domingo, 7 de agosto de 2016

Contra o argumento ad hominem

Contra o argumento ad hominem*

George Gomes Coutinho **

Dentre os sintomas identificáveis no Brasil contemporâneo politicamente polarizado se apresenta de forma constrangedora um inegável empobrecimento discursivo expresso em nossa opinião pública.  Deste grave problema podemos identificar déficits cuja parte da responsabilidade cabe aos grupos formuladores, aqueles que usualmente apresentam as grandes sínteses e propostas coletivas. Políticos tradicionais, intelectuais profissionais ou não e ativistas dos movimentos coletivos talvez se vejam fragilizados na sua posição de formuladores. Há razões múltiplas. Seja pela incapacidade de criação de idéias e projetos realmente inovadores e convincentes ou os outros tantos que sofreram e sofrem arranhões em sua credibilidade e, por fim, há também os que encontram entraves derivados da dificuldade de transpor as barreiras de comunicação que possam atingir corações e mentes neste momento de crise política. 

As conseqüências deste vazio são diversas e o aparecimento de proposições requentadas, simplórias e pouco críveis é somente uma delas. Mas, irei me ater a que considero como uma das conseqüências mais insidiosas e destrutivas: a larga utilização do argumento ad hominem como arma política.

Ad hominem, termo oriundo do latim utilizado para caracterizar argumentos falaciosos e/ou ilógicos, significa “ao homem” ou “à pessoa”. Em outros termos, diante do interlocutor não são discutidas as propostas e projetos de sociedade em pauta. De forma pouco nobre, o objetivo é destruir a pessoa. Abandona-se o debate saudável e plural de idéias que leva água ao moinho de qualquer sociedade democrática em prol da eliminação moral. Não por acaso, a despeito do posicionamento político, a prática do que os adeptos chamam de “escracho” em lugares públicos, sendo praças, aeroportos ou restaurantes os locais de preferência para o uso deste expediente, guarda afinidades com o linchamento. Como forma de justiçamento, seria linchamento simbólico portanto.  A indignação, justa em determinadas ocasiões, se mostra com a máscara anônima do ódio em meio ao grupo. Por tudo isso, o argumento ad hominem é somente a expressão violenta e anti-democrática da incapacidade de construir consensos.


* Texto publicado no Jornal Folha da Manha de Campos dos Goytacazes em 06 de agosto de 2016

** Professor de Sociologia no Departamento de Ciências Sociais da UFF/Campos dos Goytacazes


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