornal Estadão. Procuradoria defende trainee só para negros da Magazine Luiza: ‘louvável’”. Edição de 09/10/2020, Disponível (aqui). 

[7] Consultor Jurídico. Entidades do movimento negro ajuízam ação contra Defensor que processou Magalu. Edição de 16/10/2020. Disponível (aqui).

[8] Carta Capital. Defensor que moveu ação contra programa de trainee do Magazine Luiza pede afastamento. Edição de 14/10/2020. Disponível (aqui). 

[9] Nela, Almeida propõe uma teoria social cuja premissa é que sociedades contemporâneas não podem ser explicadas pelo cotejo de tipos específicos de racismo, senão por uma interpretação sociológica que dimensione o racismo como condição estrutural das suas organizações político-econômicas. Cf. ALMEIDA, Silvio Luiz de. Racismo estrutural. São Paulo: Sueli Carneiro; Pólen, 2019. (Coleção "Feminismos Plurais") 

[10] Op. cit., p.40.

[11] Idem.

[12] Diário do Centro do Mundo. Cristina Junqueira, co-fundadora do Nubank, diz que é “difícil” contratar líderes negros. Edição de 20/10/2020. Disponível (aqui). 

[13] Cf. Vita, Álvaro de. Uma concepção liberal-igualitária de justiça distributiva. Revista Brasileira de Ciências Sociais, Fev. 1999, vol. 14, nº 39, p.41-59. ISSN 0102-6909, p.44.

[14] Ibid.,

[15] Diário do Centro do Mundo. No que realmente importa, Luiza Trajano não é diferente do Véio da Havan: não aceita imposto sobre sua fortuna. Edição de 05/10/2020. Disponível (aqui).