domingo, 28 de agosto de 2022

Sobre produtividade acadêmica - Adelia Miglievich

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Sobre produtividade acadêmica **


Adelia Maria Miglievich Ribeiro***

O vigor desses pesquisadores cola-se à força de suas IES como lideranças no campo, desde nas agências de pesquisa às revistas e sociedades científicas nacionais e internacionais. 

Posto que, em cada cientista, todo o grupo ao qual ele pertence se afirma (em verdade, toda uma instituição), ao grupo interessa garantir as condições objetivas para que tais colegas sejam hiper-produtivos, de modo a se reproduzir nos postos de poder e prestígio e, por conseguinte, a instituição mantém sua hegemonia no campo. Eis que ela protege efetivamente seu quadro, por exemplo, ao não expor seus "campeões" a uma carga horária em sala de aula excessiva, por exemplo, e lhes garantir o apoio técnico.

As instituições mais sólidas enfrentam com bem menos perdas quaisquer retrocessos no sistema científico nacional. Um K anteriormente acumulado que segue seu curso "natural", a cada vez maior concentração de riqueza. Os recursos se multiplicam, daqueles que sempre o tiveram. Definitivamente, esqueçam a meritocracia, o que não implica que tod@s não trabalhem muito, eu disse to@ds (os de IES mais pobres trabalham ainda mais ...).

Os centros de excelência emergentes hão de existir, mas, tal como diria Bourdieu, levam para isso três gerações, até que a quarta possa usufruir de qualquer acúmulo.

Assim como se diz que ninguém quer abrir mão de privilégios, é importante afirmar que a ciência nacional está longe de equiparar suas instituições. As desigualdades regionais são gritantes.

O indivíduo pode dar a sorte (?) de ser capturado por um centro/rede de produção científica altamente competitivo (e se manter nele, o que significa que não "dorme no ponto"), mas, desde aí, as oportunidades todas lhe estão dadas "de bandeja". São quadros excelentes, porém, qualquer comparação é injusta. Uns trabalham no primeiro mundo e outros no terceiro.

Não se resolve uma abismal desigualdade com a lógica individualista. Não se engane quem se pensa gênio: "uma andorinha não faz verão".

PS: nem toco aqui no assunto de que há os que não se submetem ao ritmo de trabalho anunciado acima. Isso é papo para outra postagem. Mas, antecipo que, nas instituições periféricas, essa escolha sobrecarrega demasiadamente o pequeno percentual que luta para as portas da Casa não fecharem.

* The Myth Of Sisyphus, pintura de Nicci Bedson. Disponível aqui: https://pixels.com/featured/the-myth-of-sisyphus-nicci-bedson.html, acesso em 28 de agosto de 2022.

** Texto publicado originalmente no perfil do Facebook da autora: https://www.facebook.com/adelia.miglievich. Reproduzimos aqui com a autorização de Adelia; 

*** Adelia Maria Miglievich Ribeiro é professora associada no Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal do Espírito Santo, UFES. É autora, além de dezenas de artigos publicados no Brasil e no exterior, do livro "Heloisa Alberto Torres e Marina de Vasconcelos: pioneiras na formação das ciências sociais no Rio Janeiro" lançado pela Edufrj em 2015.

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