Sociedade
civil avalia os 6 meses de governo Wladimir*
* Publicado originalmente em Folha
1.
Nota
7,4 aos seis primeiros meses do governo Wladimir Garotinho (PSD). Esta foi a
média entre as notas dadas à administração municipal no período, em ordem
alfabética, pelo advogado Carlos Alexandre de Azevedo Campos, professor da Uerj
e do Isecensa, e ex-assessor do Supremo Tribunal Federal (STF); o cientista
político e sociólogo George Gomes Coutinho, professor da UFF-Campos; o
especialista em finanças Igor Franco, professor do Uniflu; o empresário José
Francisco Rodrigues, presidente da CDL-Campos; a pediatra Maria das Graças
Ferreira Rangel, presidente do Sindicato dos Médicos de Campos (Simec); e Raul
Palacio, professor e reitor da Uenf.
Na
verdade, a avaliação foi feita por cinco dos seis representantes da sociedade
civil goitacá. A presidente do Simec declinou de dar nota ao governo, ainda que
não tenha se furtado em fazer críticas, como ao projeto de terceirizar a
administração das unidades e profissionais da Saúde Pública de Campos. Que foi,
no entanto, defendido por outros. Os seis questionaram a falta de diálogo
prévio com a sociedade, tanto na proposta do novo Código Tributário, quanto na
polêmica do anfiteatro Antonio Roberto de Góis Cavalcanti, o Kapi, com a Praça
da Bíblia, no Parque Alberto Sampaio. Como principal virtude da gestão, além de
realizações como a reabertura do Restaurante Popular e a recuperação de
estradas vicinais, foi apontada a capacidade de trabalho do prefeito, do seu
vice, Frederico Paes (MDB), e sua equipe.
Folha
da Manhã – De 0 a 10, que nota você dá aos seis primeiros meses do governo
Wladimir Garotinho? E por quê?
Carlos
Alexandre de Azevedo Campos – Havia
dado, anteriormente, 8. Pela má condução do processo de mudança do Código
Tributário, rebaixo a nota a 7.
George
Gomes Coutinho – Penso
que a nota razoável seja a suficiente para não reprovar e tampouco para aprovar
com louvor. Penso que por enquanto a nota 7 nestes primeiros seis meses se
aplique e sirva de incentivo para aprimoramentos. Mas, sabendo que aquele
período onde há a “energia” das urnas, o primeiro ano está caminhando para
término neste segundo semestre. Penso ser recomendável “aumentar a intensidade”
das mudanças propostas ainda em 2021, não obstante considerar os problemas da
conjuntura, o que inclui a pandemia.
Igor
Franco – Nota
7. Após um início muito positivo, a meu ver, o governo perdeu um pouco o ímpeto
e foi açodado em algumas iniciativas, como a reforma tributária, necessária,
mas que precisa ser melhor debatida pela população. Além disso, deslizes como a
aglomeração na inauguração do Restaurante Popular, o episódio do anfiteatro
Kapi são deslizes desnecessários e evitáveis através do bom senso. Apesar de
tudo, continuo satisfeito com os rumos da administração até o momento.
José
Francisco Rodrigues – Quando
o prefeito completou 100 dias de governo, eu havia dado nota 9. Os seis meses
em que pesem algumas questões pontuais, como a disposição dele em reajustar
tributos, poderíamos até me fazer rever esse conceito. Mas vamos manter a mesma
nota e explico: quando houve a reação das entidades, o prefeito Wladimir
retirou a matéria da pauta da Câmara e abriu um diálogo com as entidades. Por
isso vou manter a nota, como forma de incentivo para que ele acerte e está
acertando em muitas coisas.
Maria
das Graças Ferreira Rangel – Opto
por não pontuar por meio de nota, ao menos por ora, os seis primeiros meses do
atual governo. Nós, do Simec, torcemos e esperamos que a atual gestão municipal
cumpra com o seu programa governo, anunciado durante o último pleito eleitoral,
em sua totalidade, e alcance resultados positivamente efetivos em prol de toda
a sociedade campista, nos próximos meses e anos, beneficiando assim o
desenvolvimento do município.
Raul
Palacio – A
dedicação do prefeito, a participação ativa do vice-prefeito, a articulação
política, a qualidade de vários secretários, o desempenho no combate à Covid e
no pagamento dos servidores, o pacto com alguns setores e a abertura do
Restaurante Popular são pontos positivos. Entre os negativos, a falta de
diálogo com setores populares, a personificação de processos políticos, a não
realização de licitações, a falta de processos eletrônicos, a relação com a
Câmara e a política de aumento de impostos na pandemia. Minha avaliação é 7.
Folha
– O prefeito assumiu decretando logo nos primeiros dias de janeiro o estado de
calamidade financeira, aprovado por unanimidade na Câmara Municipal. E, no
último dia 3, no Trianon, no balanço dos seis meses de governo, fez a projeção
de superávit financeiro à Prefeitura de Campos, antes de fechar o primeiro ano.
Como você viu e projeta? E por quê?
Carlos
Alexandre – São
números de um governo que afirmou cortar gastos. Devem provar. Esse exame
comparativo nem sempre revela sobra de caixa. Recebeu uma contabilidade
negativa e diz que a tornará positiva. Se são verdadeiros os números, o futuro
dirá. Mas se existem sobras, que invistam no que parece urgente: infraestrutura
de trânsito e saúde.
George
– Sem o
detalhamento fiscal/orçamentário, não é possível fazer projeções. Mas, partindo
da premissa de que as informações fornecidas pela própria PMCG sejam
fidedignas, o que é viável se lembrarmos da experiência passada da gestão Diniz
e a penúria declarada no período, além do aumento da participação dos royalties
na gestão Wladimir, o diagnóstico indica melhora na saúde orçamentária. O que é
excelente notícia diante dos desafios da cidade. Cabe é olharmos com lupa a
sustentabilidade deste orçamento superavitário.
Igor
– A
princípio, a trajetória do dólar aliado à alta do petróleo traz previsões de
receitas crescentes até o fim do ano para o município. Porém, é preciso ser
cauteloso ao divulgar um possível resultado positivo nas contas públicas. O
maior risco é trazer pressões por maiores gastos públicos a partir da percepção
da população de que a situação é confortável.
José
Francisco – O
estado de calamidade financeira se explica por fatores diversos, principalmente
a pandemia, e o governo anterior deixou pendências. É uma ferramenta que o
gestor público utiliza para renegociar contratos. Não vejo paradoxo em prever
um superávit até o final do ano, embora seja uma meta difícil, mas existe
alguns indicadores, como a alta do barril do petróleo no mercado internacional,
que se reflete nos royalties. Existe essa possibilidade. Temos que torcer para
que aconteça, mas não com aumento de impostos.
Maria
das Graças – O
destaque concedido recentemente pelo prefeito à possibilidade de Campos ter
superávit financeiro até o fim deste ano, que foi anunciado poucos dias
após o estado de calamidade pública fiscal e financeira ser prorrogado até
dezembro, em razão do risco de colapso na saúde, educação, mobilidade e
administração, nos causou profundo estranhamento. Se há previsão de resultado
financeiro positivo, qual é a real necessidade de adotar medidas austeras
contra servidores públicos municipais e aprovar o novo Código Tributário?
Raul
– Ao
assumir em janeiro, a situação era financeiramente bem mais complexa que a de
hoje. É notável o aumento no barril do petróleo e a entrada de “dinheiro novo”
dos parlamentares federais. Creio que o Governo de Estado também vai destinar
recursos ao município, em função da articulação política do prefeito. Mas
entendo como prematuro falar de projeção de superávit. Poderia dificultar a
fundamentação da correta política de austeridade e controle da folha que a
Prefeitura está realizando. Certamente vai na contramão do pedido de aumento de
impostos.
Folha
– Entre julho e setembro de 2020, a Folha fez uma série de 11 painéis para
buscar alternativas à crise financeira de Campos. Foram ouvidas 34 pessoas,
entre especialistas de várias áreas, da iniciativa privada e sindicatos. Apesar
das diferenças, houve unanimidade em três pontos: parceria com as
universidades, retomada da vocação agropecuária e pregão eletrônico integral.
Como vê o trabalho do governo em cada um deles?
Carlos
Alexandre – Não
me recordo de parceria com universidades, ou opção massiva pelo pregão
eletrônico. No último caso, se ocorreu, foi pontual, longe do ideal. Com
relação ao setor agropecuário, acho que a representatividade está assegurada
pelo vice-prefeito, o que pode trazer benefícios para a região. Temos uma
vocação rural, que deve ser explorada. Porém, parcerias com universidades
públicas e privadas devem ser perseguidas: esse é o grande futuro social e
profissional de nossa região.
George
– Notei
com Wladimir uma mudança importante de postura em relação aos pais: ele se
engajou na luta por recursos para os novos prédios da UFF e demonstrou abertura
interessada em diálogo com a academia. Convidou nomes importantes do setor,
como Almy que já foi reitor da Uenf, para o estafe. Há potencial para parcerias
que gerem tecnologia social a partir do conhecimento acumulado pelas
instituições locais. Sobre o setor agropecuário, há ações em andamento em
logística, escoamento da produção. Por fim, o pregão é ainda algo tímido.
Igor
– Embora
haja iniciativas isoladas a respeito dos três temas, cujos registros estão
disponíveis no site da PMCG, parece-me não haver programas que unifiquem e
tragam parâmetros para essas iniciativas. Seria muito positivo se, consolidadas
em algum tipo de documento público ou apadrinhadas por gestores específicos, tivéssemos
premissas, metas e verificação dos resultados obtidos em cada uma dessas
iniciativas.
José
Francisco – Temos
o exemplo de Campinas, no interior de São Paulo, que virou uma potência a
partir da Unicamp. Temos aqui a Uenf, UFF, IFF e outras, e temos que aproveitar
isso. Quanto à questão do agronegócio, é ponto pacificado: é uma das
potencialidades de Campos que havia sido abandonada. Lembrar aqui que no ano
passado as duas únicas usinas em atividade movimentaram R$ meio bilhão e uma
terceira usina está sendo reaberta. Sobre o pregão eletrônico isso é a
transparência que queremos e o poder público é obrigado a fazer.
Maria
das Graças – Campos
é um polo universitário e isso precisa ser cada vez mais valorizado. Diversas
parcerias podem ser firmadas, a exemplo do que ocorreu no início desde ano,
quando o IFF doou diversos equipamentos de proteção individual, o face
shield (proteção para o rosto). É preciso fomentar a geração de renda
através da valorização e estímulo do pequeno produtor e do desenvolvimento da
agricultura familiar. Quanto ao pregão eletrônico integral, este deve ser
realizado com lisura e transparência em todo o seu processo.
Raul
– O
controle da folha e o pacto com alguns setores estão sendo realizados. O
trabalho está no início, entretanto, na direção certa. No caso da Uenf, estamos
em contato com várias secretarias municipais e temos como principais
interlocutores o vice-prefeito e o secretário municipal de Educação, Ciência e
Tecnologia. A informatização dos processos da Prefeitura e o pregão eletrônico
geral são pontos deficitários nestes primeiros seis meses. Acredito que as
pessoas ouvidas também concordaram em relação à impossibilidade de aumento de
impostos.
Folha
– Em 15 de maio, o ex-governador Garotinho (sem partido) comandou uma reunião
na Lapa sobre a votação das contas da ex-prefeita Rosinha (Pros) em 2016, cuja
reprovação em 2018 foi anulada em 2021. Estavam 14 vereadores da base, entre
eles o presidente Fábio Ribeiro (PSD), e Wladimir. Seu pai disse: “o governo
tem dentes e pode morder”. Soou ameaça e começou a gerar distensões. Como você
vê? Qual o limite dos pais no governo do filho?
Carlos
Alexandre – Bola
muito fora. Um olhar para o passado para quem tem que construir um futuro. Se o
Executivo tem dentes e morde, a Câmara tem remédios e o governo já teve prova
disso. Ademais, o povo campista já mostrou que sabe rejeitar o grupo Garotinho
em primeiro turno. Wladimir, se tem ou não futuro, depende do quanto se prender
ao passado. Hoje, não faltam adversários, até mais preparados pelo tempo. Que
Wladimir não se enfraqueça pelo passado, pois só ele tem a perder. É a fraqueza
dele, até aqui. O pai deve se manter distante.
George
– Por
vezes é algo da retórica política, mesmo que nos soe desagradável. Se entra no
campo da ilegalidade ou ameaça ao Estado de Direito, aí é outra coisa.
Bolsonaro está aí como exemplo negativo do que pode causar. Já sobre o limite
dos pais, este será dado pelo prefeito. E será tanto ou mais permissivo quanto
ele julgar que deve ser. Contudo, algumas concessões seriam inevitáveis. No
campo das lealdades, Wladimir tem sim débito com o capital político de seus
pais. A questão é o “como” irá encaminhar as demandas que chegarão vindas
deles.
Igor
– A
sinalização é muito negativa. Talvez um dos maiores trunfos de Wladimir na sua
articulação política seja a percepção pela maior parte da população de que ele
atua com independência em relação aos pais nas decisões administrativas e
estratégias de políticas públicas. Manter o governo com essa imagem não envolve
apenas afirmações sobre liderança, mas demonstrações públicas sobre os limites
da articulação dos pais.
José
Francisco – Não
estava presente obviamente nessa reunião e não conheço detalhes sobre seus
bastidores. Como representante de uma grande parcela de empresários, e me
refiro ao comércio, não sou afeito a essas terminologias políticas. Não posso
comentar o que alguém disse, se não ouvi. A política tem dessas coisas. Prefiro
dizer que isso faz parte dos bastidores da política, que pouco que conheço.
Maria
das Graças – O
sucesso de um governo democrático dá-se através da separação dos poderes, que
devem ser independentes e harmônicos entre si. Quaisquer tentativas de
interferência ou intimidação na atuação do outro é passível de atrito e
prejudicial à população. E deve ser combatida para não comprometer os limites
nas atribuições de cada esfera. Quanto ao governo, ele deve ser gerido de forma
independente pelo candidato que pleiteou o cargo, visto que a população o
elegeu e não a sua família à Prefeitura.
Raul
– O
prefeito vem de uma família muito unida e com forte participação na política,
não usar a experiência dos governadores seria um contrassenso. Entretanto,
entendo que tem governado de forma independente. Logicamente, as suas ações são
resultado da sua formação técnica e da educação familiar. Vejo como positiva a
paixão com que trabalha. E, como negativa, a personificação dos problemas, em
detrimento da institucionalização dos mesmos.
Folha
– O governo abriu a última semana de abril com 23 vereadores dos 25 vereadores.
E chegou a junho com 15, após aprovar 12 dos 13 projetos do seu pacote de
austeridade, três deles com cortes ao servidor. Favoráveis a eles, três edis,
no entanto, foram contrários ao Código Tributário, retirado de pauta duas
vezes. O governo agora articula para reconquistar a maioria mínima para
aprová-lo. Como avalia o racha na base e essas idas e vindas?
Carlos
Alexandre – Acho
que Wladimir esqueceu o traquejo de parlamentar. Que fica sempre entre a
política do seu governo e os interesses da sua base, disputa ainda mais
dramática no nível municipal. Não é fácil, ao vereador, pensar no orçamento e
no bolso do seu eleitorado. Faltou diálogo sobre mudança de tributos. Wladimir,
com mudanças sem debate prévio, abriu espaços ao protagonismo dos edis
contrários. Criou uma plataforma para seus opositores; pior, criou novos
opositores. E regime de urgência para tratar de Códigos é inconstitucional.
George
– Os
rachas devem ser contextualizados. No caso da pauta tributária, parece que os
vereadores sofrem assédio ou são eles mesmos representantes diretos de
determinados grupos de pressão importantes. O empresariado local, a despeito de
termos um dos piores cenários de justiça tributária do planeta Terra, costuma
se organizar invariavelmente quando o tema envolve tributação a partir de
capacidade real contributiva. Portanto, diante destes grupos, pode falar mais
alto para determinado vereador a lealdade a estes do que ao prefeito.
Igor
– A perda
de apoio legislativo em pautas antipáticas à população, como medidas que afetam
servidores e aumento de impostos, é esperada. Porém, ainda vejo possibilidade
de o governo conseguir rearticular a base em torno de uma proposta comum. Por
mais impopulares que sejam essas medidas, dificilmente o município conseguirá
sustentabilidade de longo prazo sem atuar nas duas pontas: redução de custos e
aumento de receitas.
José
Francisco – Na
verdade, 13 vereadores se comprometeram a votar contra o novo Código
Tributário, a partir, creio eu, do resultado de uma histórica união de 10
entidades representativas de classe. Nossa intenção passa longe de tentar
provocar um racha na base legislativa do governo. O que não queremos é aumento
de impostos. E nem é porque não queremos, mas, sim, porque não podemos. Não
temos condições de absorver reajuste de impostos em nenhum nível. Essa é
a questão.
Maria
das Graças – É
preciso governar com liberdade, verdade, comprometimento, legitimidade e sem
idas, para que as vindas também não se façam necessárias. Assim como o
Legislativo deveria cumprir as suas funções de forma harmônica e independente
dos demais poderes. O cenário atual e as interferências acabam por insinuar que
há imposição de limites entre os poderes, o que não é, nem de longe, saudável
para uma sociedade democrática como a nossa.
Raul
– No meu
ponto de vista o processo está errado desde o início. Os vereadores se devem ao
povo, os cargos em comissão se devem a projetos institucionais de qualidade, o
prefeito tem que dialogar com a Câmara e explicar as suas ideias. Acredito que
o acordo de apoio inicial deu a falsa sensação de apoio incondicional e
“precarizou” a relação entre o Legislativo e o Executivo municipais. Todos
perdemos com isso.
Folha
– Apesar de votaram a favor de 12 dos 13 projetos do governo, os edis Raphael
Thuin (PTB), Bruno Vianna (PSL) e Fred Machado (Cidadania) ficaram com o
comércio e contra o Código. Os dois primeiros foram punidos com a exoneração de
DAS e RPAs indicados, o que levou um projeto importante e exitoso como o
Paraesporte a ser abrigado na Uenf. Os dentes do governo têm como morder sem
mastigar junto o interesse social?
Carlos
Alexandre – Os
vereadores fizeram o que era certo, o que não significa, necessariamente, backlash (folga)
da sociedade civil. O errado está em pensar que o social e o esporte só podem
vir do Estado. Certo mesmo são esses vereadores buscarem a iniciativa privada
desde sempre. A sociedade deve ser solidária, não dependente inteiramente do
Estado. Contudo, apesar de fazer parte da política, é um erro de um governo em
início começar a se vingar dessa forma. É uma péssima mensagem.
George
– Não
acompanhei os detalhes nesse caso, as punições pela falta de lealdade destes
quadros do Legislativo. Precisaríamos compreender quais ganhos ou perdas,
pensando em consequências para a sociedade, decorreram da mudança de lócus do
projeto para a Uenf. Interesses da sociedade devem ser pensados nas
consequências positivas ou negativas dos movimentos ocorridos no âmbito político.
A priori a sede em si não implica eficiência, eficácia ou efetividade. Importa
é o “como” se implementa uma política pública.
Igor
– Os
efeitos colaterais de rompimentos políticos, invariavelmente, acabam atingindo
a população na maioria das vezes. A extensão do dano é diretamente ligada à
qualidade da política e da composição promovida, principalmente, pelo
Executivo. A percepção que tenho quanto à atuação de Wladimir, nesse sentido,
ainda é positiva, dentro das circunstâncias brasileiras. Porém, é preciso que
haja demonstrações práticas dessa disposição em fazer diferente. Ao tomar
medidas que levem um projeto social a buscar pouso em outra jurisdição, a
sinalização é muito ruim.
José
Francisco – A
questão não é morder nem mastigar. A questão é perceber que o eleitor não quer
engolir esse tipo de coisa. Eu vejo esse tipo de coisa na esfera políticas, da
qual sempre mantive a prudente distância. Os vereadores tomaram posição com o
que acham justo. Essa questão de cargos, retaliações, fica neste âmbito. Não
faz parte da nossa pauta.
Maria
das Graças – Enquanto
a união poderia fazer bem mais pela população, infelizmente, muitas vezes é a
sociedade quem sofre com as disputas políticas. É preciso que o Executivo e o
Legislativo tenham o mesmo foco: o bem-estar da população. A população não está
muito preocupada com os “dentes do governo”. A população, a mesma que elegeu os
representantes dos poderes, quer segurança para que ela trabalhe, preservação
de seus direitos e saúde, especialmente nesse período de pandemia e calamidade.
Raul
– Primeiramente,
é importante destacar que a vinda do Para-Esporte e o Via Esporte para a Uenf é
um sonho antigo. Não há relação política, nem partidária nisso. Entretanto,
entendo que os cargos comissionados não deveriam ser tratados como moeda de
troca de votos, mas sim para o atendimento de projetos de interesse da
sociedade. Se o projeto é importante, deve rever recursos, independente do
padrinho político do mesmo. Também entendo que a colocação de servidores
públicos em cargos estratégicos valoriza o funcionalismo.
Folha
– Thiago Rangel (Pros) foi um vereador que saiu do governo e voltou após ganhar
cargos na Empresa Municipal de Habitação (Emhab), para tentar aprovar o Código
Tributário. Como avalia esse aparente toma lá/dá cá? É um reflexo local do que
o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) chamou de “presidencialismo de
coalizão”? Há contradição com a afirmação pública do prefeito: “acabou a época
do cabide de emprego”?
Carlos
Alexandre – O
eleitor do Thiago Rangel deve vê-lo como quem vendou o voto pelo cargo, e
cobrar dele isso. Nosso desenho institucional, começando pelo constitucional,
permitiu isso. Wladimir não fugiu à regra: trocou voto por cargos. Isso não é
um problema antijurídico, é um problema de desenho institucional. Faz parte do
processo político, para o bem e para o mal.
George
– O termo
“presidencialismo de coalizão” é criatura de Sérgio Abranches (sociólogo e
cientista político) e tenta explicar os arranjos da construção de maiorias
legislativas, dotadas de instabilidade estrutural, no mundo. A negociação
envolve tanto a grande política de princípios, valores e programas, quanto a
pequena política de cargos, verbas para as bases. A própria complexidade do
processo legislativo opera com as duas lógicas. Demonizar uma delas significa
inviabilizar os processos de decisão em sociedades dotadas de alta
complexidade.
Igor
– Sim.
Dentro da política, há, sim, espaço para distribuição legítima de cargos entre
aliados. O grande problema é a qualidade dos quadros que são alocados.
Historicamente, os cargos assumidos atendem apenas a critérios de afinidade,
com a competência técnica para o cargo ficando totalmente escanteada. Extirpar
essa prática é desejável, mas sou bastante cético em relação a essa possibilidade,
principalmente em contextos mais desafiadores à articulação política, como vem
sendo a pandemia.
José
Francisco – Os
políticos dizem que faz parte do jogo e o jogo político muitas vezes é
questionável. Para não entrar em um campo que desconheço, prefiro focar na
nossa questão que é meramente econômica. Política e econômica caminham juntas,
mas muitas vezes são antagônicas. O fato de estarmos tratando disso aqui é um
avanço. Para resumir, o ideal seria que tivéssemos avanços políticos e avanços
econômicos, e desta forma certamente alcançaríamos um denominador comum, que é
o que perseguimos.
Maria
das Graças – Esse
arranjo político-institucional, com a finalidade de ocupar cargos no governo
diverge completamente da afirmação: “acabou a época do cabide de emprego”. Tais
alianças somente teriam funcionalidade se, em um mundo ideal, prevalecesse a
união de medidas democráticas e éticas em benefício do bem-estar da sociedade e
desenvolvimento do município, independentes de suas bases.
Raul
– O
sistema presidencialista faz com que o poder executivo tenha que dialogar
constantemente com o legislativo. A troca de favores ou a indicação de cargos
em comissão como contrapartida ao apoio político fragilizam e corrompem a
democracia. Infelizmente é uma prática comum nos governos em nível federal,
estadual e municipal. Essa “facilidade” termina criando muitos “reféns” nesse
processo e afeta até a qualidade da eleição legislativa.
Folha
– Os vereadores que saíram do governo reclamaram de pouco tempo para estudar os
projetos. Assim como os segmentos da sociedade por eles afetados. Com o setor
produtivo, o diálogo agora caminha para tentar aprovar o Código. Mas esse
debate não teria que ser prévio? A retomada do Conselho Municipal de
Desenvolvimento (Comudes) é um passo necessário nesse sentido? Como avalia o
novo Código Tributário? É uma demanda fiscal?
Carlos
Alexandre – Aí
reside o grande erro deste governo. Qualquer alteração tributária, ainda mais
alterando a carga tributária, deve ser amplamente debatida. Tentaram impor
mudanças sem qualquer debate. Grande erro. Pouca importa o órgão. Não há
monopólio no debate. Todos os setores interessados devem participar. E repito:
a Constituição Federal, a Estadual, nossa Lei Orgânica, todas proíbem regime de
urgência para aprovar Código; penso que também para alterar, ainda mais
mudanças substanciais.
George
– Eu não
tenho os detalhes e espero que novo Código vá em direção do enfrentamento dos
problemas de injustiça tributária que assolam o país. Nem que seja nos limites
do âmbito local, mitigando injustiças encontradas no Brasil. Abordando o
problema do debate, eis um ponto e tanto. Medidas assim, para serem
recepcionadas enquanto legítimas, precisam da participação dos grupos
interessados e dos diretamente afetados. A negociação é que torna mais ou menos
democrática a tomada de decisão.
Igor
– A
discussão ampla com a sociedade é essencial. O governo tem a prerrogativa de
encaminhar a proposta, mas o Legislativo deve abrir amplo canal de participação
popular. Além de tudo, há uma percepção generalizada no Brasil de que os
impostos não são revertidos de forma satisfatória à população, logo, nenhum
brasileiro está pré-disposto a aumentar sua contribuição ao erário. É tarefa
dos poderes políticos comunicarem à população sobre a motivação da proposta e
chegarem a um meio-termo entre o desejável e o possível.
José
Francisco – Boa
pergunta. A retomada do Conselho é essencial e isso foi anunciado em uma
reunião recente na CDL da qual participaram o prefeito Wladimir e o seu vice
Frederico Paes, além do presidente da Câmara, Fábio Ribeiro. É fato que as
entidades ficam sabendo quase nada do que está sendo planejado e desta forma
não pode se posicionar, e quando falo em posicionar quero dizer colaborar com
ideias e argumentos. O Conselho é a solução porque, com ele, pelo menos o fator
surpresa deixa de existir. Foi uma decisão madura do prefeito.
Maria
das Graças – Sim,
considerando a relevância da pauta e os possíveis impactos na sociedade,
sobretudo, os negativos, o debate deveria ter ocorrido previamente de forma
ampla, para evitar quaisquer concretizações às pressas. Não é correto abordar
opções administrativas, sob argumento de elevação de receitas, de modo oculto.
O novo Código é inoportuno em um momento em que a própria anuncia a possibilidade
de superávit. O Código será o financiador do saldo positivo ao fim do ano?
Deixo aberto o questionamento.
Raul
– O
debate tem que ser constante, a argumentação leva à solidificação das
propostas. A apresentação de estudos prévios é de fundamental importância para
entender o problema e as soluções propostas. A realização de audiências
públicas permite a colaboração, importantíssima, da sociedade. Só após a
realização de todas essas etapas poderemos ter certeza do voto em favor da
sociedade. Em relação ao Código Tributário, me parece que faltaram todas essas
etapas, inclusive uma etapa prévia, que seria a licitação dos serviços.
Folha
– No dia 28, Wladimir anunciou parceria com a Associação Evangélica de Campos
(AEC) para recuperar o Parque Alberto Sampaio, que seria chamado de Praça da
Bíblia, incluindo o anfiteatro que leva o nome do falecido diretor teatral
Antonio Roberto de Góis Cavalcanti, o Kapi. Após forte reação da classe
artística, o prefeito fez um recuo parcial, mantendo o nome de Kapi ao anfiteatro
e propondo a divisão do parque público entre artistas e religiosos. Dará certo?
O Conselho Municipal de Cultura (Comcultura) não deveria ter sido consultado
antes?
Carlos
Alexandre – O
governo recuou pela pressão, e isso é um bom sinal, pois mostra a disposição
para dialogar. Só o futuro dirá se vai dar certo. Não há impedimento para a
divisão, desde que definam bem como o imóvel será compartilhado. Deve começar
por restaurar o espaço, que está bem deteriorado. Sobre a comunicação ao
Conselho, teria sido boa política o diálogo prévio.
George
– Sem
dúvida. O Conselho é órgão plural, envolve a sociedade civil e deveria sim ter
sido consultado. Considero esse tipo de demanda preocupante. A despeito de
termos uma maioria cristã no Brasil, as minorias continuam pagando impostos e
não devem ser esmagadas simbolicamente. Eis o que diferencia sociedades
democráticas de regimes com pretensões totalitárias. As minorias são protegidas
da “tirania das maiorias” como diria Tocqueville. De todo modo, a despeito da
tentativa de conciliação, o avanço da pauta em si não é bom sinal.
Igor
– A
consulta deveria ter sido feita anteriormente. A princípio, parece haver um
antagonismo entre o uso que será feito pela AEC e o uso que seria feito pela
classe artística. Sem trocadilhos, eu não apostaria numa conciliação entre os
dois atores.
José
Francisco – Pelo
que acompanhei pela imprensa, o prefeito buscou uma espécie de parceria pública
com um setor que não é essencialmente privado. Essa é uma experimentação que só
saberemos o resultado depois que começar a funcionar. As praças cumprem o papel
de centros de convivência independente de religião. Mas é possível a
convivência ecumênica. Não dá para julgar antes dos resultados. Sobre o
anfiteatro abrigado pelo Parque, o Conselho de Cultura poderia e deveria ter
sido consultado, mas parece que o problema foi resolvido.
Maria
das Graças – Vale
ressaltar que o Brasil é um Estado Laico, e isso significa que nenhuma religião
tem prioridade sobre as outras e que o Estado não pode nem apoiar nem impedir
as práticas religiosas. O dever do município é priorizar a revitalização e a
conservação das áreas públicas, para fins de fomentar, democraticamente,
atividades de lazer e cultura para toda a população, independente de religião.
Raul
– A
procura de parceiros para resolver os problemas da cidade é extremamente
válida, a troca de exigências em função do serviço prestado é que me parece
incorreta. O Estado é laico e os espaços são de todos e não de uma religião
específica. Entendo que nesse ponto também faltou diálogo e comunicação.
Folha
– Em 11 de junho, ao programa Folha no Ar, da Folha FM 98,3, Wladimir listou as
realizações do seu governo: 1) pagar salários dos servidores em dia, 2) pagar
dezembro e 13º deixados em aberto pela gestão passada, 3) retornar as vans ao
Centro, 4) reabrir o Restaurante Popular, 5) recuperar 100 km de estradas
vicinais e 6) retomar as obras do Shopping Popular. Como você analisa?
Carlos
Alexandre – São
medidas positivas, mas ainda há muito a fazer. As ruas de Campos estão estado
deplorável, acidentes se multiplicando. Os hospitais precisam de reformas. Mas
penso que o Governo está atuando, está trabalhando. Não há inércia.
George
– Bem,
são ações concretas e importantes. Mas é importante notar que algumas destas,
como pagar salários em dia, são rotina. Perplexidade mesmo é quando não
conseguem, vide o governo anterior. As outras medidas envolvem um pouco mais de
pro-atividade e atendem demandas existentes, vide o Restaurante Popular ou a
recuperação das estradas vicinais. O porém é que ainda estão longe da ousadia,
da invenção, da inovação. Campos precisa buscar novas dinâmicas sociais,
culturais e econômicas.
Igor
– As
medidas elencadas pelo prefeito parecem ter tido impacto positivo na opinião
pública. Parte da entrega se deve ao sucesso na articulação política nacional e
estadual; parte se deve a uma conjuntura econômica mais favorável aos
municípios produtos de petróleo. O prefeito deveria aproveitar o bom momento
junto à população para estruturar medidas de longo prazo, como vem tentando
fazer com a reforma tributária e mudanças administrativas. O risco é o governo
se acomodar com o bom ritmo até agora e abandonar as medidas de equalização
fiscal.
José
Francisco – Ele
assumiu com duas folhas de pagamento atrasados e está solucionando o problema.
O Restaurante Popular era promessa de campanha e o Camelódromo, embora
particularmente considere desafinado com o conjunto arquitetônico do Mercado
Municipal, é uma obra em curso, onde resta dar tratamento final. As vans no
Centro, na avenida 7 é uma reivindicação dos comerciantes para tentar
revitaliza aquela parte da área central. Os 100 quilômetros de estradas são
essenciais para o redesenho da agropecuária. A análise é positiva.
Maria
das Graças – A
pontualidade do pagamento dos salários dos servidores trata-se de um dever do
município e deve sempre ser tratada de forma prioritária. É de suma importância
mantê-los sem atraso, para que não se incorra em ato grave contra o servidor.
No entanto, não há motivos para a gestão pública vangloriar-se, e ainda há
muito a ser feito. O pagamento do saldo remanescente do 13º de 2020, por
exemplo, não foi efetivado para todas as categorias. É urgente trabalhar em
prol da população, sobretudo da parcela mais carente.
Raul
– Indiscutivelmente
um trabalho de destaque, fruto da dedicação de muitos e da liderança do
prefeito. Certamente, a arrecadação ajudou, mas a dedicação, o conhecimento e o
preparo do funcionalismo e do Executivo municipal levaram a esse resultado. Sem
dúvida o resultado é fruto do de um trabalho coletivo. Nesse caso, estão todos
de parabéns!
Folha
– O governo Wladimir já promoveu dois lockdowns em Campos este ano, para tentar
conter a segunda onda da pandemia da Covid. O último foi abreviado pela
mobilização do mesmo comércio que até aqui barrou a aprovação do Código
Tributário. Como analisa o combate à pandemia pelo poder público municipal?
Maior empregador do município, junto da Prefeitura, o comércio goitacá retoma a
força política que já teve em passado recente?
Carlos
Alexandre – Acho
que o Governo atuou positivamente no combate. Foi rígido quando deveria ter
sido e soube a hora de flexibilizar. É triste ver o Centro da cidade
abandonado, porém. A revitalização do Centro tem que entrar na pauta dessa
relação dos comerciantes com o governo. Penso, sim, que o comércio está
retomando um papel político importante.
George
– Creio
que a Prefeitura tem tentado dar conta das demandas da pandemia. Porém, tem se
mostrado porosa a interesses de determinados grupos, que só têm mirado no
curtíssimo prazo. Contudo, o acompanhamento dos leitos em UTI tem sido o ponto
de inflexão, onde o prefeito toma suas decisões de maior ou menor abertura.
Quanto ao setor do comércio, a minha pergunta é: quando estes atores deixaram
de ser politicamente relevantes? Mesmo atuando nas franjas, o empresariado
sempre manteve proximidade com o poder local.
Igor
– Para
ser justo, desde o governo Diniz a Prefeitura de Campos se destacou pela adesão
à ciência. Entendo que Wladimir continua com saldo positivo, entre erros e
acertos, inevitáveis num momento delicado como o que vivemos. O pós-pandemia
traz muitas dúvidas sobre o futuro das vendas presenciais. Talvez, uma
estratégia adequada seria a Prefeitura usar uma via de mão dupla: apoiar os
comerciantes com inovação em troca de apoio a projetos estratégicos na visão da
administração, como a reforma tributária.
José
Francisco – Não
se discute aqui se houve ou não a necessidade do lockdowns. O que sempre
advogamos é que o comércio não era vetor da transmissão do vírus. Nenhum outro
segmento seguiu tão à risca os protocolos. Mas foi o setor que pagou o preço
mais alto. É exatamente por isso que não temos condições de arcar com reajustes
de impostos. Mais de 15% do setor não suportou a pandemia e fechou. O restante
queimou suas reservas. Quanto à força, não quero medi-la, mas ela existe e um
exemplo cabal disso foi a união das entidades.
Maria
das Graças – O
combate à pandemia, ainda que por medidas drásticas, salva vidas. No entanto, o
cortejo entre o fechamento de postos de trabalho e a proteção à saúde advindas
resultou em decisões delicadas quanto ao fechamento temporário, haja vista que
os danos no setor do comércio foram grandes. Controlar a disseminação com
criação de locais exclusivos para a testagem e diagnóstico, tratamento e
monitoramento da Covid-19, poderia ser uma forma da Prefeitura evitar novos
fechamentos no município e proteger também a economia.
Raul
– O
governo acertou quando chamou o comércio e os empresários para o debate sobre a
situação do município em relação à Covid-19. Os números apresentados, fruto do
trabalho do Dr. Charbell, da sua equipe e toda a secretaria de Saúde,
permitiram que os comerciantes entendessem a situação e apoiassem as ações que
foram tomadas. Deu muito certo. Não continuar com a mesma metodologia para o
Código Tributário me pareceu um contrassenso. O trabalho no combate à Covid-19
está sendo muito bom, sempre utilizando a ciência como base.
Folha
– Dos comerciantes aos médicos, a categoria é contra terceirizar a
administração das unidades e profissionais da Saúde Pública de Campos. Após a
tentativa desastrada de fazê-lo sem licitação com uma empresa sob a qual
pairavam denúncias, o projeto agora é fazê-lo por pregão eletrônico, exigindo
experiência na gestão de saúde de uma cidade do porte de Campos. Parece ser um
ponto inegociável do governo. Qual a sua opinião? E por quê?
Carlos
Alexandre – Veja,
a saúde é aberta à iniciativa privada. Portanto, havendo processo licitatório e
equilíbrio financeiro na contratação, acho que será muito positivo para os
campistas. O processo deve ser o mais transparente possível e a sociedade
precisa fiscalizar os serviços.
George
– Não me
parece ser boa solução. Há inúmeras controvérsias envolvendo qualidade da
gestão e sustentabilidade. A terceirização, na média, não tem produzido os
resultados prometidos. Não há garantia alguma que a terceirização por si produzirá
melhorias. Isto é fetichismo.
Igor
– Sou a
favor de todas as medidas que tragam mais eficiência ao setor público. Um
grande problema no Brasil é que, dada a dificuldade de realizarmos mudanças,
deixamos determinadas situações chegarem a um ponto tão esgarçado que a mudança
se impõe de forma abrupta, sem diálogo. Acho que a experiência é válida, mas
precisamos atribuir objetivos, metas claras, bem divulgadas à população em
geral e às partes interessadas e, principalmente, avaliar os resultados.
José
Francisco – Temos
em Campos a Sociedade Fluminense de Medicina e Cirurgia, o Sindicato dos
Médicos, os Conselhos referentes a cada uma das atividades médicas e
correlatas, como enfermagem entre outras. Pelo que vejo eles estão atuantes
nesta questão.
Maria
das Graças – É
um erro absoluto entregar a administração das unidades hospitalares e dos
profissionais da Saúde Pública aos cuidados de uma instituição privada. Além de
representar o início da privatização da Saúde, esse novo modelo de gestão já se
mostrou ineficaz em diversos outros municípios. Enquanto há grandes hospitais
públicos sob administração pública que são exemplos bem-sucedidos de gestão,
inclusive, no Estado do Rio. A gestão dos serviços de saúde deve ser realizada
por profissionais existentes na administração pública.
Raul
– Alguma
coisa precisa ser feita e é uma possibilidade. Quem tiver uma opção melhor que
a apresente. Pessoalmente acredito que, antes da entrada da iniciativa privada,
poderíamos tentar chamar o funcionalismo municipal para administração da saúde.
Preocupa-me o fato de abrimos mão do controle público da saúde. Além de
valorizar o servidor, teríamos uma economia de recursos. Não sei como está o
diálogo com o funcionalismo da Saúde em relação ao tema. Agora, se vai ser
feito, fazer esse processo através de uma licitação me parece correto.
Folha
– Até a primeira semana de julho, Campos recebeu em 2021 R$ 227.935.796,89 de
royalties e Participações Especiais (PEs) do petróleo. No mesmo período de
2020, o governo Rafael Diniz (Cidadania) havia recebido apenas R$ 137.679.350,12.
Ao governar o Brasil no boom internacional das commodities, o ex-presidente
Lula (PT) disse que um governante precisa ter sorte. Wladimir está tendo?
Carlos
Alexandre – Sorte
é ter royalties (risos). Por certo que todo governo precisa da ajuda dos astros,
sem dúvida. Mas também sem diálogo e trabalho, não há sorte que resolva. Penso
que Wladimir poderia se abrir mais ao diálogo com os diferentes setores da
sociedade, tomar medidas mais negociadas, debatidas. Isso atrai apoio. No mais,
trabalho duro, que penso estar existindo.
George
– Ao que
parece, Lula é leitor da Maquiavel. Sim, a sorte é importante. Lidar com uma
tragédia, uma intempérie, pode queimar o capital mesmo do político mais capaz.
Mas, aí com Maquiavel, sorte sem habilidade, capacidade e inteligência, não é
garantia de nada. O cenário mais interessante ao político é ter uma bela onda
para surfar. E saber surfar. Dominar a técnica. Sim, Wladimir se depara com um
cenário melhor que o do governo anterior. Torço que ele e seu grupo tenham inteligência
política para saber aplicar esses recursos.
Igor
– Sem
dúvidas, o cenário hoje é muito mais favorável ao governo atual. A conjunção de
dólar alto e petróleo voltando às máximas de 2018 são extremamente favoráveis
aos municípios produtores. Porém, o contexto do atual “boom de commodities” é
muito diferente. Hoje, temos entes federativos endividados, com folhas de
pagamento elevadas, sem espaço para expansão fiscal. O governo precisa ter o
discernimento de aproveitar o bom momento para equalizar as contas e firmar
bases de sustentação para o longo prazo.
José
Francisco – Olha,
espero que isso seja mesmo verdade. Acreditamos na força do trabalho, mais o
fator sorte existe, sim. Realmente no que se refere a questão dos royalties,
como já coloquei em resposta anterior, o cenário é promissor, com a expectativa
de alta crescente do barril de petróleo no mercado internacional. Esse preço
internacional é a referência para o pagamento de royalties. Queremos que o
governo Wladimir dê certo, como desejamos que os anteriores também tivessem
dado.
Maria
das Graças – O
prefeito precisa ter competência, princípios éticos e valores honestos para
gerir a administração pública de forma idônea, sempre pautando a sua gestão no
cumprimento das normas previamente estabelecidas e no atendimento aos
princípios de legalidade e eficiência. Cabe ao governante do município elaborar
adequadamente o orçamento municipal, antevendo as receitas e estabilizando as
despesas, conforme programação apropriada, em benefício da assistência, cuidado
e proteção da população.
Raul
– Entendo
que a sorte mascara o trabalho e a dedicação de um grupo de trabalho. Os
valores têm aumentado, entretanto. As decisões tomadas para o pagamento das
folhas em atraso e os fornecedores não guarda relação com a sorte. A chamada
sorte não está impedindo o trabalho político para a chegada de dinheiro federal
ou a abertura do Restaurante Popular.
Folha
– Nestes seis meses, quais foram, em seu entender, as maiores virtude e erro do
governo Wladimir? Se ele pudesse escutar um conselho seu à administração dele,
qual seria?
Carlos
Alexandre – A
maior virtude é o trabalho. Não vejo um governo se escondendo dos problemas,
mas enfrentando-os dentro da sua ordem de prioridades. O maior defeito foi
revelado na proposta do Código. É uma péssima ideia tentar ser patrão da
Câmara. Rosinha fez o mesmo entre 2014 e 2015, e derrubei como inconstitucional
o Código Tributário inteiro dela no TJ. Meu conselho é dialogar mais com
vereadores e a sociedade. O governo de Wladimir, até aqui, é bom. Para ser
excelente, precisa não repetir erros que seus pais cometeram.
George
– Penso
que há um esforço importante de trazer recursos extras para a cidade e é de
inegável relevância o retorno da proposta do Restaurante Popular. Entre os
erros está a abertura para determinados grupos de pressão que não estão e
jamais tiveram qualquer tipo de compromisso com o interesse público. Por fim,
se pudesse dar um conselho, é preciso olhar para as periferias da cidade. Penso
que ali há uma gente que precisa de requisitos mínimos de dignidade, que
envolve saneamento e mobilidade urbana de qualidade, para deslanchar.
Igor
– Há
méritos na condução da articulação política junto ao Estado e ao Governo
Federal. O governo municipal também promove uma comunicação mais eficaz que o
antecessor, o que pode contribuir para uma melhor impressão sobre o primeiro
ponto. A famosa aglomeração no Centro, na inauguração do Restaurante Popular,
foi uma péssima sinalização, bem como a açodada tramitação da reforma
tributária. Quanto ao conselho, o governo não pode perder de vista que a
situação das contas públicas ainda é sofrível e demanda um ajuste de longo
prazo.
José
Francisco – Movido
por sua juventude, com uma certa experiência, já que foi deputado federal,
Wladimir mostra grande capacidade de trabalho. O erro foi não discutir questões
como o do Código Tributário, mas parece que ele se recuperou ao anunciar a
retomada do Comudes. O conselho é exatamente esse: discutir, acionar conselhos
e entidades em todos os níveis, governando junto com todos. Boa parte das lutas
da CDL não são afeitas somente ao comércio, mas em prol de toda sociedade.
Maria
das Graças – Aconselho
ao prefeito a ter fidelidade com o seu povo, disponibilidade para ouvir a
população, constante postura de diálogo com as entidades sindicais aliada à
capacidade de decisões inteligentes a serem adotadas sempre em prol dos
atendimentos aos anseios coletivos, comprometimento com a gestão, além da
valorização e estímulo ao servidor público que é, de fato, quem dá a devida
sustentação ao município. Aconselho ainda, que o líder do Executivo busque
estimular, obstinadamente, o desenvolvimento econômico de nossa cidade, bem
como fortalecer e recuperar os serviços existentes.
Raul
– Na
primeira resposta já esclarecemos esse ponto. O único conselho que daria seria
trabalhar na institucionalização dos problemas, na comunicação e no debate com
a sociedade. Logicamente, incluindo a Câmara. Através do diálogo e do debate a
gente vai mais longe.